Monday, October 29, 2007

PARCERIA ESPECIAL UE/CV

Você sabe o que é caviar?
Não sei, nunca vi, só ouço falar.
Caviar é comida de rico,
de quem tem bala na agulha.
Lá em casa é mais arroz, feijão e torresmo
...

Se lerem estas estrofes a um ritmo tipo samba-pagode, vão ver que soa bem. Muito animado. Para os entendedores está claro que se trata de uma música gravada por esse monstro sagrado do samba que é ZECA PAGODINHO, nascido Jessé da Silva Filho.
Ainda hoje, para muita gente em Cabo Verde, a parceria especial União Europeia/Cabo Verde está que nem o caviar para o compositor da modinha cantada acima: NÃO SEI, NUNCA VI, SÓ OUÇO FALAR.
Compreende-se que o segredo seja a alma do negócio. Tudo bem.
Mas o segredo demasiado bem guardado pode se perder. Pelo que se pôde ler da queixa amarga registada pela agência Lusa, depreende-se que nem Pedro Pires, nem Aristides Lima sabem a letra da canção.
Que Cristina Fontes não sabe, ou sabe muito pouco, ficou patente na comunicação que fez ao país. Inocêncio e Basílio saberão alguma coisa? De José Maria Neves se sabe que conhece a música, de o ouvirmos trauteá-la. Conhecerá a letra? Haverá, mesmo, uma letra?
Pode até acontecer que ainda não haja letra para a música. Os compositores, dependendo do momento e da inspiração, ora compõem uma bela melodia, depois casam com um poema que vem do fundo da alma; ora têm uma letra que só mais tarde é musicada. No caso da parceria especial UE/CV pode bem dar-se o caso de haver melodia (que encantou o Primeiro-ministro de Cabo Verde) e está-se a dois passos de se ter uma letra a condizer (com os insubstituíveis contributos do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu para os Assuntos Gerais e Relações Exteriores).
Mas seja qual for a letra, o importante é que, apesar dos pesares, Cabo Verde não perca. Ganhar não é, do meu ponto de vista, o mais importante. Tratando-se de uma parceria, o importante mesmo é que ambas as partes fiquem de coluna erecta, se olhem olhos nos olhos e, sobretudo, que haja respeito mútuo. Que parceria é isso mesmo: duas partes, com vantagens recíprocas, obrigações negociadas e dignidade qb.

Mas neste Cabo Verde, terra de poetas e músicos, ninguém se aventura a improvisar uma letrinha para a gente seguir cantando, até que o segredo nos seja desvendado? Vamos lá!
Eu, que sou mais tipo prosador bárbaro, vou ensaiar um rap, embora tenha quase a certeza que a música que segue encantando Neves, Barroso, Sócrates e, why not?, Fontes, deva ser uma valsa vienense.
Eu vou querer que os produtos originários de Cabo Verde, ou com valor acrescentado em solo cabo-verdiano, continuem a ver franqueadas as portas da Europa sem qualquer tipo de restrição e em completa exoneração de impostos de porta (apesar do aviso atempado de que, ainda nesta primeira década do novo milénio, cessariam os benefícios sem reciprocidade, o que, traduzida por miúdos, significa que a UE só vai aceitar importações em exoneração de taxas da parte de quem aceite, no respectivo território, importações de produtos originários da Europa com exoneração de taxas). Isso já dava letra que, por si só, seria música para muitos bons ouvidos. Melómanos ou não.
Vou querer que a União Europeia participe activamente no policiamento da grande praça off shore localizado a Norte da ilha de Santo Antão (e onde ganha corpo tudo quanto os manuais tipificam como crime transnacional) e colabore connosco na realização da soberania sobre toda a nossa ZEE (Zona Económica Exclusiva). De momento, diga-se o que se disser, a nossa soberania, com as limitações impostas aos pequenos países pobres e insulares, só se exerce sobre os 4.033 Km2 distribuídos pelas ilhas e pelos ilhéus. Era a oportunidade para um efectivo alargamento do nosso território e para preservação das riquezas que, eventualmente, aí existam.
Receberia de bom grado a notícia de que a União Europeia vai disponibilizar recursos, para o orçamento do estado de Cabo Verde, a modos de se poder investir em (1) um programa de atracção de investimentos na indústria para exportação; (2) no reforço da competitividade das empresas nacionais que apostem na indústria; (3) na qualificação da nossa mão-de-obra; (4) no reforço do controlo das nossas fronteiras marítimas e aéreas, arvorando-as em linhas avançadas de defesa das fronteiras mediterrânicas da Europa; (5) na criação, enfim, de um ambiente que desencoraje seja os nacionais de embarcarem na aventura de uma emigração não desejada pela Europa, seja a utilização destas ilhas como base de assalto à tranquilidade dos europeus, seja ainda a utilização deste porta-aviões estacionado no Atlântico médio como hub para o fornecimento de drogas aos dealers operando na Europa.
Eu me daria por satisfeito com este rap. Mas é claro que se nos dessem garantias efectivas de manutenção do acordo cambial (apenas à condição de respeitarmos os critérios de convergência de Maastricht); se garantissem dispensa de vistos de entrada aos nossos empresários, aos altos quadros das empresas e da Administração do Estado, em missão de serviço ou em férias (exigindo, neste particular, a necessária reciprocidade); se concedessem aos nossos estudantes o direito de trabalharem, em part-time, a modos de poderem melhorar a qualidade de vida que têm longe da família; se se dispusessem a nos ajudar (com o know-how adquirido na construção europeia) a fazer funcionar a CEDEAO; seria ouro sobre azul. E, sem receio de exagerar, iria mais longe do que José Maria Neves. A parceria especial UE/CV seria, muito mais do que um mero facto histórico: seria um verdadeiro marco histórico. Nas relações Cabo Verde/União Europeia, nas relações Europa/África, no sonho (não sei de quem, mas não interessa) da reconstrução do continente Euro-Africano, referenciado nos manuais de Geografia da 3ª classe dos meus tempos de primária.
Seria um belíssimo acordo. Uma extraordinária parceira!
Mas será isso que vamos ter? Vamos ter mais do que isso? Não sei. Mas não é proibido sonhar e, vamos e venhamos, sonhar é preciso!

