Wednesday, June 25, 2008

VOTO DE QUALIDADE E… VETO

“Sou um simples africano que quis viver sua época e saldar sua dívida para com o seu povo.”

Amílcar L. Cabral

Vem-me sempre à memória esta famosa tirada de Cabral a propósito das desesperadas tentativas de Salazar e seus esbirros (o mais temido de entre eles tinha, por puro acaso, raízes fincadas no Mindelo) de apresentar Cabral, a Portugal, ao Mundo e às suas próprias gentes, como terrorista. Debalde. Cabral é hoje herói do seu povo e objecto de grandes manifestações de carinho e de reconhecimento um pouco por todo o mundo.
E vem-me igualmente à memória, sempre que resolvem colar-me o rótulo de inimigo de Sanvicente, esta outra pérola de Cabral, a propósito da luta que mantinha contra o colonialismo e o fascismo português (luta na qual tinha, aliás, fortes aliados portugueses): «O nosso inimigo não é o povo português. O nosso inimigo é, e sempre foi, o colonialismo português.»
Não tenham os meus inimigos pressa em afirmar que estou pretendendo colocar-me ao nível desse monstro sagrado da nossa história que é Amílcar Cabral. Falo dele com o orgulho que um africano deve ter de outro que viveu a sua época e nos legou muitos exemplos de vida.
A questão é que essa tentativa de me fazerem inimigo nº 1 de Sanvicente é falsa e esconde a verdadeira razão dos ataques que me são feitos. Eu não escondo, nunca escondi, que tenho aversão de morte a bastardinhos que se armam em quatrocentãos de sete costados (seja aqui, seja em São Paulo, ou n’importe où) e a colaboracionistas (e filhotes de colaboracionistas) que se escondem sob a roupagem de nacionalistas de gema (seja em Sanvicente, seja na Praia, na França das Grandes Guerras do sec. XX, ou n’importe où). Isso, na mesma medida do enorme apreço que nutro por aqueles que trabalham, que comem do suor do próprio rosto, que amargam, com toda a dignidade, para dar aos filhos a oportunidade de serem alguém na vida, sejam eles os homens que ganham a vida no mar em Sanvicente, os agricultores e industriais das Ribeiras de Santo Antão, os camponeses das Fajãs de São Nicolau, os self-made men das Achadas de Santiago, os resistentes das encostas do Fogo, os «sitiados» da Ilha Brava, ou os pioneiros, da nova vaga do desenvolvimento, das ilhas rasas (Sal, Boavista e Maio). Resumindo e concluindo, abomino os chico-espertos e aqueles que acham que o trabalho DANIFICA o homem e abraço com emoção aqueles (felizmente a maioria) que aprenderam com os antepassados que o trabalho DIGNIFICA o homem. Estejam eles em Cabo Verde ou na diáspora.
E porque cargas de água estaria engasgado com Sanvicente, uma ilha onde tenho bons amigos e onde sempre passo sábi sempre que por lá passo? Porque teria qualquer reserva em relação à uma ilha tão simpática? Sanvicente jamais será uma espinha atravessada na minha garganta. Das únicas vezes que penso em Sanvicente e fico com a garganta apertada (de emoção) é quando me lembro dos tempos em que, por lá, eram as coitadas das mulheres que faziam o trabalho pesado (karga na kais lêvan nhâ vida, canta o poeta pela voz do grande Bana), carregando sacos, caixas e baús, enquanto os marmanjos dormiam, faziam de cicerone aos turistas, aos marujos e aos tripulantes (que o turismo sexual não é de hoje) ou enganavam incautos num jogo de «purrinha» à esquina. A lembrança do Sanvicente daquêl tempo, essa sim, me aperta garganta. De emoção e tristeza.
Mas, curiosamente, os meus desafectos choram é por esse tempo que, FELIZMENTE, já não volta mais. Môndrôngo já bái, amedjer já libertá, independéncia já tchegá, Cabo Verde já tmá freio ná dente, AQUI D’EL REI! Mas, caramba, isso são razões para festejo. E, coitado de mim, que sempre pensei que era isso que festejávamos a cada 05 de Julho. 05 de Julho, nosso orgulho, como cantou o poeta. Mas parece que não é assim para todo o mundo. Não é assim, pelo menos, para aqueles que perderam privilégios. Mas, que diacho, que se descabelem esses, mas nosotros cantaremos, dançaremos e continuaremos prestando homenagem às mulheres e homens que participaram da gesta heróica que tornou isso possível.
Mas o melhor mesmo é que essa gente (falsos quatrocentãos, colaboracionistas e filhotes) ponha as barbas de molho. Que vêm aí tempos bem mais difíceis para eles.
Os marítimos de Sanvicente, os agricultores e industriais de Santo Antão, os camponeses de São Nicolau e os pioneiros da nova vaga desenvolvimentista do Sal e da Boavista, já não se revêem nesse estafado conceito de barlavento. Este é hoje um conceito que tem a ver apenas com os ventos dominantes e informação que só interessa aos navegantes. Pela pena de Antero Coelho aparecem agora a pretender direito a «voto de qualidade» (será de coeficiente 2.0?) como forma de anular a «superpopulação» de Santiago. Não faltava mais nada. Imagine-se só: «voto de qualidade» dependendo da direcção dos ventos dominantes.
E que dizer da novíssima estratégia de se fazer de Mindelo a capital do Noroeste. Santantonenses e sanicolaoenses, os amigos foram tidos e achados? Alguém quis saber o que vocês pensam disso? A resposta é, certamente, um redondo NÃO. É uma saída ditada pelo chico-espertismo de uma pequena elite sedeada em Mindelo, que quer, porque quer, ser capital e estar no centro de alguma coisa. Santo Antão e São Nicolau são arrastados sem que possam dizer de sua justiça. Mas não se amofinem: nem a classe trabalhadora que moureja em Sanvicente terá sido tida ou achada. É mais uma fuga em frente dos privilegiados de antanho.
Isso para não falar da famigerada tentativa de apartheid ou «desenvolvimento separado», falhada porque publicitada antes de tempo pelo deputado nacional António Jorge Delgado): SANTIAGO de um lado e as demais ilhas de outro.
É contra essa gente, é contra esses artífices, que me posiciono. Eles, sim, têm algo atravessado na garganta. Inicialmente pensava que era Santiago que lhes impedia de engolir normalmente. Mas não se trata de Santiago, mas o que ela (a ilha e suas gentes) representa e que, no fundo, constitui o espírito do novo Cabo Verde: NINGUÉM PRECISA (mais) DE TUTORES. E o jeito é os tutores profissionais (quatrocentãos fajutos, colaboracionistas e respectivos filhotes) procurarem outros afazeres. Aqui ou na diáspora.
Delgado (e o grupo de que foi porta-voz) não encontrou eco na pretensão de isolar Santiago; Toy Neves não conseguiu convencer ninguém de que eu seria um perigoso terrorista e incendiário; Antero Coelho, igual a si próprio, não terá convencido ninguém a segui-lo na luta pela adopção do «voto de qualidade» para determinados círculos eleitorais, nem, tampouco, que as pessoas que, na Praia, rezam pela própria cartilha vivam em jaulas, açaimadas, para evitar que ponham o dedo em feridas abertas. Foi um acto falho, bastante revelador do que lhe vai na alma, do desejo que lhe corrói a garganta e lhe aperta a voz: ver os seus «desafectos» enjaulados. Tivesse ele poderes! Mas não tem e não vai ter tão cedo. Que aqui em Santiago, queira-se ou não, temos, na prática, o poder de VETO. E não se tenham dúvidas de que poderá ser usado, em «caso de necessidade».
E já agora Coelho, como é que se designa o buraco onde se escondem os chico-espertos, quatrocentãos de araque e filhotes de colaboracionistas? O Google não me pôde ajudar. Tentei a busca por «jaula», mas afiançaram-me que seria um receptáculo demasiado nobre para tais espécimes. Vou experimentar por «covil». Se não for… logo se verá.

