Friday, December 26, 2008

OS LIMONZINHOS DO ULISSES

“Somos o que repetidamente fazemos. A excelência, portanto, não é um feito, mas um hábito.” Aristóteles

No princípio da década de 90 do século passado, a cidade de São Paulo vivia um verdadeiro caos no trânsito urbano. A situação não tinha tanto a ver com a circulação rodoviária, mas, e principalmente, com a questão do estacionamento. Todo mundo estacionava onde lhe dava na veneta.
Corriam o risco de apanhar uma pesada coima por estacionamento irregular? Corriam, claro. Mas qual o grau de probabilidade de um condutor, em 11 milhões, ser "caçado" em infracção ao Código de Estrada? Os condutores apostavam nesse endiabrado jogo de probabilidades e acabavam quase sempre ganhando.
Para ultrapassar o caos, as autoridades lançaram mão da sua criatividade e inventaram os MARRONZINHOS. Os MARRONZINHOS vêm a ser um grupo de jovens recrutados e treinados pela Companhia de Engenharia do Trânsito (CET) da Prefeitura Municipal de São Paulo para auxiliarem a polícia no controlo do trânsito em São Paulo, especialmente nos estacionamentos. Treinaram-nos, vestiram-nos com calções e jaleco em marron e camisetas em amarelo-torrado e lançaram-nos nas ruas da maior cidade da América Latina e uma das maiores metrópoles do Mundo.
Deu logo certo? Certamente que não. Foi difícil para os condutores entenderem que deviam respeito a esses jovens; foi complicado para os policiais militares aceitarem a ajuda desses «meninos»; a opinião pública dividiu-se diante da nova realidade surgida com os MARRONZINHOS (que é como ficaram a ser conhecidos, em razão do modelito em marron que envergavam). Mas, volvidos mesmo de duas décadas sobre a "aterragem" dos marronzinhos em São Paulo, se a situação do trânsito (e dos estacionamentos) não é ainda nenhuma BRASTEMP, ela está, sem dúvida, de longe, muito melhor do que antes. Pode-se falar, com propriedade, de um ANTES e de um DEPOIS dos MARRONZINHOS. Eles contam! Eles interferiram com a balbúrdia! Hoje a brigada de trânsito da polícia militar de São Paulo não se imagina a controlar o tráfego na cidade sem eles. Em Sampa, o pessoal teve imaginação, ousou e fez acontecer.
E por aqui, porque não lançar também mão da imaginação (e alguma inteligência, claro) para resolver algumas questões que afectam a vida dos munícipes da Praia? E tudo leva a crer que Câmara Municipal da Praia está tentando algo parecido.
Ulisses, e equipa, inundaram as ruas do Plateau com uns limonzinhos, na esperança de resolver a velha questão da ausência da autoridade municipal nas ruas e logradouros públicos da cidade e numa tentativa de botar alguma ordem no «galinheiro».
Será que vai dar certo? Vai-se conseguir vincar a presença da autoridade municipal? Vai-se conseguir vencer a ameaça de caos urbano que pende sobre as nossas cabeças, qual espada de Dâmocles? Estarão os limonzinhos destinados a conseguir o sucesso que os marronzinhos alcançaram em São Paulo? Uma boa resposta, uma resposta politicamente correcta, seria do tipo «só o tempo o dirá». Mas não é o caso.
Entre os limonzinhos do Ulisses a gente vê fulanos já com cabelos brancos e pouca disposição para a cobertura do território municipal; indivíduos cheirando a álcool barato; rapazes e raparigas com postura equívoca, fruto de outros carnavais. E já deu para ver limonzinhos namorando vendedoras ambulantes; moedas mudando de mão; colega pedigalizando (de pé-di-galo, mesmo) colega; ajuntamento de limonzinhos nas sombras poucas do Plateau (que vêm a ser as das copas das árvores que crescem atrás da antiga casinha mortuária do Hospital Central e junto ao quiosque do Pó-di-bandêra e as dos botecos do Platô). Outro dia assisti, atónito (depois furioso) um limonzinho prevenindo uma piquena (vendedora ambulante) contra um colega que estaria dobrando a esquina em direcção a eles, referenciando-o como «o Ragalado». E o aviso saiu entremeado de beijinhos na face, no pescoço e nas orelhas da «querida».
Haverá gente bem no grupo recrutado por Correia e Silva e Barbosa Amado? Certamente. E muitos. O dito «Ragalado», por exemplo, é, com certeza, um bom fiscal. E quantos «ragalados» haverá?
O processo de recrutamento e selecção pode ser posto em causa? Não. O cabo-verdiano tem dons histriónicos que enganam qualquer um. E quando a necessidade de emprego aperta, a capacidade de representar atinge o clímax. E qualquer um pode ser enganado.
Como aperfeiçoar o processo de recrutamento e selecção? Como garantir um proceder ético por parte dos limonzinhos? Como melhorar a performance da classe? O que fazer para dignificar a categoria? O que fazer para que os limonzinhos possam contribuir efectivamente para a resolução da questão da ausência da autoridade municipal nas ruas e logradouros públicos da cidade e para botar alguma ordem no território municipal?
Antes de mais, é preciso redefinir o universo de recrutamento dos fiscais, elevando um pouco a fasquia. Chamando a concurso cidadãos habilitados com, pelo menos, o Curso Geral dos liceus, e dando preferência àqueles que tenham maiores habilitações, maior juventude, registo criminal limpo, cadastro policial impoluto e recomendação de anterior empregador, antigo professor ou último comandante.
A selecção deve ser confiada a especialistas. Testes psicotécnicos, entrevistas e dinâmicas de grupo estarão indicados para o despiste dos elementos perniciosos e para garantir a contratação dos melhores (entenda-se com melhor potencial).
A integração e/ou treinamento inicial são indispensáveis. Diria mesmo que constituem a base para a constituição de um bom corpo de fiscais. Treinamento para dar ferramentas para um bom desempenho; manualização dos procedimentos para evitar arbitrariedades, improvisações legais ou o laisser faire. Integração para reconhecimento do território, identificação dos potenciais prevaricadores e para moldar o espírito de corpo. Integração também para apontar os heróis da organização (exemplos a serem seguidos, alguém com quem se pode aprender alguma coisa) e os vilões (maus exemplos, indivíduos de quem se deve manter distância).
A definição de um período probatório com o escopo de afinar a selecção é uma necessidade incontornável. No termo do período, devem ser confirmados, na organização, aqueles cujo potencial desabrochou em desempenho esperado; e dispensam-se os problemáticos e/ou ineptos.
É fundamental o estabelecimento de um plano de carreiras e de um sistema remuneratório equilibrado. E a cobertura por um sistema de previdência social (a inscrição no INPS estaria de bom tamanho, dando alguma tranquilidade em relação às situações de doença, incapacidade e velhice, influiria grandemente na motivação e no comprometimento do agente com a sua missão). Devem constituir-se em estratégias de desenvolvimento profissional dos fiscais, de sua motivação e, sejamos francos, de dignidade para a classe.
A montagem de um mecanismo de avaliação de desempenho e de uma estratégia de fixação dos melhores é uma estratégia que não deve ser descurada. A ideia é ter instalado a capacidade de identificar os problemas de desempenho que podem ser superados pela via da formação e ter a necessária clareza para identificar os excelentes (agentes com desempenho de qualidade, alta motivação e alta capacidade técnica), que devem ser mantidos na organização a qualquer custo; e os pesos mortos/casos perdidos (agentes com mau desempenho, baixa motivação e baixa capacidade técnica) que devem ser desligados da organização.
Só assim teremos os limonzinhos do Ulisses tinindo. A modos de podermos delimitar claramente o ANTES dos limonzinhos e o DEPOIS. Para que eles contem (que nem ‘Ntoni Denti di Ôro)! Para que interfiram com a balbúrdia que frutifica no espaço urbano!
Um bom corpo de fiscais e uma inteligente parceria com a Polícia Nacional podem contribuir decisivamente para a resolução dos principais problemas de ordem e de autoridade no território do município da Capital. De sorte que a ordem municipal fique salvaguardada, caso a Polícia Municipal tarde (ou não venha).
Usemos a imaginação para resolver problemas que só parecem insolúveis diante do nosso pessimismo militante, fruto da nossa preguiça mental.
Praia tem solução, sim senhora, mas, que diabo!, as soluções não têm de ser, todas elas, lineares e ortodoxas.

Sunday, December 21, 2008

DO OSCAR AO TABAQUÊRO

“Não existe um homem totalmente inútil; em último caso, serve como mau exemplo.”
Wilson Sanches
Do óscar ao tabaquêro, ou de OBAMA a mugabe, vai todo um mundo. Um mundo que é olimpicamente ignorado. Porquê? Porque o Homem, desde o princípio dos tempos, aclamou o superlativo e abominou (e, não raras vezes, vomitou) o morno. Quente ou gelado; excelente ou péssimo; divina ou puta; Deus ou diabo; céu ou inferno. Extremos.
Salvas honrosas excepções, o que se vê são esforços para identificar «os mais» em cada ano, em cada sector de actividade, em cada século ou milénio. Felizmente, as excepções vão fazendo escola. Hollywood já «distingue» também as patacoadas que por lá se produzem: há o óscar para os melhores e uma nova estatueta para os beras; os tablóides distinguem os melhores em cada ano, mas começaram já a apontar o dedo aos lofas.
Actividades que movimentam multidões apenas distinguem os superlativos positivos: o futebol dá botas e bolas de ouro e prata aos Ronaldos, Eusébio e Pelé, mas não aponta o dedo àqueles que Paulo Bento acusa de não darem o seu melhor; as disciplinas olímpicas dão medalhas de ouro, prata e bronze aos maiores, mas não apõem rótulos visíveis aos que praticam o dopping; a política, que mexe com a vida de milhões de seres humanos, só destaca os melhores, deixando na penumbra os sacripantas que atrapalham a vida dos cidadãos, das nações e do mundo.
É imperativo que identifiquemos e glorifiquemos os nossos heróis, alcandorando-os à posição de paradigmas para a juventude, e não só; mas é também fundamental que, simultaneamente, referenciemos e rotulemos os nossos vilões, deixando claro que são MAUS EXEMPLOS, exemplos a não serem seguidos.
Felizmente que, amiúde, vêm surgindo pessoas criativas que vão dando pistas de como enfrentar a questão, sugerindo saídas para a exposição pública dos vilões. Correu mundo a sapatada que o jovem jornalista iraquiano Muntazer al-Zaidi desferiu contra o Presidente cessante dos Estados Unidos da América; antes, tinha sido a tirada do Rei Juan Carlos, mandando Hugo Chavéz calar a boca (porque não te calas?), a circular de boca em boca por esse mundo globalizado afora; mas o pioneirismo mesmo, esse pertence, pelo menos chez nous, ao meu dilecto amigo Claudino Semedo.
Claudino sugeriu à Câmara Municipal da Praia, através as estruturas da PRÓ-PRAIA, que, a par das medalhas, distinguindo os melhores praienses (entendido aqui como todos os residentes na área metropolitana da Capital) em cada sector de actividade, fosse também instituída a entrega de TABAQUÊROS aos praienses (na mesma acepção da anotação anterior) que por atitudes, posturas e procedimentos (políticos, profissionais ou outros) prejudicarem seus concidadãos ou a qualidade de vida na Capital. As medalhas e os TABAQUÊROS seriam entregues na mesma sessão solene e o facto de num ano se ter recebido um TABAQUÊRO não seria impeditivo de, no ano subsequente, se poder receber uma medalha, à condição de a merecer. E vice-versa: nada impede que um tabaquêrado de um ano seja um medalhado no ano seguinte.
Em 2008, a personalidade do ano, no segmento Mundo, parece que não suscita muitas dúvidas: é BARACK OBAMA. John McCain é, no meu entender e pela lição de democracia que deu quando os resultados foram conhecidos, um digníssimo merecedor da medalha de prata. No Continente a medalha de ouro vai para quem? Nelson Mandela, Julius Nyerere, Kwame N’Krumah, Muhamar Kadhafi, Mia Couto ou outro? No país? Carlos Veiga, D. Arlindo Furtado, Nelson Évora ou a CASA DO CIDADÃO e o NOSi (pelo passo de gigante dado em direcção ao e-governement)? Na Região (Santiago, of course)? Ulisses Correia e Silva e Jacinto Santos, Francisco Tavares e Fernando Tavares (TOCO) ou Orlando Sanches e Orlando Dias? Na Capital? Jacinto Santos (pelo papel na consecução da alternância política na autarquia da Capital), CALÚ & ÂNGELA (pelo empreendedorismo), Ulisses Correia e Silva (pelo esforço de reorganização da Cidade) ou a Moura Company (pela renovação da frota de transportes públicos urbanos de passageiros)? Os citados ou outros, a verdade é que a posição onde hoje nos encontramos é o resultado do esforço de muita gente: políticos, empreendedores, religiosos, cidadãos anónimos. Um pequeno momento de reflexão para buscar identificar «os mais» do ano não há-de ficar mal a ninguém. E aqui fica o repto.
Na pista de Semedo, a par das distinções positivas (p.e. personalidade do ano no Mundo, no Continente, no País, na Região e na Capital) vamos tentar provocar as pessoas levando-as, desta feita, a tentar identificar as pessoas merecedoras de um TABAQUÊRO (para cancã, obviamente)? Legítimo jacarandá, claro.
O TABAQUÊRO para canastrão do ano, a nível mundial, deve ir para robert mugabe, o homem que revelou ao Mundo o ataque químico de que os zimbabueanos foram vítimas (por parte do Governo de Gordon Brown) e que os cientistas confundiram com CÓLERA. Disputam o TABAQUÊRO com mugabe, os senhores de guerra da Somália e do Sudão.
A nível do Continente, e infelizmente, os candidatos são os mesmos. Triste sina a nossa ou somos demasiado duros connosco mesmo? É que os «nomeados» para o TABAQUÊRO de pior do Mundo são todos africanos.
No país, para quem vai o TABAQUÊRO? Um político? Qual? António Monteiro/Mário Moniz, das UCIDes (pela ameaça de cisma em um partido tão pequeno)? Ou Jorge Santos/José Maria Neves (pela crispação política que se vive no país)? Fernando Elísio Freire/Rui Semedo (pelas vezes que se deixaram ultrapassar em dossiers que, aparentemente, conduziam com maestria)?
Na Região (entenda-se a região de Santiago), quem será o digno merecedor do TABAQUÊRO? Políticos? Pedro Alexandre e António Costa Lima? João Baptista Freire e o Comité de Sector de Santa Catarina do PAI? O Sector Urbano do PAI na Capital? Empresários? Os proprietários (e condutores) dos HIACES que não respeitam os passageiros que transportam, ultrapassando a lotação imposta às respectivas viaturas? Aos transportadores de escombros e inertes que estragam as estradas da ilha com os detritos com que vão assinalando o seu percurso, ao mesmo tempo que seguem instalando armadilhas mortais para quem percorra o mesmo caminho, depois deles? Os responsáveis pelo desporto que insistem em privilegiar clubes do Sul, em detrimento dos do Norte, perpetuando o atraso de Santiago Norte? Os responsáveis políticos que mandaram destroçar o pequeno exército de extensionistas rurais, sem dúvida os principais artífices do relativo sucesso dos agricultores de Santiago? Por estes lados há tantos candidatos ao TABAQUÊRO que talvez seja o caso de se distribuírem TABAQUÊROS para todos os que forem sendo nomeados (e mais alguns, à cautela).
Na Capital? Na Capital o TABAQUÊRO vai, ex-aequo:
- Para os Deputados eleitos para o Círculo eleitoral da Praia, por não terem sabido (ou querido) cumprir a Constituição e dotar a Capital do Estatuto administrativo especial, preconizado na Carta Magna;
- Para a Câmara Municipal da Praia, pela pobreza que foi (ou não foi) a decoração da Cidade para a quadra festiva (do Natal e do Final do Ano);
- A Alta Administração das forças de ordem pelo recuo perante as hordas de pequenos traficantes, thugs e triple X (os operacionais são aqui poupados, por razões mais do que óbvias).
Para terminar esta incursão, só resta recomendar uma medalha especial para o Claudino, pela ideia genial; um TABAQUÊRO… para os mariolas que provocaram a CRISE que assola o planeta; e, last but not least, registar os meus sinceros votos de FESTAS FELIZES para todo o Mundo (Cristãos e não Cristãos), com PAZ, AMOR E SAÚDE. De montão.