Tuesday, October 23, 2007

PARTIDOS POLÍTICOS E GOVERNAÇÃO

Fico às vezes perplexo quando escuto algumas colocações de pessoas muito bem cotadas na nossa sociedade. Fala-se que o “partido A” ganhou as eleições legislativas; que o “partido B” ganhou as autárquicas; fala-se de “Governo do partido A”; que o “partido B” está na oposição; etc.. Tudo bem. São constatações. São factos.
Mas também se escuta que o “partido A” está se imiscuindo nos assuntos do Governo; que o “partido B” não tem lições a dar a ninguém porque quando foi Governo agiu mal; que a “Câmara P” não confronta o Governo porque são da mesma cor política; etc..
Tais asserções não podem ter o mesmo sujeito. Como é possível que alguém, numa hora, barafuste com o Governo do “partido A” e noutra entenda que o “partido A” não pode pretender tirar satisfações ao Governo ou sugerir-lhe caminhos? Como conciliar o facto de o “partido A” ter ganho a “Câmara P” e as eleições legislativas com a recusa em lhe reconhecer o direito de tentar a conciliação dos interesses entre o executivo camarário e o Governo? Como pretender que o “partido B”, por estar na oposição, não tenha voz, só porque, num passado recente, agiu mal? Como pretender que, por exemplo, o “partido B”, que ganhou a “Câmara M”, não oriente a actuação do executivo daquela Câmara?
Quem vai a votos são os partidos. Quem ganha as eleições são os partidos. As cobranças são feitas aos partidos. Como pretender-se, pois, que os partidos fiquem à margem da governação. A proposta de sociedade – ou as propostas para a sociedade, como se preferir – são do partido. A plataforma eleitoral sufragada é do partido. O Governo é um governo do partido vencedor das eleições. Então, há que convir que um partido não pode – nem deve – se limitar a ganhar eleições e só voltar a dar ares da sua graça nas eleições seguintes. Tem o dever e a obrigação de mergulhar na sociedade profunda, auscultar as suas necessidades e aspirações, processá-las e, a partir de tais reiterados exercícios, municiar o Governo, influenciar as suas políticas públicas, perseguir a satisfação das necessidades auscultadas e não só. Tem o partido do poder esse direito. Conquista-o nas urnas.
Vão os partidos às urnas. Ganha um, perdem os demais. Mas têm algo em comum: todos receberam votos do eleitorado. Uns mais do que outros, mas todos têm responsabilidades perante o eleitorado, não fazendo, por isso, sentido que uns possam falar, dizer de sua justiça e os outros não. Há um programa que é sufragado pela maioria do eleitorado que se dignou comparecer perante as urnas, é certo; mas há uma boa franja desse mesmo eleitorado que não esteve pelos ajustes: votou noutra força política. E a consequência lógica do voto que não conformou a maioria é a obrigação dos seus beneficiários exercerem vigilância e controlo na realização do programa sufragado pela maioria. QUEM recebe mais votos, GANHA e GOVERNA; QUEM recebe menos votos, PERDE mas fica com a obrigação de contribuir para que a Legislatura sirva os interesses da Nação. Tem toda a legitimidade do Mundo para participar - criticando, sugerindo, propondo, censurando. E o facto de, no passado, ter agido mal não pode ser arvorado em açaime: por ter agido menos bem, foi apeado do poder. E isso é, a um tempo, a beleza e o castigo máximo em democracia. A ALTERNÂNCIA é a censura para quem não satisfez e a oportunidade de quem se posiciona com uma aliciante proposta para a sociedade. Não é – nem poderia ser – o silêncio de uns diante de uma voz dominante e hegemónica.
Mas fico perplexo diante de tais asserções porque sou um romântico inveterado.
Que esperar de partidos que em chegando ao poder fazem desaguar todas as suas competências no Governo, no Parlamento, nas Embaixadas, nos Institutos Públicos e noutras estruturas da administração? Parece que o objectivo é ganhar as eleições, garantir jobs for the boys (and the girls). E o Partido? O partido quando não fica entregue a militantes medianos, pouco hábeis ou sem o necessário traquejo político, mantém as portas encostadas e o letreiro “VOLTAMOS DENTRO DE MOMENTOS” (leia-se, na próxima eleição).