Friday, June 13, 2008

CHEEEEEGA!!!

“A política é quase tão excitante como a guerra e não menos perigosa. Na guerra a pessoa só pode ser morta uma vez, mas na política diversas vezes.”

Winston Churchill



CHEGA!
Chega de festejos. Chega de chorar sobre o leite derramado. Chega de massagens ao ego. Chega de auto-comiseração. Chega de farrompas. Chega de buscar cabelo em ovo.
Aos vencedores sugiro, ao jeito do tutor de Alexandre Magno, que vejam a sua sombra e que reparem que ela (a sombra) não é MAIOR do que era dantes. Aos vencidos faço sugestão parecida: que constatem que a sua sombra não é MENOR do que era dantes.
Acabou a ladainha de grupos vencedores e grupos vencidos. É chegada a hora de grupos que competem. E grupos que competem tendem a comportar-se de modo bem diverso: (i) são, geralmente, coesos (seus membros se unem, eliminando suas diferenças internas); (ii) mudam o clima de informal, casual e brincalhão para compenetrado em cumprir os objectivos; (iii) os seus membros estão predispostos a aceitar uma liderança autocrática (e, em reacção de complementaridade, os padrões de liderança deslizam, também, do democrático para o autocrático); (iv) são altamente estruturados e organizados; (v) e exigem mais lealdade dos seus membros (que, por seu lado, se disponibilizam, sem rebuço, para dar corpo a uma frente - sólida e unida qb - para enfrentar os adversários).
É que há aí à frente, esperando pela atenção de AMBOS (de TODOS), tanta coisa por equacionar e resolver. Ele é a Praia que não pode continuar adiada; são as eleições legislativas que aí vêm; é o presente clamando por transformações; é o futuro por construir; ele é um mundo de coisas que não acontecem de per si. A hora é, pois, de trabalho.