Monday, December 15, 2008

TO SANTA CLAUS

“As religiões são fundadas no medo de muitos e na esperteza de poucos.”
Stendhal
Velho amigo e fantástico Senhor,
Serve esta para pedir a sua intercessão para que uns compatriotas meus, muito especiais, possam ter um Feliz Natal e um Ano Novo durante o qual possam ver os seus sonhos mais secretos se realizarem.
Há-de se lembrar que eu nunca fui de lhe pedir nada. Correcção: pedi até ao momento em que reparei que o senhor levava os melhores brinquedos aos miúdos cujos pais podiam comprar os melhores brinquedos. Criança ainda pude entender que um velhote tão simpático não podia ser cultor de uma tão estulta preporância (de prepotência + arrogância, mesmo), ser um reles cavador de fosso entre ricos e pobres. Um absurdo, isso. Quem daria guloseimas admiráveis, brinquedos de sonho e jogos fantásticos, para miúdos cujos pais tinham grande poder de compra; brinquedinhos baratos, queques simples e muita imaginação, para aqueles cujos pais tinham pouco; e nada, fome e frio, para as desgraçadas crianças filhas de pais desgraçados, sem salário, sem emprego, sem sorte, nem solidariedade? Quem? A conclusão lógica, que entrava pelos olhos adentro, era que o senhor trabalhava para uma empresa do ramo de entregas. E como tal, entregava as encomendas nos endereços certos. Vez por outra poderia calhar uma entrega por engano, mas como quando emergi neste vale de lágrimas já o amigo tinha barbas brancas, o mais certo seria não lhe perdoarem erros de principiante.
Ficamos, pois, em que nunca me deu mais, nem melhor, do que o senhor Ludgero, meu pai, dona Lídia, minha mãe, dona Sílvia, minha madrinha, tio Avelino, meu padrinho, ou nhâ Mariazinha minha avó, lhe incumbiram de me entregar. Eu nunca esperei mais do que isso; o amigo me entregava exactamente isso. Por isso, sempre estivemos quites.
Mais tarde, passei a contratar os seus magníficos serviços. Durante anos, sempre pelo Natal, utilizei os serviços da sua empresa de entregas para depositar brinquedos, jogos e guloseimas na chaminé de dona Paula e nas meias do Kwami, da Aïcha, do Tony e, ultimamente, nas da Paulinha.
Há-de estar a perguntar o porquê de tantos rodeios. É que quero, agora, homem feito, fazer-lhe um pedido. Repare bem: fazer-lhe um pedido e não encomendar-lhe um serviço. Posso pedir?
Cá vai, velho amigo e fantástico senhor. Quero que coloque nas chaminés e nas meias de uns conhecidos meus uma prenda sui generis. Já ouviu falar do processo de revisão da Constituição política da República de Cabo Verde? Não diga que não. Espreitei o seu canhenho e vi lá anotados pedidos de muitos conhecidos meus. Do Nhelas Bacelar, do Nhoné da Silva, e de muitos mais. Pois é. Então? Gravador preparado?
Vou querer para o Nhelas, para o Nhoné, e para o resto da malta, que a Constituição política da República de Cabo Verde apareça revista nos moldes seguintes, conforme os artigos abaixo:
1. Artigo 10º: que a Capital da República passe a ser a Cidade do Mindelo, na ilha de Sanvicente e que, em decorrência da nova função, passe a ter um estatuto político-administrativo especial, nos termos da lei;
2. Artigo 42º: que se possa invadir o domicílio de qualquer cidadão, a qualquer hora da noite ou do dia, sem mandato judicial. Excepção feita aos políticos profissionais, familiares e amásias; empresários que financiem os partidos; e traficantes;
3. Artigo 43º: fica permitido aos superiores hierárquicos, de qualquer nível, invadir as caixas de correio electrónico de seus subordinados, sempre que suspeitem que este não os tenha em grande conta;
4. Artigo 54º: que o direito de participação na vida política fique reservada apenas às cabo-verdianas e aos cabo-verdianos que tenham problemas das vias respiratórias superiores (p.e. resfriados permanentes, sinusites e rinites crónicas) e tenham estômago muito forte;
5. Artigo 78º: todos têm direito à cultura, mas uns têm mais direitos do que outros; para garantir a diferença entre os iguais e os mais iguais, incumbe ao Estado reforçar as assimetrias e promover a desigualdade entre as parcelas tradicionalmente mais cultas e as culturas emergentes, mormente as de cunho africano;
6. Artigo 114º: o número de deputados por colégio eleitoral continua a ser proporcional ao número de eleitores inscritos, mas nenhum círculo ou ilha pode ter mais mandatos do que o círculo especial que engloba a nova capital da República;
7. Artigo 118º: são órgãos de soberania o Presidente da República, o Senado, a Câmara dos Deputados, o Governo e os Tribunais; no Senado todas as ilhas serão representadas por 2 senadores, à excepção da ilha que alberga a nova Capital, a qual, como compensação pela capitalidade, elege 4 Senadores;
8. Artigo 124º: sempre que for eleito para Presidente da República um cidadão que não tenha domicílio eleitoral ou não tenha nascido na ilha que alberga a nova Capital, o próximo Presidente terá de ser, obrigatoriamente, um cidadão com domicílio ou umbigo registados na ilha que alberga a nova Capital;
9. Artigo 139º: os cidadãos cabo-verdianos são representados pelas assembleias das duas Câmaras parlamentares, as quais se organizam verticalmente;
10. Artigo 140º: o Senado tem um total de 20 Senadores e a Câmara de Deputados um máximo de 52, sendo que a emigração elegerá sempre 6 deputados;
11. Artigo 227º: as autarquias locais são as regiões político-administrativas e os municípios, podendo a lei estabelecer outras categorias de grau inferior ao município;
12. Artigo 258º: não podem ser objecto de revisão, de entre outras normas, as que determinam a localização da Capital da República e o seu estatuto político especial; a composição do Senado; a regionalização política; e as demais que, na Constituição revista, outorguem prerrogativas e regalias especiais para a região política especial da Capital e para a ilha que a alberga.
Só mais um pedido, meu velho: não quero que nem o Nhelas, nem o Nhoné, nem nenhum dos rapazes saibam que as prendas foram a meu pedido. De tão insistentes que têm sido, pelas cedências que têm feito, à cata de uma tal recompensa, receberiam as prendas - agora dadas de mão beijada - com alguma desconfiança. Sejamos francos Pai Natal: com muita desconfiança, mesmo. É que quando a esmola é muita o santo desconfia. Mas acredite, senhor. É de coração.
Ficaria por aqui, velho amigo e fantástico senhor, não fosse poder parecer deselegante mandar tantas prendas a uns simples conhecidos e não dar nenhum cavaco aos meus presidentes, senhores João José Almeida Gomes, Presidente da PRÓ-PRAIA e José Ulisses Correia e Silva, Presidente da Câmara Municipal da Praia. Para eles, entregue, por favor, cópias da lista das prendas enviadas ao Nhelas Bacelar e companhia limitada. Quem sabe, um dia me perdoem tamanha prodigalidade.
Seu admirador, SEMPRE,
Antoninho

Wednesday, December 3, 2008

DELFINATO: PROBLEMA OU SOLUÇÃO?

“Ralham-te? - Não te zangues, como te aconselha a tua soberba. - Pensa: que caridade têm para comigo! Quanto não, ter-se-iam calado!”