Que esperar de partidos cujos militantes, quando perdem eleições, vão à vida, deixando o aparelho entregue a carolas, as mais das vezes com pequena ou nula capacidade política , ou a pessoas para quem a política não é mais do que um exercício de intrigas e mal-dizer? Enquanto no grupo que ganha todos se disponibilizam e se põem nos bicos dos pés para conseguir um cargo, no grupo que perde todo o mundo ganha ciência de que precisa, com urgência, continuar os estudos, tirar projectos empresariais inadiáveis da gaveta, ir à vida, enfim. É caso para dizer que só temos partidos para as eleições.
Em realidades em que os partidos pensam e agem como os nossos, o mais certo é todos se estranharem quando um partido se interessa pela governação (não apenas enquanto partido do governo, mas, essencialmente, na qualidade de partido dos eleitores e da sociedade em geral); soa a heresia um partido aparecer a conciliar os interesses e as políticas de um “seu” executivo municipal com o “seu” governo central; parece absurdo alguém que não um Ministro, um Embaixador ou um Presidente de Instituto, estar a chatear-se com problemas que o Governo assumiu resolver. Tentar exercer o controlo popular do poder acaba parecendo acto subversivo da oposição e das organizações da sociedade civil. O partido do poder tem tanta legitimidade para orientar os seus governos (central e locais) quanto os partidos da oposição e as organizações da sociedade civil de interpelarem os governos (central e locais) em relação às políticas públicas e às medidas de política.

Mas os tempos parecem ser de mudança. O PAI, por não ter feito o trabalho de casa, já está recebendo facturas de São Filipe (Fogo) e de Santa Catarina (Santiago). No MpD as facturas vêm de Sanvicente e de Santa Cruz.
Os bambambans do PAI que poderiam responder politicamente pelo Fogo, estão na Praia – no Governo, no Parlamento, etc.. O Sector de São Filipe do PAI não escapa à regra nacional de esvaziamento de competências. Nem à inexorável lei do vácuo: o vazio deixado é imediatamente preenchido. Por gente com boa dose de boa-vontade, mas também por caciques, carreiristas, intriguistas, etc. Em Santa Catarina (de Santiago) verifica-se fenómeno semelhante: o órgão local do partido não é lá essas coisas e as intrigas palacianas fazem o resto.
Tarde e a más horas (dirão muitos, antes tarde do que nunca) os órgãos nacionais vão intervir para salvar a honra do convento. Se a solução para São Filipe for como aquela que se vislumbra para Santa Catarina, os munícipes desses concelhos vão ter que carpir mágoas por muito tempo. É que uma lista consensual para a Câmara de Santa Catarina, com João Baptista à cabeça, mas contendo os elementos do grupo contestante bem posicionados, é um presente envenenado para o João e para Santa Catarina. Não vai funcionar. Principalmente quando o Presidente tomar a decisão de não profissionalizar nenhum dos seus contestantes. É a única atitude que se espera de um político (e engenheiro que, felizmente, ainda não se esqueceu do anel que usa, ou devia usar) que sabe que os Vereadores profissionalizados são os HOMENS DO PRESIDENTE. E esses que orquestraram a sua exclusão - não mediante umas primárias, como seria de esperar em democracia, mas numa reunião de burocratas locais do partido, com a presença (ou será, antes, a bênção?), ainda mal explicada, de um par de dirigentes nacionais – não serão, certamente, o que se chamaria de HOMENS DO PRESIDENTE. O raciocínio é válido, mutatis mutandis, para São Filipe.
O MpD parece ter optado por uma posição de força da Comissão Política Nacional: será candidato quem a CPN sancionar e PONTO FINAL. E olha que é uma posição corajosa. De macho! Não que as soluções sejam as ideais (pelo que conheço dos dois galos para o poleiro de Santa Cruz, Policarpo não ganha do Lando e não vejo Dias como administrador de um município como Santa Cruz) mas porque é a opção por um mal menor: antes um team fraco, mas coeso, do que uma manta de retalhos desavindos.
Mas é preciso que as mudanças cheguem. E depressa. Pode-se lá aceitar uma coisa dessas? Onde já se viu uma PATIDOCRACIA sem PARTIDOS? Crescer e aparecer tem de ser a nova palavra de ordem. Para todos!