Trabalho para encontrar as soluções por que a Praia clama. A Praia tem solução, sim senhora, mas as soluções têm de ser construídas. Não são de geração expontânea: exigem planeamento, organização, direcção e controlo; exigem engajamento do poder local, do poder central, das forças vivas locais, de todos os praienses. Situação e oposição devem atirar para detrás das costas as questiúnculas e darem-se as mãos para viabilizar as soluções para que esta cidade cresça, se desenvolva e prodigalize progresso e bem-estar para residentes e visitantes.
Trabalho, também, para que o país continue a ser governado com ponderação. A situação que afine o seu programa de governação e refine a sua performace. A oposição que se prepare, se organize e se apresente como alternativa credível à governação. E que cada um faça o seu trabalho de casa, para que não nos venham chatear depois com lengalengas do tipo “fraude”, “compra de consciências”, “bocas-de-urna”, e «outras bocas». Que o povo vota sempre certo. Conscientemente ou porque «Deus escreve direito por linhas tortas», a história das eleições livres nesta República confirma a justeza das opções deste povo. O voto é a arma do povo e este tem-na usado com a perícia de um Billy «the Kid» ou dos irmãos James (Jesse and Frank).

É, pois, chegado o momento de pôr um ponto final nas lamúrias e nos festejos. É chegada a hora de se montar (ou remontar, conforme os casos) os melhores governos possíveis. Para a República e para a sua Capital. É chegado o momento de organizar os partidos e as associações cívicas para os desafios que nos esperam. Nem os partidos, nem as associações (cívicas, comunitárias, de classe, etc.) devem meter férias.
As organizações da sociedade civil para ajudarem os poderes a actualizarem o levantamento dos problemas que clamam por uma solução; para cooperarem na identificação das prioridades; para participarem das tomadas de decisão.
Os partidos para fazerem o seu papel de correia de transmissão entre as populações e os poderes: auscultando as populações, influenciando a governação e direccionando as decisões dos poderes por eles suportados. E, claro está, que se organizem, convenientemente, para os embates eleitorais que vêm aí; que se preparem para todas as eventualidades (1, x ou 2, que nem no Totobola); e, finalmente, que aprendam a respeitar as decisões do eleitorado (ELE sabe o que quer, para onde vai, e, principalmente, COM QUEM VAI).


Monday, June 9, 2008

JC, SUPERSTAR

“Toda a árvore que não der bons frutos será cortada e lançada ao fogo. Pelos seus frutos os conhecereis”

Mateus 7:19,20

Alguém comentava outro dia que o discurso de um dos intervenientes - na assembleia de militantes do PAI ocorrido no Palácio da AN, no passado dia 24 de Maio - parecia dar indicações de que aquele militante estaria na disposição de despoletar um Congresso extraordinário e, nele, desafiar a liderança de José Maria Neves. Lembro-me de ter retorquido na altura que, dos dirigentes de proa do PAI, Júlio Correia (JC) era o único que estaria em condições de questionar a liderança de JMN. E as razões são claríssimas: é o único dos grandes que ganhou na última jornada. Melhor: é o único que tem ganhado sempre. Mas não se tratava de JC.
JC fazia parte do losango do meio-campo que conduzia o jogo do PAI. Fazia a posição 6. JMN (posição 10) ocupava a outra ponta do eixo da diagonal perpendicular à linha que divide o campo. E Inocêncio (à direita) e Basílio (à esquerda) ocupavam os dois vértices dos extremos da diagonal horizontal à referida linha.
Com o tempo e com as peripécias do jogo, o losango distorceu-se e a sua configuração já mais parecia a do papagaio de papel com que a meninada brincava no meu tempo: o eixo horizontal aproximou-se da ponta ocupada por JMN, fazendo com que a ponta ocupada por JC ficasse bastante distante do resto do meio campo. Inocêncio e Basílio ficaram mais perto de JMN e mais próximos um do outro. O problema é que a transposição do losango para a «pipa» nunca é isenta de custos. Já vimos isso com Paulo Bento e Miguel Veloso: é quando o Miguelito recua tanto que mais parece um terceiro central. E, quando assim acontece, quase sempre o Sporting perde (porque se imobiliza um criativo que, para além de recuperar bolas, também participa na organização dos lances de ataque).
Quando topa que, com a nova disposição, o meio-campo, na prática, integrava apenas o triângulo superior do losango (a trindade Inocêncio, JMN e Basílio), JC deixa a linha média e busca novos ares.