Josemaría Escrivá


Pensava eu que essa de delfinatos já era. Primo, porque delfim não rima com democracia. Secundo, porque com o espírito de competição que se instalou nas democracias que conhecemos não é compatível com a existência de «dinastias», nem mesmo encapotadas. Terço, porque a questão da sucessão é um assunto sério que exige planeamento, forte investimento na incubadora de lideranças e criação de espaço para debate de ideias, não podendo, por isso mesmo, ser ditada por nenhum tipo de apadrinhamento ou por mera afinidade entre o substituído e o substituto.
Cá entre nós, sempre pensei que, caído o regime de partido-estado, não mais haveria espaço para a prática do delfinato. «Quem quer uste, que lhe custe», diz o vulgo. «Quem tem unhas é que toca guitarra», diria o portuguesinho.
Mas, logo, no primeiro Congresso após a derrota de 13/01/91, Aristides Raimundo Lima acederia ao posto de Secretário-Geral do PAI, pelas mãos de Pedro Pires. Tido como o delfim deste último, cedo surgiram algumas dúvidas sobre a capacidade de Lima para combater o movimento rabentola, detentor de um discurso virulento e que decidira pela eliminação ternurenta do que chamavam o «partido velho». Até Pires teve dúvidas. Aliás, que casta de padrinho lançaria o afilhado assim às feras?! Assim, faz de Lima Secretário-Geral do partido, mas, à cautela, institui o cargo de Presidente de honra que reserva para si próprio. O delfim estava protegido.
Mas Lima não resiste à investida ventoinha. Pires é obrigado a voltar à ribalta. Estatutariamente, o chefe do partido deixa de ser o SG e passa a designar-se Presidente. Desaparece o posto honorífico, que fora desenhado à imagem e semelhança de Pedro Pires.
Mas Pires tem uma grande surpresa. Ele, que colocara um seu delfim na chefia política do partido, vê-se a braços com um problema completamente novo no PAI: é desafiado por um miúdo oriundo das fileiras da JAAC-CV e dos bancos da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas, de seu nome José Maria Pereira Neves. A surpresa é tanta, e tão ameaçadora do status quo, que Pires não enfrenta José Maria sozinho. Rodeia-se de três Vice-Presidentes (uma curiosa combinação intergeracional, com Silvino Manuel da Luz, um peso pesado da velha guarda, e os jovens activistas Felisberto Alves Vieira e Manuel Pinto Frederico). Neves não se acobarda e diz, para quem quis ouvir, que respeitava Pires e o seu percurso político, mas que o velho Comandante era chão que já dera uvas, bananeira que já dera cacho. Que não tinha mais nada a dar para Cabo Verde. Era um apelo forte para um voto de confiança na sua juventude.
José Maria perde o pleito, mas ganha a pole position para os embates do futuro. Soube logo que tinha posto em causa não só o delfinato de Pires, como a própria velha guarda do seu partido, composta, na sua maioria por combatentes das frentes da Guiné.
Não estranhou nada que, em 2000, em um Congresso que o próprio Neves achava desnecessário, este se tenha elegido Presidente do PAI. Foi um golpe decisivo no sistema de delfinato. Pires deixa Felisberto (seu delfim e seu Vice-presidente) à sua sorte. Diz quem sabe (parece ser mais uma lenda urbana, mas, who knows?!) que, interpelado porque não aparecia a apoiar a lista F, liderada por um seu delfim e recheado de piristas, Pires teria respondido desta forma enigmática: Não é Primeiro-ministro quem quer. Para bom entendedor…
Mas estranhou que um jacobino como Veiga não tivesse aprendido a lição do seu adversário de estimação. Nesse mesmo ano, na altura em deixava a liderança do partido e do Governo para embarcar na aventura presidencial, não hesitou e fez-se substituir por um seu delfim, de seu nome, António Gualberto do Rosário. O delfim viria a falhar em toda a linha. O preterido Jacinto Santos não tem a fleuma de José Maria Neves. Bate com a porta e vai fundar um novo partido. E, desde então, o partido não se encontra. Alinha sucessivas vitórias nas eleições locais, mas falha o alvo quando a questão é ganhar uma maioria, um Governo ou um Presidente. Por essas bandas creio que o delfinato já era. Foi de muito triste memória.
Contava que, agora, quando a disputa por lugares elegíveis, por cargos de destaque e por outras prebendas, se tornou tão acirrada; após as experiências (nada agradáveis, por sinal) do PAI e do MpD, num passado recentíssimo, acreditava piamente que delfins, nunca mais. Ledo engano.
E isso, confesso, me deixa confuso. Se os dois maiores (para não dizer os únicos) partidos do cenário nacional tiveram “viagens” desagradáveis de cada vez que ensaiaram a substituição do líder pelo seu delfim, porque cargas de água um deles parece estar agora decidido a repetir a dose?
Porque se Manuel Inocêncio Sousa diz que só sai do Governo quando lhe aprouver (confesso que não ouvi directamente da boca dele, mas li e foi-me contado por gente acima de qualquer suspeita), isso só pode significar que tem garantias do Primeiro-ministro, a outra pessoa que poderia fazê-lo sair. É que ele é peremptório: DAQUI NÃO SAIO, DAQUI NINGUEM ME TIRA. E isso soa a discurso de delfim. Delfim velho, discurso inoportuno, mas, quand même, discurso dinástico. Se não, o que mais justificaria a atitude de Inocêncio Sousa? O que lhe daria tamanhas garantias?
Declaração tão musculada quanto a de Inocêncio, só ouvira ainda de Paulo Portas, Presidente do CDS/PP e Ministro de Estado e da Defesa do Governo de José Manuel Durão Barroso (coligação PPD/PSD – CDS/PP). Em plena crise da Universidade MODERNA, quando todo o mundo pedia a sua cabeça, porque envolvido até às orelhas no escândalo, eis que Portas, do alto dos 9% do CDS/PP (ou seriam 6?), declara: EU SÓ SAIO DO GOVERNO QUANDO QUISER. Mas Portas estava fazendo, claramente, uma manifestação de força. Chantageava Barroso, descaradamente: SE ME AFASTARES DO GOVERO, RETIRO O CDS DA COLIGAÇÃO E FICAS SEM MAIORIA PARA GOVERNAR. O QUE DECIDES? É PEGAR OU LARGAR.
Terá Inocêncio cacife para desafiar José Maria Neves, de forma tão ostensiva? Pode fazer cair o Governo de JMN? Ou tem a maçonaria do seu lado e JMN conta com o seu apadrinhamento para entrar também? Pessoalmente, estou em crer que a atitude, a postura e o comportamento de Inocêncio são de alguém que se sabe garantido ao mais alto nível. E uma tal garantia só pode vir de José Maria Neves.
Mas mesmo sendo esse o caso, Inocêncio está equivocado. Não sai quando quer. É que o protector pode deixar cair o protegido (o delfim, o afilhado) num estalar de dedos. Like that. É o delfim que depende do padrinho e não o contrário. Talvez lhe valesse de algo investigar para ficar a saber como é que Zé Maria ultrapassou Filú sem que Pires mexesse um dedo; como Filú ficou chateado si quando ouviu, pela comunicação social, que o padrinho, contra todos os sinais (não teriam sido, antes, garantias?) que lhe dera, iria bisar na corrida presidencial (2006).
Agora, por exemplo, bastaria que Neves revisse os resultados conseguidos pelos delfins cá de casa, reavaliasse as garantias dadas a Inocêncio e se decidisse pelo encerramento, com chave de oiro, da era dos delfinatos, deixando cair o «seu» delfim. Para que aprenda a não desconversar.

Monday, December 1, 2008

ANTROPOFÁGICO

“Hay que enduricir, pero… sin perder la ternura jamás.”
Ernesto «CHE» Guevara

O processo de substituição de líderes partidários em Cabo Verde oferece-se como um campo fértil para investigadores. E aqui deixo o desafio para a classe mais que fundamental para o desenvolvimento de qualquer país.
No momento, temos, num horizonte temporal relativamente curto, a questão da substituição de José Maria Neves, no PAI, e de Carlos Veiga no MpD. De Carlos Veiga, sim senhora. Que, se Pedro Pires conseguiu um sucessor à altura, o mesmo não se poderá dizer em relação a Veiga. E porquê? Antes de mais, devida à antropofagia do sistema MpD para com os seus números 2 naturais.
Pouco tempo depois da instalação, em 91, do Governo do MpD, Jorge Carlos Fonseca, recém regressado do Oriente, aparece claramente como o segundo homem do partido, mercê do seu perfil sociográfico e da vitória que foi ter conseguido a eleição de Cabo Verde como membro do Conselho de Segurança da ONU. Meses depois, e após declinar um “convite” para deixar a pasta dos Negócios Estrangeiros e assumir o posto de Secretário-Geral do partido, é afastado do Governo… e do partido.
Após a saída de Fonseca, é Eurico Monteiro que desponta, destacadamente, como o número 2 de Veiga. Acossado pelo sector menos atreito à disciplina no seio do MpD, envereda-se por uma contestação extemporânea à liderança de Veiga e acaba determinando o seu afastamento do Governo… e do partido, protagonizando o primeiro cisma do MpD.
Depois da saída de Monteiro (e de sua turma) emergem no MpD alguns novos notáveis: Agostinho Lopes e Simão Monteiro (agraciados pelos serviços prestados no processo antropofágico em relação a Monteiro) e Mário Silva. Mas quem é, de facto, o número 2 do partido é Jacinto Santos. Santos lidera o processo de afastamento de Monteiro e de cassação dos mandatos dos deputados que, alegadamente, alinhavam com Monteiro. Mas o que, verdadeiramente, catapulta Jacinto Santos é a renovação do seu mandato à frente da Câmara da Praia e o seu papel na renovação da maioria qualificada do MpD (superior à de 91) nas legislativas de 17/12/95. Mas cedo é tragado (e depois expelido) pelo sistema. Depois de se ter posicionado expressamente para substituir Veiga, é duramente criticado por este no encontro de São Jorginho (ele era um dos gafanhotos a quem Veiga prometeu cortar o esporão). Acaba deixando o partido, protagonizando o segundo cisma do MpD.
Depois da memorável reunião de São Jorginho não restou qualquer dúvida, para quem acompanhava as coisas com alguma atenção, que Veiga decidira que seria Gualberto a substitui-lo. No partido e no Governo. O novo número 2 (indigitado) protagoniza uma luta desigual com Jacinto Santos (o apoio de Veiga é determinante) e acaba substituindo o «padrinho» na Presidência do MpD e na Chefia do Governo. Só que foi Sol de pouca dura. Aparece envolvido no esquisito processo de substituição de Veiga na Chefia do Governo, para depois falhar nas Legislativas de 14/01/2001. Mas, pecado dos pecados, foi a “devolução” precipitada do poder, fazendo com que fosse um Governo (de transição) do PAI a conduzir o processo eleitoral para a Presidência da República. Os rabentolas não lhe perdoam a gaffe que consideram ter ditado a sorte de Veiga naquela que foi a mais contestada de todas as eleições que tiveram lugar em Cabo Verde. No final, comeu o pão que o diabo amassou, vendo-se na situação de tomar conhecimento oficioso de reuniões do partido, de que era ainda Presidente, para as quais não era convidado. Na sequência, é obrigado a deixar a liderança do partido. É mais um nº 2 que é moído na voragem rabentola. O seu consulado, enquanto nº 1, foi tão efémero que nem deu tempo para se ver afirmar um “imediato”.
A era pós-Veiga é menos turbulenta, mas nem por isso pacífica. A grande novidade são as vice-presidências, claro sinal de lideranças fragilizadas (inauguradas com Pedro Pires, quando desafiado por José Maria Neves). Já não haveria lugar para o recurso a listas, por ordem alfabética, para órgãos executivos nacionais (ensaiado por Veiga para colocar Jacinto - um J - depois de António Gualberto – um A). A era dos vice-presidentes trouxe uma certa protecção aos números 2. Não surgindo naturalmente, pela via da notoriedade que ganham na sociedade, mercê do seu desempenho superior, já não constituem ameaça ao poder do líder. E isso muda tudo no sistema MpD. Já não são os líderes que se desfazem do seu número 2, mas são estes que empurram o nº 1 em direcção à porta da rua (serventia da sede).
Agostinho, que chega a nº1 sem nunca ter sido, verdadeiramente, nº 2, vê-se desafiado pelo seu Vice Ulisses Correia e Silva, num processo que só não culmina com a derrota daquele porque surge um elemento estranho no processo (de seu nome Jorge Maurício Santos, que fora militante, deixara de ser, e voltava então com laivos de sebastianismo) que levou a que Gualberto do Rosário se intrometesse, ditando a vitória de Agostinho, e demonstrando que não era, ainda, carta fora do baralho que é o sistema MpD. Mas a intervenção de Gualberto só adia o inevitável. Tendo Agostinho optado por chamar JMN para um suicida um-contra-um nas eleições legislativas de 2006, nada nem ninguém poderia mantê-lo à frente do partido. É empurrado porta fora por Jorge Santos que, entretanto, se posicionara como seu sucessor natural. Mais do que natural.
No momento, o sistema MpD parece estar a braços com um Presidente que, em vez de se cobrir com as vestes de estadista (candidato a Primeiro-ministro obriga), insiste em reforçar a sua vertente de activista político. Ninguém pode, honestamente, pôr em dúvida a capacidade de JS para agitar as águas, animar a malta, sacudir o partido. Mas, no momento, do que o MpD precisa é de um estadista, uma alternativa credível a JMN e um sucessor para o grande Carlos Veiga. E JS não está conseguindo entrar no papel. E o curioso disto tudo é que quem põe JS em causa não é qualquer número 2 (formal ou natural), mas as suas próprias acções e opções, fazendo o MpD averbar desaires na frente parlamentar, em situações que, à partida, lhe seriam favoráveis. Um partido de oposição, com os pergaminhos, o percurso, a ideologia e o programa do MpD, não pode ter outro resultado que não seja a vitória em ocasiões como o debate do estado da nação, a reforma da Justiça ou uma sessão de interpelações várias ao Governo em dossiers super sensíveis para este. É inaceitável. E JS acaba de registar um hat trick de gols contra. Paulo Bento e Soares Franco já devem andar de olho no homem.
O que vai acontecer agora? Não tendo JS um destacado nº2 para sacrificar, nem para ser empurrado por, a sua sorte (e do MpD) obriga a que o partido se volte para dentro e procure identificar um candidato a Primeiro-Ministro que seja capaz de, a um tempo, mexer com as bases, unir o partido e passar a imagem de estadista com potencialidades para enfrentar (e derrotar) JMN, atrair os indispensáveis votos de não-militantes e, sobretudo, de representar condignamente o país na arena internacional. Quem é esse homem?
No momento, não vislumbro, assim de repente, ninguém que se encaixe no perfil a ponto de se olhar para ele, apontar o dedo e bradar: ECCE HOMO! O que não quer dizer que não ele não existe. Se se vasculhar bem o baú… quem sabe? Ulisses Correia e Silva, Mário Silva, Fernando Elísio Freire, Eurico Monteiro, José Luís Livramento, Isaura Gomes e muitos mais estarão no bendito baú.
Ulisses pode mexer com as bases, pode unir o partido e passa a imagem de estadista com potencialidades para enfrentar JMN, atrair os votos de não-militantes e de representar condignamente o país na arena internacional. Mas tem um compromisso com a Praia que, a princípio, não deve romper para se candidatar à liderança do MpD e a Primeiro-ministro. De todo o modo, se o fizesse - cedendo a insistentes pedidos da Nação – não estaria fazendo nada que ainda não tivesse sido feito. Veja-se o caso de José Maria Neves em 2000/2001.
Mário Silva não se decide. Mas pode muito bem ter chegado a sua hora. Contra ele milita, porém, o facto de não ter grandes ligações com as bases rabentolas e de não poder contar com o apoio dos generais oriundos do finado PCD e liderados pelo Marechal Eurico Monteiro.
Fernando Freire, o jovem líder parlamentar, é outro fulano muito bem posicionado. Poderá jogar contra ele o que tem de melhor (a sua juventude) e o laço de parentesco que mantém com JS: não poderá desafiá-lo sem consequências, sem contar que alguns sectores poderão ver na sua candidatura (injustamente, diga-se em abono da verdade) um expediente de Santos para permanecer na esfera do poder ventoinha.
Eurico Correia Monteiro é um candidato natural à sucessão de Santos, pelo menos, na situação complicada em que o partido se encontra. Contudo, dificilmente se poderá livrar do rótulo de «filho pródigo». E há gente no MpD que, tal qual o irmão mais velho do pródigo do evangelho, não aceitará confiar o destino do partido a um arrependido.
José Luís Livramento enfrenta os mesmos problemas que Eurico. E mais alguns: os da falange PCD, do MpD, não lhe vão facilitar a vida. Antes pelo contrário.
Isaura Gomes. Isaura, Presidente da Câmara Municipal de São Vicente? OK. Isaura, Primeiro-ministro?! Si… se puéde. Pero… À partida, uma mulher candidata ao cargo mais importante do ranking nacional de cargos, poderia ser uma opção inteligente. Mas conseguiria Isaura mobilizar os necessários apoios? Conseguiria encaixar-se no perfil traçado para o sucessor de Santos? Aos rabentolas de responder e de agir em conformidade.
Da antropofagia dos fortes e populares números 2 dos bons velhos tempos de Veiga, à penúria de homens fortes do MpD dos dias de hoje, vão apenas 8 anos, mais coisa, menos coisa. Dá para inquietar e torna-se forçoso registar esta questão: que futuro para uma organização tão importante para o regime democrático instalado nas ilhas?
Mas… talvez esteja a ser precipitado e não haja problema nenhum para ser resolvido. De todo o modo, e em havendo, sempre haveria uma solução, digamos, perfeita: CHAMAR O VEIGA!