Monday, October 15, 2007

CRESCEMOS A DOIS DÍGITOS. E DAÍ???

Lembro-me amiúde do filho da amiga da comadre da minha mãe. O Zé, de Rui Vaz. Aqui ao lado.
O Zé tinha vindo fazer o exame do 2º grau aqui na Praia. Tendo sido aprovado, entendeu minha avó que uma boa prenda poderia ser levá-lo ao Djessa Mello para que fosse fotografado e levasse para casa quatro fotos tipo passe, que poderiam ser de muita utilidade. Era uma prenda relativamente barata, mas muito prática.
Pena que a minha avó não era bruxa. Que, se fosse, teria adivinhado que o Zé morria de medo de tirar retrato. Depois de vários apelos, não houve maneira de tirar o Zé de dentro de casa para ir ao fotógrafo. Ora alegava «barriga-baixo», ora era a fivela da sandália, faltava passar o pente mais uma vez pelos cabelos. Enfim, um arsenal de artifícios que a gente foi levando como coisas de rapaz novo ratolco. Até que chegou a irmã, a Judite, que nos confidenciou que o mano – rapaz que, na luta, derrubava todos os mancebos da localidade e arredores – morria de medo de tirar retrato. E pediu-nos, por todos os santos, que não deixássemos que o José soubesse que tinha sido ela a dar com a língua nos dentes.
Mas lá conseguimos, com a prestimosa ajuda do senhor Djessa, expor o Zé à máquina fotográfica. «Já está, rapaz» – anunciou o senhor Djessa. «Mas como? Nem doeu, nem nada!» – exclamou Zé, passando em revista a cabeça, o tronco e os membros, à busca de um beliscão qualquer. «Pois não dói. Esperavas o quê?» – interessou-se o fotógrafo. «Qualquer coisa. Alguma mudança. Sei lá» – atirou Zé, desconfiado.
O espanto do Zé era autêntico. Nos quinze minutos que durou o trajecto de volta – da ponta Norte da Avenida de Sá da Bandeira até à Vila Nova – não passou um em que ele não testasse uma parte do seu corpo, a ver se estava tudo bem.