Com a «trindade» do meio-campo tambarina claudicando diante de um adversário que, teoricamente, estaria ao seu alcance, seria de esperar que JC botasse pra quebrar. Mas JC é um gentleman e um militante (dirigente) responsável. Foi muito comedido. No entanto, ainda assim (e porque para bom entendedor meia palavra basta), falou e disse.
Agora que o jornal «A SEMANA» resolveu (em boa hora) preitear o vencedor, vamos então ler a entrevista a JC, conduzida por José Vicente Lopes (JVL).
Muito ao jeito tambarina, diz-nos JC, que:

1. Há gente com influência desproporcional no partido (gente que nunca ganhou umas autárquicas, mas que está sempre na mó de cima, controlando o dossier autárquico e «impondo» candidatos);
2. Há gente com peso excessivo na governação;
3. Há (no Governo) gente a quem tem faltado sensibilidade para execução do pensamento do PM;
4. Os dossiers Santa Catarina (de Santiago) e São Filipe (Fogo) foram mal geridos;
5. Há déficit de espaço para discussão aberta dos problemas do partido;
6. Há um Ministro (pelo menos) que desobedeceu ao PM, recusando-se a fazer campanha por ser desafecto do candidato que foi incumbido de ajudar;
7. A liderança do Sector Autónomo da Praia é fraca e tem responsabilidades nos resultados da eleição de 18 de Maio;
8. Se está fazendo asneiras na aerogare de São Filipe (e que elas jogam e jogarão contra o partido);
9. A condução desastrosa do dossier TACV terá dado alguma contribuição para a derrota de Felisberto Vieira;
10. JMN precisa estar melhor apoiado na organização do partido.

Parece não haver dúvidas de que JC quer uma nova «trindade» a governar o PAI e o país. E parece natural que ele seja um dos membros da «trindade», conquanto, justiça lhe seja feita, ele assim não se tenha posicionado em momento algum da entrevista.
É natural porque, antes de mais, ele é dos poucos (quase o único) a quem não se pode debitar a derrota do PAI nesta ronda; depois porque, afinal, ele é JC (e caramba! quem melhor habilitado do que um JC para escorraçar os vendilhões do templo e para, em momento pós ressurreição, se apresentar sentado à direita do PAI?!).
O entrevistador, JVL, quis que JC desse o nome aos bois.
Mas precisava? Quem nunca ganhou uma eleição autárquica, mas que está sempre controlando o processo autárquico no PAI? Quem não tem tido a necessária sensibilidade para dar execução ao pensamento do PM? Quem responde politicamente pelas aerogares? Quem assumiu o controlo do dossier privatização dos TACV? Os pontos 1, 2, 3, 8 e 9, deste apontamento, apontam claramente para Manuel Inocêncio Sousa. Um alvo a ser reclassificado, no dizer de JC.
Os pontos 4 (dossiers Santa Catarina e São Filipe), 5 (déficit de democracia interna) e 10 (JMN mal secundado), interpelam claramente o triunvirato (Inocêncio/JMN/Basílio) que dirigiu o processo eleitoral, sendo certo que JC fez questão de sublinhar as EXCELSAS qualidades de JMN e de Basílio.
O ponto 6 questiona, inequivocamente, a permanência de Lívio Lopes no Governo e na cúpula do PAI. É voz corrente no país que Lopes se teria recusado a fazer campanha por Ungeno (contra quem já se posicionara em anteriores eleições autárquicas). Coerência por coerência, JC respeita a liberdade de escolha de Lopes mas é peremptório quanto à sua saída do Governo: ou SAI ou é SAÍDO.
O ponto 7 tem a ver com a prestação de José Maria de Pina. Nestas autárquicas e não só. JC afirma claramente que o PAI merece outra (mais forte) liderança na Praia, onde, diz ele, o partido é muito forte.
Diante disso, com ou sem Congresso, JMN, Primeiro-ministro e Presidente do PAI, vai ter que explicar muito bem porque carrega Inocêncio às costas. JC não é o primeiro dirigente tambarina a contestá-lo: os autarcas João Baptista Pereira e Felisberto Vieira (ambos, à moda tambarina, que é como quem diz, mais em compreensão do que em extensão), em momentos diferentes, apontaram o dedo ao Lorde das Infra-estruturas. JC espera ainda posicionamentos inequívocos de JMN em relação a Lívio Lopes e a José Maria de Pina (e seus pares do SUP do PAI).
E os conselheiros do PAI vão ser chamados para descodificar o que JC chama de DIVERSIFICAÇÃO DA LIDERANÇA, e implementá-la a tempo de terem a organização necessária e suficiente para dar corpo à estratégia a seguir até ao Congresso.