Friday, November 28, 2008

PRAIA: SOLUÇÃO E… SOLUÇÕES

“Resultados? Mas é claro que eu já consegui um monte de resultados! Hoje sei de mil coisas que não funcionam.”

Thomas A. Edison

Há Solução e… soluções. Conhecem aquela do fulano que, num acto de desespero, tragou uma medida de Solução para Bateria (H2SO4) e que, diante de morte iminente, rogou ao médico que não medisse esforços para o salvar.
- Senhor Doutor, arranje uma solução para o meu caso. Por favor – teria clamado.
- Não tenho solução nenhuma para o seu caso. A Solução que havia, o senhor bebeu-a toda.
Humor negro. Mas o cabo-verdiano, qual Poliana, consegue descobrir uma faceta lúdica, mesmo na desgraça. Própria ou alheia.
Ocorreu-me este trocadilho a propósito das soluções que o edil José ULISSES tem vindo a construir para a Cidade da Praia.
Começou com uma novidade: A AUDIÊNCIA TÉCNICA SOBRE O SANEAMENTO. Ponto para a Cidade. Ponto para ele. Há quem diga que os problemas da Praia há muito que estão identificados e que o que importa é a SOLUÇÃO para os mesmos. Importava, neste particular, não esquecer que pode acontecer um resfriado se transformar numa mortal pneumonia dupla. O que se atacaria no caso: o resfriado ou a pneumonia? Por isso, não pode ser considerado como tempo perdido o tempo que se leva na reavaliação do «doente». Pode conter uma SOLUÇÃO.
A segunda novidade teve a ver com a deslocação ao Norte de Portugal para assistir a uma corrida de aeronaves. Não sei que diga. Mas a verdade é que enquanto prioridade deixa muito a desejar. Seguramente não tinha no seu bojo nenhuma SOLUÇÃO para os ingentes problemas da cidade.
A terceira (se não considerarmos os diz-que-diz politiqueiros sobre o recrutamento de aficcionados e a dispensa de desafectos políticos, um fait-divers presente em todo o território nacional) terá sido a aquisição do TOYOTA LAND-CRUISER V8. A polémica que se seguiu à aquisição da viatura do Presidente não deixou claro se se era contra a aquisição de uma tal viatura por causa do preço ou se por causa do momento. Se toda a celeuma foi apenas por causa do preço, houve um exagero sem tamanho. Porque é que o presidente da Câmara Municipal da Praia (sem dúvida a mais importante do nosso universo autárquico) não pode ter um carro como o do Presidente da Câmara Municipal da Boavista, por exemplo? É certo que é um carro cujo preço andará à volta dos 7.000 contos (mais coisa, menos coisa), mas se o Tesouro assegura 75% do preço (em impostos e taxas), 4.250 contos não é nenhum desembolso por aí além, para um carro com uma garantia de, pelo menos, 04 anos? Compreenderia melhor se se questionasse a prioridade conferida à aquisição, mormente tendo em conta que o ST – 53- CJ é um tremendo de um VX da TOYOTA PRADO, que dava ainda p’ro gasto e que a situação financeira da edilidade, dizia-se, ser pouco menos que caótica. E resmungaria, principalmente, por saber que o V8 não foi a única aquisição automotora de luxo feito na ocasião. Será uma SOLUÇÃO para a mobilidade do Executivo municipal ou para um ego desmedido? Bem… de todo o modo, é um património (que pode ser utilizado, alienado, permutado, etc., a todo o tempo).
A quarta conquista tem a ver com a recuperação dos espaços dotacionais da Cidadela. Amplos espaços destinados à implantação de equipamentos sociais urbanos para servir o novo bairro, a maior parte deles não infra-estruturados (por exemplo, sei de fonte segura que pelo espaço que estava destinado ao campo de futebol não passava nem a rede de água, nem a de electricidade, mormente a de esgoto). Como se desenrascaria quem construísse em um dos lotes do espaço? Aí, tem de se bater palmas ao nosso síndico. Contém, sem dúvida, uma SOLUÇÃO (respeito pelos espaços dotacionais, exercício da autoridade).
A quinta grande medida pública tem a ver com o anúncio do RETORNO À NORMALIDADE NA RUA 5 DE JULHO E RESPECTIVAS PERPENDICULARES. Se se concretizar é ponto marcado junto de toda a população (velhos e moços). Exercício de autoridade, respeito pelo cidadão, sua saúde e tranquilidade, reconfiguração (início) das funções do Plateau. Sem dúvida uma SOLUÇÃO para um problema que já está ganhando barbas. Mas… concretizar-se-á? Vai o Presidente até ao fim? É a prova de fogo de José ULISSES. A ver vamos.
A sexta medida tem a ver com a ideia de um Terminal Rodoviário, Interurbano, de Transportes de Passageiros. A ideia é boa, mas não boto muita fé em um terminal rodoviário de transportes interurbanos localizado no coração da cidade. Um terminal rodoviário de transportes Interurbanos de Passageiros deve se localizar no limite (à entrada) da cidade. Os veículos de transporte interurbano deixam aí os seus passageiros, os quais serão transportados ao centro da cidade em veículos (autorizados) de transportes urbanos de passageiros. E nós até temos uma vantagem, rara noutras paragens: as nossas viaturas de transporte interurbano são menores que as de transporte urbano (um autocarro da Moura absorve os passageiros de dois ou três HIACES), o que garante que não haveria congestionamento do terminal. A localização na Achada São Filipe, por exemplo, facilitaria a vida aos fiscais rodoviários. Qualquer HIACE encontrado Achada São Filipe abaixo com passageiros poderia ser autuado sem rebuço. A presunção de que estaria em infracção resultaria do facto de os HIACES não estarem habilitados para o transporte urbano de passageiros. E não haveria grande problema em identificar um privado para uma PPP (Parceria Público-Privado): os espaços comerciais dos terminais rodoviários de passageiros valem oiro e são disputados à tapa em quase todas as latitudes. A MOURA COMPANY não se disponibilizaria?
Na zona que defendemos para a localização do terminal Rodoviário de Transportes Interurbanos de Passageiros já existem o MERCADO ABATECEDOR, o MATADOURO MUNICIPAL, um POSTO DE ABASTECIMENTO DE COMBUSTÍVEIS. Isso permitiria que se poderia ir ainda um pouco mais longe na organização da cidade: a par do terminal de passageiros, e na envolvente do MERCADO ABASTECEDOR, poderá ser instalado um terminal de carga. Os fornecedores grossistas descarregam no terminal, expõem e vendem no MERCADO ABASTECEDOR; os açougueiros descarregariam o gado directamente para o MATADOURO; os retalhistas adquirem no MERCADO ABASTECEDOR para oferecerem nos mercados (municipais e não só) da cidade. Seria a completa liberação das “margens” do Mercado do Plateau para outros fins: kyosques, expositores de flores e plantas ornamentais, gifts, postais, selos, etc.. Saber que a edilidade reconhece o papel de um terminal rodoviário de transportes interurbanos de passageiros na organização do tráfego urbano e de toda a cidade, já é um PONTO a favor. Agora SOLUÇÃO mesmo, seria dar-lhe uma localização estratégica.
Medida não anunciada (se anunciada seria a sétima) tem a ver com a reanimação dos SEMÁFOROS. Fiquei sumamente contente, feliz mesmo, quando vi, no último fim-de-semana, uma equipa internacional (uns europeus e alguns africanos) pintando e parecendo recuperar os postes que sustentam os semáforos da cidade. No primeiro encontro com o Presidente José ULISSES, pouco depois da posse, disse-lhe uma coisa que já dissera vezes sem conta ao seu predecessor: «SEI DE CIDADES QUE NÃO TÊM SEMÁFOROS; MAS NÃO SEI DE NENHUMA QUE JÁ TEVE E DEIXOU DE TER». E a minha cidade não quer se notabilizar pela negativa.
O momento é o ideal. A Capital clama por regulação automatizada do trânsito nos cruzamentos. Os semáforos seriam, por isso, bem vindos. E creio que cobririam eventuais deficits do executivo, derivados dos affaires «Corrida de Aeronaves» e «Aquisição do V8».
Negativo, negativo mesmo, só essa falta de capacidade de influenciação em relação ao programa de execução do Projecto «VIAS DA CIDADE DA PRAIA». É inadmissível que, quase um ano sobre o início dos trabalhos, o PLATEAU continue com o aspecto relaxado de um desengonçado canteiro de obras adiadas. A edilidade não pode ficar de fora da programação de obras tão importantes. Não pode calar-se, nem deixar que a calem. Que política é isso mesmo, Presidente: ADMINISTRAR RELAÇÕES DE PODER E CONQUISTAR ESPAÇOS DECISÓRIOS
A Praia tem solução, sim senhora. A questão é que ela não está à superfície. É preciso escavar (como quem escava um poço artesiano), localizá-la e bombeá-la, para resolver os problemas da cidade, de seus habitantes e de seus visitantes. Ainda que se tenha que chatear uns tantos.

Monday, November 17, 2008

PAJEM: VOCAÇÃO, ESCOLHA OU PREPARAÇÃO?