Lembrei-me da estória do Zé, desta feita, ao pensar na estupefacção que deve ter assolado os meus concidadãos ao tomarem conhecimento do facto de, no ano passado, o PIB do país ter acumulado um crescimento de dois dígitos. «Mas como? Nem doeu, nem nada!» - deverão ter-se perguntado, uns. Outros terão dado de ombros e soltado um desdenhoso «E daí?».
E daí? E daí, nada. Parabéns pelo resultado, talvez. Mas como sempre se fez questão de frisar, o crescimento a dois dígitos não pode ser uma finalidade em si. A um, a dois ou a três dígitos – que sei eu?! – o que importará será sempre o impacto que o crescimento possa ter na nossa vida: no emprego, na saúde, na educação, no rendimento dos trabalhadores, nos equipamentos sociais urbanos, nas infra-estruturas económicas, na qualidade de vida. Se não há mais nem melhores empregos; melhores cuidados de saúde, mais e melhores meios auxiliares de diagnóstico, maior comparticipação do estado no custo dos medicamentos para tratamento de doenças crónicas (v.g. hipertensão, diabetes, câncer, epilepsia, etc.); mais e melhores opções de formação, um nível de ensino verdadeiramente gratuito, rigor em relação ao ensino dito obrigatório, generalização do pré-escolar, etc.; um salário mínimo calculado na base do custo de uma cesta básica (o mínimo para uma família poder comer, ao menos, duas vezes por dia, todos os dias do mês); os equipamentos e as infra-estruturas indispensáveis a uma boa qualidade de vida e à sustentabilidade do padrão de crescimento atingido; se o trabalhador não sente nada disso – se não «doer» – afinal, o crescimento a um, dois ou três dígitos, vêm a dar no mesmo. É tudo igual ao litro. O medo do Zé (de Rui Vaz, filho da amiga da comadre de minha mãe) e as crenças do outro Zé (nosso Primeiro Ministro) vêm a dar no mesmo: não doem, nem tiram pedaço. Ninguém sente.
O Zé (de Rui Vaz) andou da Praia para Vila Nova e depois da Vila Nova até Rui Vaz, inspeccionando-se todo, verificando-se vezes sem conta, e… nada. Continuava virgem, como quando tinha entrado no atelier do senhor Djessa. Não sentiu alteração nenhuma na sua vida, na sua rotina, no seu bolso. A não ser que era dono de quatro fotografias tipo passe, pagos por Nhâ Mariazinha.
O cabo-verdiano (sem renda, baixa renda, classe média, classe média alta) comemorou o nascimento de Cristo, a Passagem de Ano e os Reis, Santo Amaro Abade, São Vicente e Santíssimo Nome, o Carnaval, as Cinzas e a Páscoa da Ressurreição, a Santíssima Trindade, São Salvador do Mundo e São Jorge, São João, São Pedro e São Paulo, São Tiago Maior, São Lourenço, Nossa Senhora da Graça e São Roque, Nossa Senhora da Luz, da mesmíssima forma. Como quando o país crescera apenas a um digitozinho. E agora, por ocasião de Santa Teresinha, vêm-lhe dizer que as festas por cada uma das datas referidas poderiam, e deveriam, ter sido bem melhores, porque o PIB cresceu quase 11%.
Será que as festas de Todos os Santos (1º de Novembro), de Nhâ Santa Catarina (25 de Novembro), Imaculada Conceição (08 de Dezembro), Natal e Ano Novo serão mais rijas, por conta do crescimento a dois dígitos conseguido no ano passado? Será desta que os servidores do Estado vão ganhar direito ao tão desejado 13º salário? Vai haver alguma actualização salarial por conta do crescimento a dois dígitos? Os medicamentos para os doentes crónicos vão poder ser comparticipados pelo Estado? O ensino gratuito vai passar a ser mesmo gratuito? O estado já está em condições de compelir os pais a levarem os filhos para a escola, cumprindo os ditames do ensino obrigatório? No curto prazo, onde vai «doer» ao cidadão nacional?
O facto de só “sentirmos que crescemos” a dois dígitos, dez meses depois de “termos crescido”, já é, de per si, sintomático. Soa ao velho Djessa dizendo ao jovem Zé (de Rui Vaz) «Já está, rapaz». Não doeu. Não tirou pedaço. Nem acrescentou nada. A não ser uns prints do INE e do FMI (o BCV falou alguma coisa?), tal qual as fotos 4x4 que o Zé levou nos bolsos quando regressou a Rui Vaz. Se virgens estivéssemos, virgens chegaríamos ao altar, dependendo do impacto imediato do crescimento a dois dígitos.

