Monday, July 6, 2009

PRAIA – CAPITAL DA CULTURA

“Há grandeza nesta ideia de que a vida, com os seus diversos poderes, surgiu originalmente em escassas formas ou numa forma apenas; e de um começo tão simples, enquanto o planeta girava segundo as leis fixas da gravidade, evoluíram, e continuam a evoluir, formas tão belas e tão maravilhosas.”
Charles Darwin
Essa de Capital da Cultura deve ser rotativo. Umas vezes são uns fulanos do Norte a reclamar tal estatuto para a sua principal urbe; outras vezes são uns intelectuais do Sul a fazer a pronunciação. Que a Constituição, essa, só identifica a Capital política da República: A CIDADE DA PRAIA DE SANTA MARIA DA VITORIA.
Coube a vez, no último Sábado (o da vitória do Sporting Club da Praia sobre a Associação Académica da Praia) - na cerimónia de homenagem da Associação PRÓ-PRAIA ao vate ARMÉNIO VIEIRA, laureado com o prémio Camões de Literatura - ao edil praiense ULISSES CORREIA E SILVA de proclamar a Cidade da Praia como a Capital Nacional da Cultura. Falou, disse e sustentou. Muito diferente do que faz muito boa gente, que, acreditando que uma meia-verdade repetida vezes sem conta se transforma numa verdade inquestionável, insiste na asserção, mas não arrola nada em defesa da sua tese. Ulisses falou da efervescência cultural que tem testemunhado desde que chegou à Presidência da Câmara Municipal da Praia; falou dos performers, fotógrafos, pintores, escultores, poetas e dançarinos que têm animado a vida cultural da cidade; falou do teatro e de manifestações culturais populares; e falou da produção literária e dos prémios ganhos por fazedores de cultura da Praia e na Praia. O Presidente da Câmara Municipal da Praia fechou o seu pequeno improviso com um apelo aos praienses no sentido de não deixarem cair a peteca, a modos de manter a Praia, e Santiago, na crista da onda produção e vivência culturais, fazendo com que a nossa cidade continue a merecer o destaque conquistado na cultura nacional e a bem da nossa auto-estima.
A adjectivação (PRAIA CAPITAL DA CULTURA) feita pelo edil Correia e Silva foi vivamente aclamada pelos presentes. Ao lado alguém reclamou para a Cidade da Praia também o estatuto de Capital do Desporto, alegando que o facto de ela ser a sede da equipa vencedora dos três últimos campeonatos nacionais (o SCP) e de ter, agora, duas de suas equipas disputando, entre si, o título de Campeão de Cabo Verde em futebol, justifica tal estatuto.
De facto, como a Cidade da Praia só o Reino Unido, país de três das quatro equipas que chegaram às meias-finais da última Champions League.
A mim parece-me que o edil praiense sabia do que falava. À frente dele estavam, para além do homenageado Arménio Vieira, o Magnífico Reitor da Universidade Jean Piaget, o poeta Filinto Elísio, o intelectual sénior Anastácio Filinto, o Pró-Reitor da UniCV Ângelo Barbosa, e uma plêiade de intelectuais praienses, ressaltando-se a presença do jovem representante da irreverência intelectual cabo-verdiana Abraão Vicente.
A mim ficou-me só esta singela dúvida: ESTAMOS Capital da Cultura, por um período, rotativo, pré-estabelecido; ou SOMOS Capital da Cultura, para valer?
O questionamento registado atrás não é nada despiciendo. Havendo outros candidatos ao título, importará não só a consagração do vencedor como, também, a notificação do vencido. Para que se prepare par o próximo round.
Mas as novidades do dia não ficaram apenas por conta da vitória do Sporting sobre a Académica e da homenagem, mais que merecida, da PRÓ-PRAIA a Arménio Vieira. Eu LI, para os presentes, um poema (PARÁBOLA) de Arménio. Digo LER, porque não me atrevo a dizer que declamei, conhecendo os declamadores que conheço: Jorge Nuno PINTO DA COSTA (esse mesmo, o Presidente do FCP); o Danny Spínola; o senhor Filinto (o sénior). Aliás, dá para imaginar um prosador bárbaro, como eu, declamando um poema do doce vate Arménio Vieira?
E foi belo e magnífico ouvir o próprio homenageado, intervindo em meu socorro, declamar um poema seu, que lhe sugeri – DIDÁCTICA INCONSEGUIDA.

Tu nunca viste um homem
Subitamente triste
Ao descobrir um tesouro ou o paraíso
Ou alguém com dor no peito
E um gume encostado ao coração
Cuspindo riso pela boca
- Entretanto, ensino-te os caminhos
que não passam pela porta de ninguém
E dizes que sou louco.
Diante deste momento tão bom para a cultura cabo-verdiana (Cesária, Mayra e Tcheka, os prémios do poeta José Luís Tavares, o Prémio Sonangol de Literatura, este gostoso e suculento Prémio Camões, a inscrição da Cidade Velha como Património da Humanidade – sítio cultural de valor universal excepcional) não há como não lançar a questão: para quando o Nobel da Literatura?
Poderá não acontecer durante a nossa (minha e vossa) breve passagem por este vale de lágrimas, mas acredito que chegará o dia. Tomando o gosto pela coisa, alcançar o Nobel passa a ser uma mera questão de tempo. Que o cabo-verdiano é fogo. Em entrando, segue buscando o caminho para o centro da questão. Aliás, Corsino Fortes, num dos seus emblemáticos poemas, alertou já São Pedro (o caseiro do Céu) para a eventualidade de este vir a ter que enfrentar um golpe de estado no Paraíso, caso os cabo-verdianos escolham esse recanto bíblico como sua última morada.
Para que tudo fique em festa, cá registo um desafio: a Praia conserva-se Capital da Cultura até que alguém, de outra cidade, traga um novo Prémio Camões. Combinado? E o fim da rotatividade acontecerá quando trouxermos o Nobel para Cabo Verde. A Capital da Cultura em Cabo Verde passaria a ser, definitivamente, a cidade que albergar o ganhador do Nobel two thousand e não sei quantas.
José Luís Tavares ou ‘Nzé di Santiagu (um filho ou neto deles) podem levá-lo para Assomada? Corsino Fortes ou Germano Almeida (ou um neto deles) levá-lo-ão para Mindelo? Arménio Vieira ou a nova geração de escritores da Praia (ou seus descendentes) vão trazê-lo para a Praia? Só o tempo o dirá. Aos pelouros da Cultura das Autarquias locais e às organizações da sociedade civil das nossas cidades de investirem forte no negócio da cultura, maximé, na Literatura.
E aí, Ulisses, vai encarar? Vai fazer com que a Praia se mantenha como a CAPITAL DA CULTURA até ao NOBEL cabo-verdiano? A PRÓ-PRAIA alinha, Filinto? Alors, on y va!