“Coragem não é a ausência de medo; é antes o sentimento de que existe algo mais importante do que o medo.”
Ambrose Redmoon

Se calhar as três coisas juntas. Um fulano tem uma vocação, que dita uma escolha e que conduz a um programa de treinamento para ser o que sente que pode fazer com excelência. Só que eu não tenho vocação para, não escolhi ser, não me preparei para ser. Por isso, não posso aceitar ser, apenas para, eventualmente, satisfazer algum ego caprichoso.
Se calhar, pessoas com preparação superior à minha ou com um percurso muito mais rico, não tenham qualquer reserva em servirem como pajem, independentemente do título que ostentem.
Compreendo perfeitamente, por exemplo, os Secretários (com maiúscula), homens e mulheres que, com ou sem vocação, investiram em formação específica e se prepararam para secretariar executivos, empresários, políticos, governantes. Estes constituem uma classe indispensável. Da Secretária do Lar (a categoria mais modesta, mas que nem por isso deixa de ser imprescindível) aos Secretários Executivos (a categoria mais bem informada sobre o andamento das coisas na Alta Administração), passando por Secretários de pessoal dirigente, Secretários de governantes e Secretários de Estado, vai todo um contínuo de agentes leais que, com ou sem vocação, se prepararam para servir, e servem, com lealdade, dedicação e excelência. Presto-lhes aqui a minha homenagem.
Faço aqui um parêntese para registar as nuances e diferenças que podem ser detectadas dentro do grupo «Secretários de Estado»: ele há o Secretário de Estado sem Secretaria de Estado que é um ajudante de Ministro com responsabilidade muitíssimo limitada; há o Secretário de Estado com Secretaria de Estado que é quase Ministro, conquanto se subordine a um; e há o Secretário de Estado dos sistemas presidencialistas que, sem deixarem de ser, politicamente, Secretários do Chefe de Estado e de Governo, têm amplas responsabilidades, muitas vezes com responsabilidades superiores às dos Ministros de certos sistemas parlamentares (mitigados ou não). Veja-se, por exemplo, o caso dos Estados Unidos da América.
Mas, voltando à vaca fria, estava falando de Pajens não titulados como tal (aliás, categoria que não consta do Catálogo das Profissões existentes em Cabo Verde) e um pouco de mim mesmo e da minha mania de pretender jamais ser o que não quiser ser. Dizia que aceitava que houvesse quem tivesse vocação e que, possivelmente, haveria quem se preparasse para ser Pajem de facto e Secretário de direito; e rematava que eu, por não ter vocação, nem preparação técnica, nem pachorra (uma mera questão de feitio) e não tendo pedido para ser, não devo aceitar ser, ainda que com um rótulo pretensioso. Confuso? Vou tentar explicar: não aceitaria fazer papel de pajem de ninguém (nem do mais cotado executivo da praça, nem do Primeiro-ministro, nem do Presidente da República) ainda que me rotulassem como Secretário de Estado sem Secretaria de Estado, Assessor ou Director de Serviço. Acho que agora consegui ser mais claro, conquanto deva ter acordado um bando de demónios, fantasmas e gongons que, quais besouros enfurecidos, se vão atirar a mim nos próximos dias.
Mas tudo bem. Pagarei o preço justo pela minha coerência. E não é por ser mais valente do que aqueles que se deixam levar; nem é por ser algum tipo António Sem-medo. Nem digo que não receie as consequências de uma proclamação destas, numa altura destas. A questão é que – parafraseando Ambrose Redmoon – anima-me o sentimento de que existe algo mais importante do que o receio pelas eventuais consequências da minha rebelião. No caso, a coerência entre o que acredito e que, de certa forma, me define, e as cedências que poderia ser obrigado a fazer, e que poderiam me descaracterizar.
Já fiz o papel de repórter desportivo voluntário (do Fogo para o VOZ DI POVO); já fiz o papel de Formador de dirigentes intermédios da Administração Pública e gostei; já me fiz de Escritor, e até calhou ganhar um prémio, mais ou menos chorudo; tenho feito o papel de pai de adultos mais altos do que eu, e creio que tenho-me saído bem; estou fazendo de colunista do jornal A SEMANA, e estou gostando bastante do papel. Mas a verdade é que escolhi ser aduaneiro e fiz a carreira direitinho. Porque aceitaria agora, no finalzinho e depois de chegar lá em cima na carreira, o papel de pajem, agente de viagens, ou outro qualquer, ainda que remunerado como um alto cargo do Catálogo da Função Pública? Vou continuar a ser aduaneiro a tempo inteiro; Pai sempre que os meus filhos (adultos) quiserem ou precisarem; e colunista nas horas vagas. E é isso ou a reforma.
Pode parecer um abuso da paciência dos meus leitores e pode até ser uma forma espalhafatosa de escapulir de um destino perfeitamente esconjurável. Mas junto de quem mais conseguiria desabafar a valer, senão com os meus fiéis leitores? É uma forma de dizer-lhes que continuo o mesmo de sempre. Apesar dos pesares. Venha o que vier!

Friday, November 14, 2008

AGENDA DOS PEQUENOTES

«Qualquer criança quando nasce é um génio; 9.999 em cada 10.000 são completa e inadvertidamente silenciadas pelos adultos.»
Buckminster Fuller

«Que a educação e a formação para a cidadania e para o desenvolvimento constituem-se em factor de promoção social do cidadão, devendo a formação ser programática, levar menos tempo e responder, efectivamente, às necessidades do mercado e do desenvolvimento.

Que a grande fraqueza reside no facto de não existir um sistema articulado de formação profissional, sobretudo, porque o mesmo ainda não está suficientemente normalizado, razão por que é preciso investir na sua consolidação, com a definição de normas claras sobre espaços e conteúdos da formação profissional.

Que, analisando o papel da educação para a cidadania, se destaca não só o papel da escola como o do professor na formação não só dos alunos mas também da própria comunidade, enquanto veículos de transmissão de valores e de novas posturas de vida e para a vida em sociedade.»

Estas foram as conclusões do Fórum da PRÓ-PRAIA realizada há coisa de um par de anos aqui na Capital da República. O tema “Educação” foi introduzido pelo Engº António Rocha Mendes Fernandes, Ministro de Educação de um dos últimos Governos de Carlos Veiga. A leitura deste praiense tocou os participantes não só pela sua clarividência como pela simplicidade. Não estranha, por isso, que os participantes tenham determinado que se registasse esta recomendação:

«Que a igualdade de oportunidades no acesso à educação e à formação deve ser considerada uma questão importantíssima, à qual se devem juntar, obviamente, a vontade individual e a necessidade de equilibrar a oferta e a procura.»

No fundo, uma das coisas que o Fórum recomenda é que o Estado deve ser coerente com o que define como sendo seu papel tanto na Constituição da República como nas leis ordinárias, ou seja o ENSINO OBRIGATÓRIO (de, pelo menos, 07 anos) e o ENSINO GRATUITO (até ao 10º ano).
ENSINO OBRIGATÓRIO de 07 anos que implica a obrigação de generalizar o pré-escolar e de compelir os pais, tutores e encarregados de educação a matricularem e a acompanharem os seus rebentos, sob pena de sanção severa. Sanção para o Estado, em acção intentada pelo Ministério Público ou pelo povo, por cada criança e/ou comunidade a quem não for garantido o acesso ao pré-escolar; sanção para os pais, tutores e encarregados de educação que deixarem educandos em idade escolar fora do sistema. E não se me venha dizer que é difícil inventariar as crianças em idade de ir para a escola: da mesma forma que se identificam os mancebos em idade de serem recrutados para o serviço militar obrigatório, assim se deve operar em relação aos miúdos que atingem a idade de ir para a escola. E hoje, com a informatização das Conservatórias dos Registos, isso tornou-se tarefa bem fácil do que antes: é só aplicar um «filtro». O que vem faltando é a necessária vontade política para tratar com seriedade um assunto que é dos mais sérios que se possa imaginar.
Sanção para os faltosos? Doa a quem doer, alguém tem de responder pela infracção (contra-ordenação para muita gente, mas, para mim, crime inafiançável). É que não há obrigatoriedade sem uma sanção para as omissões. O que tem de ser combatido é a situação que hoje se vive, em algumas comunidades, com crianças que chegam à escola com um zero absoluto de conhecimentos escolásticos e são obrigados a conviver com crianças já iniciadas no pré-escolar. E logo naquela idade em que as crianças não são nada meigas com quem sentem estar inferiorizado. Nem se pode tolerar que miúdos em idade escolar fiquem perambulando por aí, ou já pegando no pesado, à revelia dos Direitos da Criança e das Leis e Convenções contra o trabalho infantil, sem qualquer consequência para os responsáveis. Às autoridades administrativas (escolas, Delegações do Ministério da Educação, Inspectores do Ensino, a Inspecção-Geral da Educação, Câmaras Municipais, a Polícia Nacional) e ao Ministério Público devem ser dadas (têm-no já, mas é reconfirmar para evitar omissões) prerrogativas de acção correccional para combater o laxismo dos pais, tutores e encarregados de educação e a discriminação do Estado. A Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) e o Instituto Cabo-verdiano da Criança e do Adolescente (ICCA) terão também de assumir as suas responsabilidades neste particular. É que a não generalização do ensino pré-escolar e a não inclusão de crianças no sistema de ensino, por negligência, são violentas formas de violação dos direitos das crianças, com consequências que podem comprometer o seu futuro (e o próprio futuro da Nação).
Falo em negligência, porque se o Estado respeitar o princípio do ENSINO GRATUITO (pelo menos para o pré-escolar e para o EBI) não haverá outras razões para tentar justificar o injustificável. Fala-se do ensino gratuito de 09 anos, mas, na prática, nunca a educação foi tão cara entre nós. Dos meus tempos do pagamento da «CAIXA ESCOLAR» de cinco tostões, aos pagamentos sistemáticos de uma panóplia de «coisas & loisas» que hoje foram inventados, vai um abismo. Por isso, torna-se cada vez mais ingente que o Estado confirme se há um período de EDUCAÇÃO OBRIGATÓRIO ou não; e, havendo, se decida, de uma vez por todas, qual a sua extensão; e, finalmente, começar a agir de forma consequente.
Vai ser preciso uma consulta popular para que o Estado, as famílias e as demais instituições saibam do que os miúdos precisam? Acredito que não será necessário. Se não, vejamos. Alguém duvida da escolha popular se as questões forem estas:
1. GENERALIZAÇÃO DO PRÉ-ESCOLAR: SIM NÃO
2. ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA: SIM NÃO
3. SE SIM, QUAL A EXTENSÃO: 4 ANOS 6 ANOSMAIS TEMPO
4. ENSINO GRATUITO: SIM NÃO
5. SE SIM, QUAL A EXTENSÃO: 6 ANOS 9 ANOS MAIS TEMPO
Eu responderia SIM ao primeiro, ao segundo e ao quarto quesitos; 06 ANOS em relação ao segundo; 10 ANOS (2º Ciclo) em relação ao quinto e último quesito.
E o senhor Primeiro-ministro responderia como? E a senhora Ministra da Educação? E a Ministra das Finanças? E o Ministro da Juventude, a Presidente do ICCA e a Presidente do ICIEG? E a Presidente da CNDH? E a Primeira-dama? E o Presidente da «Associação para a Solidariedade e Desenvolvimento ZÉ MONIZ»? E já que estamos em momento de interpelação, como responderia Vossa Excelência, senhor Presidente da República, na sua qualidade de mais alto Magistrado da Nação e garante da Constituição?
Mas o problema nem é a resposta popular e/ou das instituições da República. Ela advinha-se facilmente. O ponto é (e sempre foi) a vontade política, necessária e suficiente, para vincar uma relação biunívoca, e coerente, entre o que PRECISA (E DEVE) SER FEITO e o que o que SE FAZ (EFECTIVAMENTE).
E nem se venha com aquela velha treta da falta de dinheiro. O DINHEIRO CRIA-SE - Gualberto do Rosário, economista político, dixit. E está aí Gualberto do Rosário, banqueiro, a prová-lo.

Monday, November 10, 2008

A PÁTRIA DE GERONIMO

Cherokees, Apaches, Sioux, Navajos, Blackfeet, Cheyennes. Jeronimo, Nuvem Vermelha, Touro Sentado. Klu Klux Klan. Irlandeses, Italianos, Britânicos, Africanos. Martin Luther King, Jesse Jackson. Steven Spielberg, Eliah Kazan, Frank Capra, Fellini. Marlon Brando, Laureen Bacall, Clark Gable. John, Bob e Edward Kennedy. George Washington, Thomas Jefferson, Franklin Delano Roosevelt. Destes grupos, qual foi olimpicamente esquecido nas comemorações da vitória de BARACK HUSSEIN OBAMA? Exactamente aqueles com cujo sangue foi regado o solo donde brotou a Nação americana: os ÍNDIOS.
Se Marlon Brando fosse ainda vivo, acredito que as coisas seriam de outro modo. Não deixaria ficar no esquecimento os reais donos das terras conquistadas pelos aventureiros europeus, massacrados e dizimados na sanha da construção de uma pátria de além Atlântico.
A pátria de OBAMA já foi de GERÓNIMO, de TOURO SENTADO, de NUVEM VERMELHA. Por Manitu, não tenhamos memória curta.
Honra e Glória à MEMÓRIA dos ÍNDIOS! Saravá Brando (um grande e coerente americano), lá onde estiveres.

Wednesday, November 5, 2008

Discurso de Obama, pronunciado diante de mais de 100 mil pessoas no Grant Park de Chicago (Illinois).