Mas que foi bom que agora, nesta fase da Legislatura, se tenha chegado a um tal resultado, foi.
Antes de mais, porque o Governo vai entender que o palavreado que não leva nada para a panela do trabalhador, nem debela as dores do sofredor, deve ser usado com parcimónia. Quando começarem as cobranças (tipo «crescemos 11%, e daí?») o gerúndio não chegará para acalmar a ira desencadeada. Talvez vá sendo o caso do povão baixar uma liminar proibindo o gerúndio nos discursos justificativos dos detentores do poder.
Depois, porque o Governo vai ver-se e desejar-se para atingir a fasquia colocada em relação ao crescimento do decorrente ano económico. Não vai chegar lá. As correcções que conduziram ao resultado que ora se festeja, vão jogar contra as metas deste ano. Alguém quer pagar para ver?
Mas terá sido bom principalmente se os políticos entenderem que a aposta tem que ser no desenvolvimento (desenvolvimento aqui entendido como processo histórico que é, a um tempo, causa e consequência de um harmonioso crescimento económico, de substancial melhoria da qualidade de vida, da salvaguarda do ambiente, da boa governação e de elevados padrões éticos na gestão da coisa pública). À criação da riqueza deve-se aliar um coerente e eficaz mecanismo de redistribuição da mesma; a qualidade de vida deve ser erigida em FINALIDADE de toda a acção do Estado; a salvaguarda do ambiente deve ser considerada como a garantia da sustentabilidade do desenvolvimento e da preservação da qualidade de vida; a boa governação tem de ser integrada na cultura do poder como elemento estruturante; a ética terá de ser um princípio insofismável e de valor absoluto (nem a ética do faz-de-conta, nem éticas particulares ou privativas, nem mais ou menos ético) e tão estruturante da cultura quanto a boa governação que, de facto, não existe quando a ética está ou entra de férias. É isso que interessa realizar.
Não importará quanto possa crescer a nossa economia se tivermos sempre presente o que é essencial e o que é acessório e se formos capazes de distinguir uma coisa da outra. O resto… é o resto.
No passado convenceram-nos que a estiagem era a responsável por todos os nossos problemas. Hoje, consciente ou inconscientemente, procura-se convencer-nos que só o crescimento importa. Mas as coisas não se passam assim, de forma tão simplista. O que falta nesses raciocínios com que nos brindam é algum rigor, digamos, matemático.
A estiagem complicou? Complicou e segue complicando. A estiagem pode ser (e certamente foi) a condição necessária para que o nosso povo tivesse passado pelas privações por que passou no passado (passe a redundância). Mas – há de se perguntar – porque não provoca os mesmos danos agora? A estiagem foi a condição necessária, mas não teria sido jamais suficiente para, só por si, causar os danos que causou. Tivesse a metrópole tomado as devidas providências…
O crescimento a dois dígitos ajuda ao desenvolvimento? Claro que ajuda. Diria que o crescimento (não importa quanto se tenha crescido, à condição de que seja de forma sustentada) é factor absolutamente necessário ao desenvolvimento. Mas será suficiente? Crescer igual a desenvolver? Não. Pode-se ter boa qualidade de vida (e tudo o resto que identificamos atrás como indicadores de desenvolvimento), com modestas taxas de crescimento. E acontece não se atingirem bons níveis em nenhum dos indicadores, apesar de boas taxas de crescimento. Resulta, pois, que o crescimento é condição necessária, mas não é suficiente.
Sugiro que a gente recorra regularmente ao enunciado dos Teoremas que a gente aprende na Matemática para que se possa identificar com algum rigor o que é necessário e suficiente, em cada momento, para se atingir o resultado pretendido. Por exemplo: É CONDIÇÃO NECESSÁRIA E SUFICIENTE PARA QUE UMA FIGURA GEOMÉTRICA SEJA UM QUADRADO, QUE TENHA QUATRO LADOS IGUAIS, FORMANDO, ENTRE SI, ÂNGULOS DE 90 GRAUS. Quatro lados iguais podem configurar um quadrado (como na ALA DOS NAMORADOS, em Aljubarrota), é certo; mas configuram, também, um losango (como na estrutura do meio-campo do SPORTING de PAULO BENTO). A diferença reside nos ângulos rectos do Quadrado (mas que, de per si, não definiriam nada, já que no Rectângulo, por exemplo, também todos os ângulos são de 90º).
Ficamos, pois, em que uma boa taxa de crescimento pode até ser coisa boa, mas que só «doerá» se houver algo mais. Algo que possa transformar o crescimento em mais e melhores empregos, mais e melhor saúde, mais e melhor educação, mais rendimento para o trabalhador, mais e melhores equipamentos sociais urbanos, mais e melhores infra-estruturas económicas e, sobretudo, mais e melhor qualidade de vida.
Se não… será sempre como ir ao Djessa tirar um retrato. E daí?

Friday, October 12, 2007

SELECÇÃO DE SANTIAGO 1965
TITULARES
: TINTA; PETCHAS GUGÚ, DJUDJA e KIKI; MANUNA e TOIZINHO; CRUZ, NHARTANGA, LUÍS BASTOS E PERDIGÃO.
SUPLENTES: AUGUSTO, SABARÁ, PEDÉ, MÁRIO BIDÉU e MULATINHO

NA FOTO
DE PÉ: TINTA, GUGÚ, DJUDJA, MANUNA, AUGUSTO, PETCHAS, SABARÁ e KIKI.
EM BAIXO: PEDÉ, CRUZ, MÁRIO BIDÉU, TOIZINHO, MULATINHO, NHARTANGA, PERDIGÃO e LUÍS BASTOS.