YES, WE CAN!
"Olá, Chicago! Se alguém aí ainda dúvida de que os Estados Unidos são um lugar onde tudo é possível, que ainda se pergunta se o sonho de nossos fundadores continua vivo em nossos tempos, que ainda questiona a força de nossa democracia, esta noite é sua resposta.
É a resposta dada pelas filas que se estenderam ao redor de escolas e igrejas em um número como esta nação jamais viu, pelas pessoas que esperaram três ou quatro horas, muitas delas pela primeira vez em suas vidas, porque achavam que desta vez tinha que ser diferente e que suas vozes poderiam fazer esta diferença.
É a resposta pronunciada por jovens e idosos, ricos e pobres, democratas e republicanos, negros, brancos, hispânicos, indígenas, homossexuais, heterossexuais, incapacitados ou não-incapacitados.
Americanos que transmitiram ao mundo a mensagem de que nunca fomos simplesmente um conjunto de indivíduos ou um conjunto de Estados vermelhos e Estados azuis.
Somos, e sempre seremos, os EUA da América. É a resposta que conduziu aqueles que durante tanto tempo foram aconselhados por tantos a serem céticos, temerosos e duvidosos sobre o que podemos conseguir para colocar as mãos no arco da História e torcê-lo mais uma vez em direção à esperança de um dia melhor.
Demorou um tempo para chegar, mas esta noite, pelo que fizemos nesta data, nestas eleições, neste momento decisivo, a mudança chegou aos EUA. Esta noite, recebi um telefonema extraordinariamente cortês do senador McCain.
O senador McCain lutou longa e duramente nesta campanha. E lutou ainda mais longa e duramente pelo país que ama. Agüentou sacrifícios pelos EUA que sequer podemos imaginar. Todos nos beneficiamos do serviço prestado por este líder valente e abnegado.
Parabenizo a ele e à governadora Palin por tudo o que conseguiram e desejo colaborar com eles para renovar a promessa desta nação durante os próximos meses.
Quero agradecer a meu parceiro nesta viagem, um homem que fez campanha com o coração e que foi o porta-voz de homens e mulheres com os quais cresceu nas ruas de Scranton e com os quais viajava de trem de volta para sua casa em Delaware, o vice-presidente eleito dos EUA, Joe Biden.
E não estaria aqui esta noite sem o apoio incansável de minha melhor amiga durante os últimos 16 anos, a rocha de nossa família, o amor da minha vida, a próxima primeira-dama da nação, Michelle Obama.
Sasha e Malia amo vocês duas mais do que podem imaginar. E vocês ganharam o novo cachorrinho que está indo conosco para a Casa Branca.
Apesar de não estar mais conosco, sei que minha avó está nos vendo, junto com a família que fez de mim o que sou. Sinto falta deles esta noite. Sei que minha dívida com eles é incalculável.
A minha irmã Maya, minha irmã Auma, meus outros irmãos e irmãs, muitíssimo obrigado por todo o apoio que me deram. Sou grato a todos vocês. E a meu diretor de campanha, David Plouffe, o herói não reconhecido desta campanha, que construiu a melhor campanha política, creio eu, da história dos EUA da América.
A meu estrategista chefe, David Axelrod, que foi um parceiro meu a cada passo do caminho. À melhor equipe de campanha formada na história da política.
Vocês tornaram isto realidade e estou eternamente grato pelo que sacrificaram para conseguir. Mas, sobretudo, não esquecerei a quem realmente pertence esta vitória. Ela pertence a vocês. Ela pertence a vocês.
Nunca pareci o candidato com mais chances. Não começamos com muito dinheiro nem com muitos apoios. Nossa campanha não foi idealizada nos corredores de Washington. Começou nos quintais de Des Moines e nas salas de Concord e nas varandas de Charleston.
Foi construída pelos trabalhadores e trabalhadoras que recorreram às parcas economias que tinham para doar US$ 5, ou US$ 10 ou US$ 20 à causa.
Ganhou força dos jovens que negaram o mito da apatia de sua geração, que deixaram para trás suas casas e seus familiares por empregos que os trouxeram pouco dinheiro e menos sono.
Ganhou força das pessoas não tão jovens que enfrentaram o frio gelado e o ardente calor para bater nas portas de desconhecidos, e dos milhões de americanos que se ofereceram como voluntários e organizaram e demonstraram que, mais de dois séculos depois, um governo do povo, pelo povo e para o povo não desapareceu da Terra.
Esta é a vitória de vocês. Além disso, sei que não fizeram isto só para vencerem as eleições. Sei que não fizeram por mim.
Fizeram porque entenderam a magnitude da tarefa que há pela frente. Enquanto comemoramos esta noite, sabemos que os desafios que nos trará o dia de amanhã são os maiores de nossas vidas - duas guerras, um planeta em perigo, a pior crise financeira em um século.
Enquanto estamos aqui esta noite, sabemos que há americanos valentes que acordam nos desertos do Iraque e nas montanhas do Afeganistão para dar a vida por nós.
Há mães e pais que passarão noites em claro depois que as crianças dormirem e se perguntarão como pagarão a hipoteca ou as faturas médicas ou como economizarão o suficiente para a educação universitária de seus filhos.
Há novas fontes de energia para serem aproveitadas, novos postos de trabalho para serem criados, novas escolas para serem construídas e ameaças para serem enfrentadas, alianças para serem reparadas.
O caminho pela frente será longo. A subida será íngreme. Pode ser que não consigamos em um ano nem em um mandato. No entanto, EUA, nunca estive tão esperançoso como estou esta noite de que chegaremos.
Prometo a vocês que nós, como povo, conseguiremos. Haverá percalços e passos em falso. Muitos não estarão de acordo com cada decisão ou política minha quando assumir a presidência. E sabemos que o Governo não pode resolver todos os problemas.
Mas, sempre serei sincero com vocês sobre os desafios que nos afrontam. Ouvirei a vocês, principalmente quando discordarmos. E, sobretudo, pedirei a vocês que participem do trabalho de reconstruir esta nação, da única forma como foi feita nos EUA durante 221 anos, bloco por bloco, tijolo por tijolo, mão calejada sobre mão calejada.
O que começou há 21 meses em pleno inverno não pode acabar nesta noite de outono.
Esta vitória em si não é a mudança que buscamos. É só a oportunidade para que façamos esta mudança. E isto não pode acontecer se voltarmos a como era antes. Não pode acontecer sem vocês, sem um novo espírito de sacrifício.
Portanto façamos um pedido a um novo espírito do patriotismo, de responsabilidade, em que cada um se ajuda e trabalha mais e se preocupa não só com si próprio, mas um com o outro.
Lembremos que, se esta crise financeira nos ensinou algo, é que não pode haver uma Wall Street (setor financeiro) próspera enquanto a Main Street (comércio ambulante) sofre.
Neste país, avançamos ou fracassamos como uma só nação, como um só povo. Resistamos à tentação de recair no partidarismo, na mesquinharia e na imaturidade que intoxicaram nossa vida política há tanto tempo.
Lembremos que foi um homem deste estado que levou pela primeira vez a bandeira do Partido Republicano à Casa Branca, um partido fundado sobre os valores da auto-suficiência e da liberdade do indivíduo e da união nacional.
Estes são valores que todos compartilhamos. E enquanto o Partido Democrata conquistou uma grande vitória esta noite, fazemos com certa humildade e a determinação para curar as divisões que impediram nosso progresso.
Como disse Lincoln a uma nação muito mais dividida que a nossa, não somos inimigos, mas amigos. Embora as paixões os tenham colocado sob tensão, não devem romper nossos laços de afeto.
E àqueles americanos cujo apoio eu ainda devo conquistar, pode ser que eu não tenha conquistado seu voto hoje, mas ouço suas vozes. Preciso de sua ajuda e também serei seu presidente.
E a todos aqueles que nos vêem esta noite além de nossas fronteiras, em Parlamentos e palácios, a aqueles que se reúnem ao redor dos rádios nos cantos esquecidos do mundo, nossas histórias são diferentes, mas nosso destino é comum e começa um novo amanhecer de liderança americana.
A aqueles que pretendem destruir o mundo: vamos vencê-los. A aqueles que buscam a paz e a segurança: apoiamo-nos.
E a aqueles que se perguntam se o farol dos EUA ainda ilumina tão fortemente: esta noite demonstramos mais uma vez que a força autêntica de nossa nação vem não do poderio de nossas armas nem da magnitude de nossa riqueza, mas do poder duradouro de nossos ideais: democracia, liberdade, oportunidade e firme esperança.
Lá está a verdadeira genialidade dos EUA: que o país pode mudar. Nossa união pode ser aperfeiçoada. O que já conseguimos nos dá esperança sobre o que podemos e temos que conseguir amanhã.
Estas eleições contaram com muitos inícios e muitas histórias que serão contadas durante séculos. Mas uma que tenho em mente esta noite é a de uma mulher que votou em Atlanta.
Ela se parece muito com outros que fizeram fila para fazer com que sua voz seja ouvida nestas eleições, exceto por uma coisa: Ann Nixon Cooper tem 106 anos.
Nasceu apenas uma geração depois da escravidão, em uma era em que não havia automóveis nas estradas nem aviões nos céus, quando alguém como ela não podia votar por dois motivos - por ser mulher e pela cor de sua pele.
Esta noite penso em tudo o que ela viu durante seu século nos EUA - a desolação e a esperança, a luta e o progresso, às vezes em que nos disseram que não podíamos e as pessoas que se esforçaram para continuar em frente com esta crença americana: Podemos (Yes, we can).
Em uma época em que as vozes das mulheres foram silenciadas e suas esperanças descartadas, ela sobreviveu para vê-las serem erguidas, expressarem-se e estenderem a mão para votar. Podemos (Yes, we can).
Quando havia desespero e uma depressão ao longo do país, ela viu como uma nação conquistou o próprio medo com uma nova proposta, novos empregos e um novo sentido de propósitos comuns. Podemos (Yes, we can).
Quando as bombas caíram sobre nosso porto e a tirania ameaçou ao mundo, ela estava ali para testemunhar como uma geração respondeu com grandeza e a democracia foi salva. Podemos (Yes, we can).
Ela estava lá pelos ônibus de Montgomery, pelas mangueiras de irrigação em Birmingham, por uma ponte em Selma e por um pregador de Atlanta que disse a um povo: "Superaremos". Podemos (Yes, we can!).
O homem chegou à lua, um muro caiu em Berlim e um mundo se interligou através de nossa ciência e imaginação. E este ano, nestas eleições, ela tocou uma tela com o dedo e votou, porque após 106 anos nos EUA, durante os melhores e piores tempos, ela sabe como os EUA podem mudar. Podemos (Yes, we can!).
EUA avançamos muito. Vimos muito. Mas há muito mais por fazer.
Portanto, esta noite vamos nos perguntar se nossos filhos viverão para ver o próximo século, se minhas filhas terão tanta sorte para viver tanto tempo quanto Ann Nixon Cooper, que mudança virá? Que progresso faremos?
Esta é nossa oportunidade de responder a esta chamada. Este é o nosso momento. Esta é nossa vez.
Para dar emprego a nosso povo e abrir as portas da oportunidade para nossas crianças, para restaurar a prosperidade e fomentar a causa da paz, para recuperar o sonho americano e reafirmar esta verdade fundamental, que, de muitos, somos um, que enquanto respirarmos, temos esperança.
E quando nos encontrarmos com o ceticismo e as dúvidas, e com aqueles que nos dizem que não podemos, responderemos com esta crença eterna que resume o espírito de um povo: Podemos (Yes, we can).
Obrigado. Que Deus os abençoe. E que Deus abençoe os EUA da América".

Monday, November 3, 2008

UMA ESTÓRIA DE CEGOS, SURDOS E MUDOS

“ A coisa mais fraca de todas as coisas fracas é uma virtude que não tenha sido ainda testada no fogo.”
Mark Twain
Sempre acreditei que sendo o Mercado cego, surdo e mudo aos problemas que os seus próprios processos geram, competia ao Estado estar de olho vivo, ouvidos abertos e de megafone na mão, para evitar o caos social que pudesse advir do autismo do Mercado, rei e senhor. Mas em boa verdade, o senhor Mercado só é insensível aos problemas dos outros. Agora é vê-lo, perante o precipício que se abriu à sua frente, e atento aos clamores dos seus pares, gritando a plenos pulmões por ajuda. De quem? Do Estado. O senhor Estado, aquele mesmo senhor que, fanático pelas virtualidades da economia de mercado, fez orelhas moucas às tropelias do mercado e às súplicas das suas vítimas. Afinal, esta é uma estória de cegos, surdos, mudos e paralíticos que afinal vêem, escutam, berram e se movimentam… quando lhes convém. O mercado, arrogante e auto-suficiente, acreditando que pode tudo, e que agora se prova ter sido inconsequente; e o Estado, crédulo e irresponsável, que abdicou de grande parte da sua autoridade em favor do Mercado. Resultado: uma grande salgalhada. E para salvar o Mercado, o Estado lança agora mão de soluções que abomina e que vem condenando há décadas. Mas o mais chocante é saber que quem vai pagar a factura é o Zé-povinho – o único que nunca viu a cor do dinheiro volatilizado.

Eu até compreendo o comportamento do mercado. É típico: qualquer besta, deixada com as rédeas soltas, toma o freio nos dentes e sai correndo desembestado. Até à exaustão… se antes não lhe aparecer um precipício pela frente. E a culpa não é, obviamente, da besta, mas daquele a quem competia manter as rédeas firmes e regular o freio. No caso, o senhor Estado.
A propalada, e unanimemente apoiada, saída do Estado da economia, tinha a ver com o papel de operador que vinha desempenhando (de forma insatisfatória, diga-se em abono da verdade) e com algumas soluções administrativas que impunha à economia (contra-natura, portanto). O dever e a obrigação de garantir que o mercado não se transformaria numa selva, onde imperaria a lei do mais forte, mantinham-se intactos. Diria mesmo que, em consideração aos mais fracos, a vigilância devia ser tomada muito a sério. E não foi. Falhou muita coisa na passagem do Estado operador e interventor ao Estado Regulador. Não me atrevo a escalpelizar a passagem ao nível global, mas, à luz da curta experiência cabo-verdiana, sempre podem ser tiradas algumas ilações.
Uma autoridade reguladora, para ser ágil, eficaz e efectiva, precisa escorar-se em, pelo menos, três bases: um quadro normativo moderno e claro; um quadro de competências amplas e inequívocas, capazes de outorgarem aos reguladores os necessários poder e autoridade; um corpo de reguladores capazes de se assumirem como verdadeiros magistrados (no sentido mais nobre do termo). Um investimento em benchmarking, mormente para quem esteja ensaiando os primeiros passos, pode também ser decisivo.
Mas as bases têm de funcionar cumulativamente. De nada serve, por exemplo, ter-se um quadro normativo claro e um quadro de competências amplas (amovibilidade garantida e tudo) se o regulador se revelar canhestro, tímido, burocrata ou simplesmente cobarde. Daria cabo de tudo. Por outro lado, também de nada serviria recrutar uns nec plus ultra para a regulação, se o quadro de competências for restrito e castrador. Pode acontecer ainda, depois de uma boa experiência de benchmarking, o regulador se meter a reproduzir, acriticamente, o que viu ser feito lá fora, com consequências imprevistas. E põe-se ainda a questão do modelo da regulação em si: VITAL MOREIRA manifestou, há coisa de três meses, numa Conferência na Cidade da Praia, algumas reservas em relação à regulação do sector financeiro pelo Banco Central. O B.C. não deixa de ser um banco, uma instituição financeira, o que poderia dar azo a algum corporativismo.
E há indícios preocupantes: (i) não escapa aos mais avisados que há por aqui um banco comercial que é «mais igual» que os outros e que dita regras para os demais; (ii) apesar de se ter feito um escarcéu dos diabos, durante muito tempo as agências de viagens seguiram ditando a taxa de conversão do dólar a aplicar no cálculo dos preços dos bilhetes (o dólar rolava ladeira abaixo, mas nas agências a cotação do dólar mantinha-se colada à do Euro); (iii) pessoalmente, denunciei um modelo de declaração que um banco da praça dá aos clientes (e aos seus avalistas e fiadores) a assinar que é um verdadeiro atentado à liberdade dos visados, mas a autoridade reguladora não tugiu nem mugiu; (iv) meio mundo reclamou já da famigerada taxa de expediente (400$00, mínimo) que se debita para cobrar um juro de 7$00, mas o regulador continua quedo e mudo; questiona-se que, com o nível das tecnologias de informação e comunicação de hoje e da plataforma (a mesma) onde os bancos comerciais se movimentam, só se possa movimentar uma conta a débito 24 horas depois, em caso de depósito em numerário, e 48 horas depois, no que ao cheque diz respeito (a compensação garante a boa cobrança já no final do dia), mas o regulador permanece cego. Escutam-se queixas de que as seguradoras aproveitam (quando não inventam) mil pretextos para pagarem menores prémios (ou não pagarem) e a autoridade reguladora mantém um silêncio confrangedor; a lei diz que as seguradoras têm direito de regresso em relação aos prémios que pagam quando o condutor que provocar o acidente age com dolo; e vão as seguradoras de dar o significado que lhes convém ao conceito de «dolo», exigindo pagamentos indevidos (esquecendo ou fingindo não saber que o Código Penal define quando é que se considera haver «dolo»), e o regulador… cego, surdo e mudo. Enfim, um mundo de «pequenas coisas» que clamam pela intervenção da autoridade reguladora do sector e que ficam em águas de bacalhau. Alguém acredita que não haverá também «grandes coisas» sendo objecto do mesmo laissez faire, laissez passer? Até que um dia a casa venha abaixo. E será então chegado o momento de fazer as vítimas pagarem pelos seus algozes. Como vem acontecendo por esse mundo afora, nesta crise provocada.
A Regulação, sendo uma questão séria, como tal deveria ser tratada. E, verdade seja dita, se tomarmos o caso cabo-verdiano como paradigma, o cenário é desolador. E se a presente crise servir para fazer as coisas entrarem nos carris (chez nous et partout), então terá valido a pena. Apesar dos pesares.

Tuesday, October 28, 2008

OBAMA: O FENÓMENO

BARACK OBAMA PODE OU NÃO VIR A SER ELEITO PRESIDENTE DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. O FACTO CENTRAL É QUE ESTE AMERICANO, ESTE CIDADÃO DO MUNDO, ENTROU PARA A HISTÓRIA UNIVERSAL. AINDA EM CAMPANHA, ULTRAPASSOU JÁ, EM POPULARIDADE, ATÉ O MALOGRADO JOHN KENNEDY.
BARACK OBAMA É UM FENÓMENO GLOBAL. FALA-SE DELE EM TODAS AS LÍNGUAS, EM TODOS OS PAÍSES. AQUI EM CABO VERDE TORNOU-SE USUAL VER-SE GENTE DE TODAS AS RAÇAS, DE CULTURAS DIFERENCIADAS, ORIUNDAS DE VÁRIOS PONTOS DO GLOBO, FALANDO DE OBAMA.
A EVENTUAL ELEIÇÃO DE OBAMA SERIA APENAS A CONSAGRAÇÃO DE UM POLÍTICO VERSÁTIL, UM COMUNICADOR EXÍMIO, UM VERDADEIRO SEDUTOR, NO SENTIDO MAIS AMPLO DO TERMO. E SERIA, TAMBÉM, UM SINAL DE QUE OS AMERICANOS RECONHECEM E SE ORGULHAM DA GÉNESE DA SUA NAÇÃO . SERIA UM PASSO DE GIGANTE NO SENTIDO DA REALIZAÇÃO DO SONHO DE MARTIN LUTHER KING.
MAS BARACK OBAMA, SENDO OU NÃO ELEITO, É JÁ UM SÍMBOLO DO PODER DA EDUCAÇÃO E UM SINAL FORTE PARA A JUVENTUDE NÃO CAUCASIANA.

A ÁFRICA LUSÓFONA FICOU ÓRFÃ DEPOIS DE PERDER OS SEUS LÍDERES HISTÓRICOS (CABRAL, NETO, MONDLANE E MACHEL). E ISSO UM POUCO EM CONSEQUÊNCIA DE ALGUMA RETICÊNCIA EM RELAÇÃO A KALUNGANO E ALGUNS OUTROS, POR CAUSA DA MISTURA DE RAÇAS QUE CORPORIZAM. A CONSAGRAÇÃO DE OBAMA, NUM AMBIENTE COMO O DOS ESTADOS UNIDOS, PODE CHAMAR TODA A ÁFRICA À RAZÃO, MORMENTE OS PAÍSES LUSÓFONOS, CUJA MAIOR RIQUEZA RESIDE NA MISTURA DE RAÇAS E NO ENCONTRO DE CULTURAS.
A CONSAGRAÇÃO DA EDUCAÇÃO COMO A CHAVE QUE ABRE TODAS AS PORTAS (MESMO AS DA CASA BRANCA) SERIA A MAIOR LIÇÃO A TIRAR DA TRAJECTÓRIA DE OBAMA, SENDO OU NÃO ELEITO.

NÃO ACREDITO QUE MUDE MUITA COISA NA POLÍTICA DOS ESTADOS UNIDOS. PODERÁ SER UMA VITÓRIA DE BARACK OBAMA, MAS SERÁ UMA ADMINISTRAÇÃO DEMOCRATA. QUER ISSO DIZER QUE QUEM GOVERNARÁ, DE FACTO, SERÁ MENOS OBAMA E MAIS A OLIGARQUIA INSTALADA À VOLTA DO PARTIDO DEMOCRATA. POR MAIS PEQUENAS DOAÇÕES (DOAÇÕES DE CORAÇÃO) QUE A CANDIDATURA DE OBAMA TENHA RECEBIDO, O EFECTIVO FINANCIAMENTO DA CAMPANHA FOI FEITO PELOS PODEROSOS CAPITALISTAS. E ESTES, NÃO DÃO: OU EMPRESTAM OU INVESTEM. E ESTÁ PROVADO QUE AS DITAS DOAÇÕES PARA AS CAMPANHAS SÃO, NA VERDADE, INVESTIMENTOS DE CURTO PRAZO. AS FACTURAS COMEÇAM A SER APRESENTADAS NO DIA SEGUINTE À POSSE. E NÃO VEJO COMO OBAMA PODERÁ ESCAPAR À COBRANÇA.
POR AQUI JÁ CORREM NOTAS, PROVENIENTES DE CABO-VERDIANOS RESIDENTES NOS ESTADOS UNIDOS, DANDO CONTA DO QUASE CERTO AUMENTO DE IMPOSTOS PELA ADMINISTRAÇÃO DEMOCRATA. JÁ CORRE ALGUM DIZ-QUE-DIZ SOBRE ALGUMA PROPENSÃO DE OBAMA EM COLMATAR AS BRECHAS DO SEU DISCURSO COM INVERDADES. ESTÁ SENDO REPETIDO POR TODO O LADO AQUELA ESTÓRIA DO JORNALISTA QUE FICOU EXTASIADO COM UMA ENTREVISTA QUE FEZ A OBAMA, MAS NO TEXTO DA QUAL A MULHER DESCOBRIU UM SEM-FIM DE CONTRADIÇÕES. ENFIM, BARACK OBAMA É UM HOMEM COM UMA FORTE VOCAÇÃO SOCIAL, UM DISCURSO FORTE E SEDUTOR, MAS QUE NÃO TEM COMO SOBREPOR-SE AOS FINANCIADORES, ÀS LIDERANÇAS DO SEU PARTIDO E À PRÓPRIA POLÍTICA EXTERNA DOS USA (QUE FUNCIONA NO SENTIDO INDICADO PELOS INTERESSES DO CAPITALISMO INTERNACIONAL). ACREDITO, CONTUDO, QUE, NA PEQUENA MARGEM DE MANOBRA QUE PUDER CONQUISTAR, PODERÁ DAR UM TOQUE PESSOAL À POLÍTICA EXTERNA DOS ESTADOS UNIDOS, AO MENOS NO QUE À ÁFRICA DIGA RESPEITO. NÃO TENHO A CERTEZA É SE AS EVENTUAIS MUDANÇAS ALCANÇARÃO A DIMENSÃO NECESSÁRIA.

ASSISTE-SE NOS ESTADOS UNIDOS, EM CABO VERDE E UM POR POUCO POR TODO O LADO, A UMA CONFLUÊNCIA DOS ADEPTOS DA MUDANÇA EM TORNO DAS PROPOSTAS DE OBAMA. A LEGIÃO DAS PESSOAS QUE CRÊEM QUE O MUNDO E A POLÍTICA PRECISAM PASSAR UM PROCESSO DE MUDANÇA QUE ABRACE VALORES HUMANISTAS ESTÃO ENTUSIASMADOS COM A FORTE PROBABILIDADE DE OBAMA VIR A OCUPAR O SALÃO OVAL DA CASA BRANCA. ACREDITAM PIAMENTE QUE SERÁ POSSÍVEL ULTRAPASSAR OS PONTOS FRACOS DO PARTIDO DEMOCRATA, CONTORNAR A PRESSÃO DOS «DOADORES» DE CAMPANHA E CONSEGUIR QUE AS COISAS MUDEM NOS USA, MORMENTE A POLÍTICA EXTERNA DE DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS.
MAS, A PAR DESTES, EXISTEM AQUELES QUE MANTÊM UMA FÉ INABALÁVEL NO PARTIDO REPUBLICANO (E NÃO SÃO POUCOS); HÁ AQUELES QUE, EMBORA ADMIREM OBAMA, DESCONFIAM DO PARTIDO DEMOCRATA (A EXPECTATIVA DO AUMENTO DOS IMPOSTOS PESA E MUITO); HÁ-OS QUE DUVIDAM DOS POLÍTICOS, SEJA DE QUE QUADRANTE POLÍTICO FOREM (POLÍTICO BOM É NA OPOSIÇÃO); HÁ QUEM TENHA FORTE RESISTÊNCIA AOS BONS COMUNICADORES COMO OBAMA (QUE CONSIDERAM VENDEDORES DE BANHA DE COBRA).
ENFIM, HÁ MUITA EUFORIA E ALGUM CEPTICISMO SE DIGLADIANDO À VOLTA DAS AMBIÇÕES DE BARACK OBAMA. EM MEU ENTENDER, E PELO QUE ME TEM SIDO DADO LER E OUVIR, O PESO DOS EUFÓRICOS PODE MUITO BEM SOBREPOR-SE AO DOS OBAMA-CÉPTICOS. MAS UMA COISA SÃO AS INTENÇÕES DE VOTO E A POPULARIDADE DE UM CANDIDATO; COISA DIFERENTE É A INTRODUÇÃO DO VOTO NA URNA. E É ISSO QUE CONTA.
BARACK OBAMA PRESIDENTE? FINE! MAS, ELEITO OU NÃO, VEREMOS NELE, SEMPRE, UM EXEMPLO DO PODER DA EDUCAÇÃO E DO EXERCÍCIO MILITANTE DA CIDADANIA.