Thursday, October 11, 2007

MEMÓRIAS

REAL MADRID
Arakistan, Casado e Meira; Patchi, Santa Maria e Vidal; Quesada, Del Sol, Di Stefano, Puskas e Gento.

SPORTING CP
Carvalho, Lino e Hilário; Perides, Lúcio e Mendes; Hugo, Figueiredo, Diego, Geu e Morais.

SPORTING CP
Augusto, Caiçara, Djudja, Gugú e Noel; Manuna, Toizinho e Heitor; Djack, Corsino, Pedé e Zezinho.

Monday, October 8, 2007

ALVÍSSARAS!

O Secretário Regional da Energia e porta-voz da autarquia regional de Santiago, chamou a comunicação social para fazer o seguinte comunicado:

«Senhores Jornalistas, minhas senhoras, meus senhores,
A Presidência da autarquia regional de Santiago, após várias rondas negociais com o Governo da República e com os accionistas da Electra, sob a égide do Banco Mundial, do BAD e do Banco Africano de Investimentos, tem a honra de dar a boa nova aos santiaguenses. CONSEGUIMOS! VENCEMOS! VAMOS SAIR DA CRISE!
Na verdade, desde cedo, colocamos sobre a mesa a nossa pretensão, sem subterfúgios, sem papas na língua. Se os municípios de Santiago se reuniram e deram corpo, com a bênção do Governo da República, à Região Administrativa de Santiago – autarquia supra municipal – as três questões que mais preocupavam a ilha tinham que entrar, de imediato, na ordem do dia. Eram elas: as infra-estruturas viárias, a energia e a água e o saneamento.
Desde cedo erigimos a questão energética como a prioridade das prioridades.
O que estava falhando com a ELECTRA? O que impedia o Governo da República de identificar o xis da questão? O que poderia a Administração da Região de Santiago fazer de diferente?
Foram-nos dadas todas as garantias em relação à capacidade de produção da ELECTRA em Santiago. Iriam ser instalados grupos geradores capazes de satisfazerem as necessidades da ilha e da sua capital e estariam em stand by (como reserva de potência) os grupos necessários para suprirem o equivalente a 50% das necessidades da Região.
Interpelados sobre o ponto da situação do projecto respeitante às energias renováveis, maximé, em relação à energia eólica, as respostas foram um tanto ou quanto evasivas, o que deixou a Administração da Região com a pulga atrás da orelha. Algo não ia bem no reino da Dinamarca.
Questionados acerca do estado da rede de distribuição (operacionalidade, extensão, manutenção e conservação, projectos de renovação) a ELECTRA e o Governo da República sugeriram que não se pusesse a carroça à frente dos bois, e que quando fosse a altura certa, se trataria do assunto. Obviamente que a resposta não nos deixou tranquilos. Era a velha estória do ovo e da galinha. Qual deles apareceu primeiro? O ovo ou a galinha? A produção ou a distribuição? Nós perguntamos: de que serve produzir-se energia eléctrica, se não se tem uma rede para a distribuir? E eles, sintonizados, responderam com outra pergunta: para quê uma rede upgraded ou nova se não se tem energia para distribuir? Para nós a situação é clara e diáfana: precisa-se de ter suficiente capacidade instalada e precisa-se de ter uma boa rede para distribuir a energia produzida. Duas faces de uma mesma moeda. Cara e coroa. Mas mais: havendo uma boa rede, quando tivermos energia é só deixar fluir para satisfação das donas de casa, dos operadores económicos, das instituições financeiras, de todo o mundo.
A representação da nossa Região foi assumida ao mais alto nível. O Presidente da Autoridade Regional, eu próprio, na qualidade de Secretário Regional para a Energia, e uma equipa de consultores, os quais não pouparam esforços na assessoria da equipa política.
Apelamos para o benchmarking em relação a realidades muito próximas da nossa, com experiências tão dolorosas quanto as nossas, mas chamavam-nos sempre a atenção para os problemas de tesouraria da ELECTRA, para a impossibilidade em debelar as perdas e os roubos na rede de distribuição e para as dificuldades na recuperação de créditos malparados. Enfim, a situação mais parecia ser um nó cego que ninguém conseguia desfazer.
A questão que cedo nos pusemos foi: há ou não há uma saída para a crise energética que assola a nossa região, maximé, a Capital do país? Os problemas, como factores restritivos contingenciais que são, são sempre passíveis de solução – repetia a nossa equipa de assessoria o tempo todo. Ou então não se está, de facto, perante um problema. Sua Excelência o Presidente da Autoridade Regional concordava o tempo todo, rematando a espaços: ou resolvemos este problema ou não terá valido a pena o sacrifício de descentralização consentido pelo Governo da República.
[Um aparte: o Presidente gosta de passar a ideia de que foi o Governo que abriu mão de alguns poderes em favor das regiões (descentralização de oferta), quando a verdade (e ele faz questão de frisar isso, na intimidade) desta feita, foi mesmo uma descentralização de procura, uma conquista, portanto, dos cidadãos.)]
Diante do quadro que vos descrevi, só nos restava uma postura: a defesa intransigente de uma solução que consagrasse soluções tanto para a questão da produção como para a da distribuição de energia eléctrica.
As negociações perigaram quando o nosso Presidente deixou escapar esta bomba: OU POMOS AS DUAS QUESTÕES SOBRE A MESA, PARA TRATAMENTO SIMULTÂNEO OU SERÁ MELHOR PARARMOS POR AQUI MESMO. Caiu na sala aquele silêncio. Contudo, o bom senso viria a imperar. Seria desanimador, após tantas rondas negociais, se quedar por um fracasso. Voltar à estaca zero.
Mas valeu a pena o susto. As negociações foram suspensas por 24 horas. No reatamento, o representante do Governo da República, com o agrément do representante da ELECTRA, passou a bola para o nosso lado. Tínhamos 30 dias para apresentarmos uma proposta balanceada de solução. Tanto o Governo como os accionistas reconheceram o dramático da situação energética na ilha e se dispuseram a participar de uma solução definitiva, desde que não implicasse a realização de nenhum milagre.
Provamos que quando nos encostam às cordas tornámo-nos contundentes. Chegamos ao xis da questão em tempo recorde. E em vinte dias tínhamos pronto um projecto que podia resolver de vez a questão. E assim o queira Deus, vai resolver. Parece que matámos a charada.