Monday, October 20, 2008

REVOLUÇÃO, REFORMA OU… REENGENHARIA?

“Sobrepor uma nova organização a um processo antigo equivale a introduzir vinho azedo em novas garrafas.”

Michael Hammer e James Champy

Revolução é botar pra quebrar. É destruir para reconstruir a partir dos escombros. É romper definitivamente com o passado e começar tudo de novo, rumando em sentido oposto ao sistema de coisas vigente. É deitar fora o bebé com a água do banho. Aonde se vai parar? Resultados? SEMPRE muito aleatórios.
Reforma é a procura do novo ou de uma nova forma de ser, de estar, ou de se organizar, com valorização do que existe. Parte-se sempre de um bom conhecimento do que existe e de uma visão clara do que se quer, e consensualiza-se o caminho a trilhar para se atingir o desiderato. Há um ponto de partida, um ponto de chegada e um percurso, mais ou menos consensuais ou consensualizados.
Fazer Reengenharia significa abandonar velhos sistemas e começar de novo. Envolve o retorno ao princípio e a invenção de uma forma melhor de se trabalhar. As mudanças que se procuram são revolucionárias, mas a via não é a mera melhoria dos velhos processos, mas a sua substituição por processos inteiramente novos. A Reengenharia responde a esta questão que se nos põe amiúde: «Se se tivesse que recriar, hoje, a administração fiscal, dados os conhecimentos e a tecnologia actuais, qual seria o seu aspecto?»
Da perspectiva do projecto da nova orgânica do MF, parece que a Administração Fiscal (AF) nacional vive uma situação a que só a Revolução nela delineada pode dar algum jeito; da perspectiva da Unidade de Coordenação da Reforma do Estado (UCRE), pelo menos programaticamente, há uma situação que pode ser objecto de uma Reforma; numa perspectiva desassombrada, a situação da AF, pelos seus contornos, parece antes clamar por uma Reengenharia.
É que os problemas que a nossa Administração Fiscal (AF) e a nossa Administração Pública (AP) enfrentam, resultam menos da sua estrutura organizacional, do que da estrutura de seus processos. E têm razão Michael Hammer e James Champy quando dizem que sobrepor uma nova organização a um processo antigo equivale a introduzir vinho azedo em novas garrafas. Muda o continente, mas o conteúdo continua… azedo. Para desespero dos artífices de uma tal “reforma” e dos operacionais do sector.
Não sendo homem de ficar em cima do muro, contudo, neste particular - e estando numa posição que não está em sintonia com nenhuma das partes do “conflito” - prefiro manter-me equidistante das posições extremadas que vêm sendo traduzidas pelo «NINGUÉM GOSTOU» dos agentes do fisco e pelo «TODOS GOSTAM» do Governo (ou, pelo menos, da UCRE e da cúpula do MF). É que são afirmações extremamente perigosas, que não acautelam a particularidade de que cada pessoa tem uma maneira de perceber o que acontece à sua volta, mercê da educação, do ambiente e das experiências vivenciadas. E essa diferença de percepção é bem maior em termos organizacionais. As pessoas que pilotam o projecto percebem, vêm e sentem a mudança como coisa inatacável, porque estão ao leme, sabem o que se passa e contam com um resultado óptimo; a mesma mudança será percebida, vista e sentida de forma diversa por um operacional do sector objecto da intervenção. E é normal: aquele que operacionaliza o projecto tem uma relação com a mudança muito diferente de quem a projectou. Mormente quando aquele não foi envolvido por este na preparação da mudança.
Mas eu tenho ainda outras razões para não alinhar com nenhum dos lados. Isso porque o que está por detrás das posições extremadas não resulta apenas de percepções antagónicas: de um lado, há uma indisfarçável visão X (v.g. Douglas McGregor) em relação ao homem organizacional presente em, pelo menos, um dos sectores da AF, a qual acaba empurrando para uma reestruturação orgânica, sob o pretexto de adequação ao Modelo de Negócios do MF; do outro, uma, também pouco ou nada indisfarçável, preocupação com a manutenção do status quo, por razões não tão altruístas como se pretende fazer crer.
No rescaldo da XXIII CONFERÊNCIA DE DIRECTORES-GERAIS DAS ALFÂNDEGAS DA CPLP ousaria sugerir, para fim de papo, a adopção de uma solução à portuguesa - DGA + DGI, sob a coordenação de um Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (no nosso caso, um Director Nacional da Administração Fiscal, poderia dar satisfação aos reformadores); ou uma saída à moçambicana – uma Autoridade Tributária Nacional superintendendo a DGA, a DGI e uma Direcção-Geral dos Assuntos Comuns (com uma unidade de Assuntos Internos, como no país amigo do Indico).
E, claro, que não se adie o que faz VERDADEIRAMENTE falta: uma Reengenharia dos Processos da Administração Fiscal, essa sim capaz de proporcionar um salto quântico de desempenho, com melhorias de 100%, ou mesmo 1000%, como resultado de uma aposta em processos e estruturas de trabalho inteiramente novos.

Wednesday, October 1, 2008

MARRONZINHOS

No princípio da década de 90 do século passado, a cidade de São Paulo vivia o que se poderia caracterizar como o caos no trânsito. Não tinha tanto a ver com a ciculação, mas, e principalmente, com a questão do estacionamento. Todo mundo estacionava onde lhe dava na veneta. Corriam o risco de apanhar uma pesada coima por estacionamento irregular? Corriam, claro. Mas qual o grau de probabilidade de um condutor, em 11 milhões, ser "caçado" em infracção ao Código de Estrada?
Os condutores apostavam nesse endiabrado jogo de probabilidades e acabavam quase sempre ganhando.
Segundo JC, e seus seguidores, não sendo possível ter um agente em cada esquina... é ajoelhar e encomendar o futuro a Deus.
Deus já dissera (e acredito que JC, neste particular, comungue com o pai) PONHA A MÃO QUE EU TE AJUDAREI. Mas por aqui, os discípulos de JC, com LL à cabeça, entendem que DEUS TÂ RESOLVÊ, e ficam-se na deles, esquecendo-se que o outro JC (que é Deus com o Pai, na unidade do Espírito Santo) ensinara já, há dois mil anos atrás, que «NÃO TENTARÁS O SENHOR TEU DEUS».
Assim como assim, as autoridades paulistanas lançaram mão da sua criatividade e inventaram os MARRONZINHOS.
Os MARRONZINHOS vêm a ser um grupo de jovens recrutados e treinados pela Secretaria de Engenharia do Trânsito da Prefeitura Municipal de São Paulo para auxiliarem a polícia no controlo do trânsito em São Paulo (Capital), maximé dos estacionamentos. Treinaram-nos, vestiram-nos de calções e jaleco em marron e camisetas em amarelo torrado e lançaram-nos nas ruas de uma das maiores metrópoles do Mundo.
Deu logo certo? Certamente que não. Foi difícil para os condutores entenderem que deviam respeito a esses jovens; foi complicado para os policiais militares aceitarem a ajuda desses «meninos»; a opinião pública dividiu-se diante da nova realidade surgida com os MARRONZINHOS (que é como ficaram a ser conhecidos, em razão do modelito em marron que envergavam). Mas, volvidos pouco mais do que década e meia sobre a "aterragem" dos marronzinhos em São Paulo, se a situação do trânsito (e dos estacionamentos) não é aí nenhuma BRASTEMP, ela está, sem dúvida, de longe, muito melhor do que antes. Pode-se falar, com propriedade, de um ANTES e de um DEPOIS dos MARRONZINHOS. Eles contam! Eles interferiram com a balbúrdia! Hoje a polícia de São Paulo não se imagina a controlar a cidade sem eles, os marronzinhos.
Em Sampa, o pessoal teve imaginação, ousou e fez acontecer.
Por aqui, o que nos faz falta é imaginação (e alguma inteligência, claro). E começar a acreditar em Deus: ponham as mãos que ELE nos ajudará. Que essa de esperar que as coisas se resolvam de per si, ou que Liedson resolva, acabou. C'est fini! Kaput!

Friday, September 26, 2008

O CARTEL DOS HIDROCARBONETOS

ISTO NÃO VAI NADA BEM! EU NÃO ESTOU NADA BEM!
Agora deu-me para ficar p. da vida quando escuto que o preço do crude baixou consideravelmente. É que é quase certo que aí vem chumbo grosso da nossa ARE, que é como quem diz: os preços de venda ao público (PVP) dos combustíveis vão subir.
Fico fulo porque, antes de mais, fica-me difícil explicar à minha netinha (que já se preocupa com essas coisas - já sabe que não pode deixar os aparelhos ligados, nem esquecer as luzes do quarto acesas) que o PVP dos combustíveis, EM CABO VERDE, é INVERSAMENTE proporcional à cotação internacional do barril de petróleo: quanto mais baixa a cotação do crude, mais alto o PVP dos refinados em CV.
Vou aos arames também porque ninguém consegue tranquilizar-me acerca das terríveis suspeitas sobre a forma como se formam os preços na ARE das petrolíferas e da ELECTRA: que a factura da aquisição não esteja visada pela Alfândega por onde se deu a importação; que o comprovativo dos valores pagos na Alfândega não seja a cópia-recibo da Tesouraria da casa fiscal, nem a factura do Despachante Oficial (conquanto não tenha a mesma força probatória se apresentada isoladamente).
Perco as estribeiras quando a ARE, em vez de fixar PREÇOS MÁXIMOS, apresenta preços obrigatórios. Onde diabo estamos nós? A ARE deu agora para patrocinar a formação de CARTEL? As duas petrolíferas compram os combustíveis ao mesmo preço, na mesma ocasião, os lotes chegam na mesma altura, têm as mesmas despesas, etc.? Como é que diante de uma importação de uma das petrolíferas, se obtêm dados para fixar preços de venda ao público válidos para ambas?
Ainda que as minhas piores suspeitas sejam infundadas, ainda assim fica muita coisa por explicar. Isso porque as coisas, POR AQUI, não têm como ser muito diferentes de outras latitudes. Outras latitudes onde o valor da aquisição dos refinados é comprovado pela mesma factura apresentada à Alfândega; os montantes pagos nas Alfândegas são comprovados pela cópia-recibo da Tesouraria da estância aduaneira de importação e pela factura do Despachante Oficial (dando conta dos honorários e outras despesas envolvidas); o preço fixado pela autoridade (sendo o caso) é um preço máximo, ficando os postos de distribuição livres para praticarem os preços que bem entenderem, ABAIXO do preço máximo fixado; os preços são aprovados caso-a-caso, importador a importador, o que permite que aquele que COMPROU MELHOR possa vender a um PREÇO MAIS BAIXO, fomentando a CONCORRÊNCIA .
Aqui, não. A ARE mata a concorrência no ovo. Os benefícios que seguimos colhendo da instalação da concorrência no sector das telecomuncações, jamais os veremos (nem de binóculos) no sector dos petróleos, enquanto a ARE estiver funcionando como está funcionando. E isso é mau. Muito mau. Péssimo!
É preciso desfazer o cartel que, de certa forma, tem a bênção das autoridades. É preciso, COM URGÊNCIA, pôr de pé uma AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA. É preciso investigar, em processo de urgência, se a ARE entra de gaiato nessa estória ou se há... dolo. E, claro, agir depois em conformidade.
Posso estar errado nas minhas suspeitas. Mas de uma coisa tenho a certeza: ISTO NÃO VAI NADA BEM. E que vontade de parafrasear, novamente, Seu Jorge: PQP!

Thursday, September 25, 2008

Elbert Hubbard constatou que existe algo muito mais escasso, fino e raro do que o talento. Diz ele ser isso o talento para reconhecer os talentosos. Modéstia à parte, acho que tenho esse talento.
É que não me passam ao lado o talento de um Crisanto Barros, de um César Schofield, de um Jacinto Santos, de um Jorge Carlos Fonseca, de um Orlando Borja.
Esse meu dom poderá estar facilitado pela ausência de preconceitos. Não deixo de reconhecer o talento de um fulano por não gostar dele, por não concordar com ele, por ser meu adversário em uma qualquer pendenga. Então, quando o fulano é boa praça...
Mas, hoje e agora, quero mandar uma saudação especial ao homem que mantém o blogue BIANDA, de seu nome César Schofield. Não pelo blogue. Não pela sua arte. Não pela defesa coerentte que faz da Cultura. Não pelo seu profissionalismo. Não pelo seu universalismo. Não pela sua caboverdianidade. Não, agora. Podia ser por tudo isso e mais alguma coisa (admiro o desassombro das suas crónicas). Mas vai um grande abraço por ter mandado uns lúpmens para AQUELA PARTE.
Entrou na cabeça de muitos bípedes que podem controlar o pensamento das pessoas. Você reflecte, resolve registar no seu blogue e aí vem um fulano que há décadas não pensa em coisa nenhuma e resolve impor-te restrições, condicionar teu verbo, regular tua liberdade de expressão. Não sou de palavrões (TAMBÉM), mas ocorre plagiar aqui Seu Jorge (magnífico artista carioca) e dizer, alto e bom som: PUTA QUE PARIU, ISTO NÃO VAI NADA BEM!