Senhores Jornalistas, minhas senhoras e meus senhores,
Propusemos, e as outras partes concordaram, o seguinte:
1. Na ilha de Santiago, a ELECTRA abre mão, em condições que por razões óbvias não vão poder ser divulgados, da rede de distribuição, permitindo o surgimento de uma nova empresa – a RES (Rede Eléctrica de Santiago, SA) – responsável pela construção, manutenção e conservação da rede e pela distribuição de energia eléctrica na Região;
2. Disponibilidade da ELECTRA, do Estado de Cabo Verde e da Autarquia de Santiago, em participarem no capital da nova empresa, na qualidade de sócios minoritários;
3. Apoio do BM, do BAD e do BAI na identificação de um parceiro estratégico (não sei se estarei quebrando algum sigilo se vos disser que uma empresa portuguesa, a REN – Rede Eléctrica Nacional – se mostrou disponível para embarcar no projecto) e na participação na engenharia financeira necessária para dar corpo ao projecto;
4. Disponibilidade total do Governo da República em pôr de pé uma estrutura policial e um «Tribunal de polícia» voltados para a luta contra a violação da rede regional de distribuição de energia eléctrica;
A título de recomendação, ficou decidido uma maior parcimónia e cientificidade na selecção dos agentes de campo da nova empresa, de modo a evitar que se chegue à situação a que a ELECTRA chegou e a que não serão estranhos os desvios de comportamento de alguns (há quem diga que de muitos) operacionais da empresa.
ALVÍSSARAS! Desta feita, a moeda estará inteira. Cara e coroa. Produção e distribuição. Ali. Operacionais. E à disposição dos estimados concidadãos/consumidores, afinal a razão de ser das duas empresas, do Governo da República, da Autoridade Regional.
Bem-haja a descentralização que, em boa hora, permitiu o surgimento e a afirmação de uma liderança forte na ilha de Santiago.
MUITO OBRIGADO.»
É claro que esta conferência de imprensa ainda não aconteceu. Mas espero que aconteça um dia. Brevemente. Com estes contornos. Com as soluções que precisamos e que a ELECTRA está longe de poder dar.
ALVÍSSARAS!