Monday, July 25, 2011

O REAL E O CONSTITUCIONAL

Em uma Democracia Constitucional - como é o caso de Cabo Verde – a Constituição Política da República (CR) é, a um tempo, a base e o limite dos poderes.
Quer isso dizer, que todos os poderes ganham legitimidade na CR; têm os poderes estabelecidos na CR; usam os poderes da forma prescrita na CR. Isso, por um lado. Que, por outro, significa que os poderes não são absolutos, antes existem balizas claras entre as quais se movimentam; que não são válidas as acções dos poderes que forem para lá das balizas estatuídas na CR; que são ilegítimas todas e quaisquer decisões que exorbitem das balizas impostas pela CR.
Isso implica a existência de um órgão – isento, imparcial e vertical – cuja função precípua seja velar pelo estrito e rigoroso cumprimento dos ditames constitucionais, para que todos legitimem os seus poderes nos termos estabelecidos pela CR e para que ninguém extrapole os limites ditados pela CR. Esse órgão, de soberania, é o Presidente da República (PR) – Chefe de Estado e Comandante Supremo das Forças Armadas.
A função principal do PR é velar pelo estrito e rigoroso respeito pela Constituição Política da República. Mas tem outras funções, qualquer delas muitíssimo importantes, definitivas mesmo, para o bem-estar de todos e felicidade geral da Nação.
Para além de velar pelo escrupuloso respeito pela CR, tem mais a função de contribuir para a materialização da CR. Quer isso dizer que, para além de garantir que todos se submetem aos limites impostos pela CR, tem ainda o dever e a obrigação de tudo fazer para que esta seja concretizada.
Por exemplo, a Constituição define o modelo de Estado e o sistema de Governo; o tipo de Sociedade, seus valores e fundamentos; a Administração Pública, seus princípios, suas regras e seu papel; a Justiça, seus actores e seu quadro legal; os direitos e as liberdades individuais e respectivas garantias; para além de um vasto leque de direitos – ao trabalho, à habitação, à educação, à saúde, à protecção do Estado, ao bom nome, etc. Compete ao Presidente da República tudo fazer para que todos os direitos, liberdades, garantias, valores e princípios se concretizem, se tornem realidade; que o Estado real, a Sociedade real, a Justiça e a Administração real sejam a tradução prática do Estado, da Sociedade e da Administração Pública modelados na Constituição.
Mas não se esgotam aí as incumbências do Presidente da República. Por exemplo, a Constituição estabelece os princípios da separação dos poderes (Legislativo, Executivo e Judicial) e da interdependência dos mesmos. Quer dizer, ao mesmo tempo que a CR estabelece que os poderes não se sujeitam uns aos outros, obriga-os a se entenderem a se complementarem para que o Estado possa dar conta da sua obrigação principal que é a criação de condições para que todos cidadãos se realizem, se façam felizes. Compete ao PR vigiar para que nenhum dos poderes invada ou subjugue os outros, ao mesmo tempo que deverá trabalhar no sentido de evitar que trabalhem de costas viradas, antes abrindo canais de comunicação e de cooperação potenciadores das suas capacidades, a modos de conseguirem a realização prática da CR com os menores custos – económicos, políticos, financeiros e sociais.
Quando se fala da crise de valores que grassa na nossa sociedade; quando se fala da crise que abala as famílias; quando se diz que precisamos melhorar a nossa Administração Pública; quando há excessos das autoridades; etc., significa que há muito que fazer para que a nossa realidade seja tão linda como foi sonhada e plasmada na nossa Constituição e significa que o PR tem de fazer alguma coisa para ajudar a remover os eventuais emperramentos. Competirá ao PR trabalhar no sentido do fomento de sinergias, racionalização de normas, patrocínio e consolidação de altos desígnios nacionais, assumidos por todos e em cuja materialização todos se deverão envolver.
Quer isso dizer que o titular do órgão de soberania Presidente da República não pode ser qualquer um. Precisa conhecer muito bem a função (sua base, seus contornos e seus limites); deve ter um muito bom conhecimento da letra, do espírito e da filosofia da Constituição Política da República; deve ser um bom comunicador (escutar bem e fazer-se entender melhor); não ter qualquer tipo relação, com qualquer dos poderes, que, de algum modo, possa enfraquecer a sua posição de árbitro e moderador do sistema; deve ter um perfil sociográfico e uma rede de relações que lhe permitem não só harmonizar o funcionamento dos três poderes, como fazê-los se complementarem e participarem tanto na identificação como na realização dos altos desígnios nacionais.
Na hora de escolher, é mister que o escolhido seja um homem que conheça bem o Estado, a Sociedade, a Justiça e a Administração Pública que temos; que conheça bem os contornos do Estado, da Sociedade, da Justiça e da Administração Pública, plasmados na Constituição; e seja capaz de encontrar as melhores formas e vias a seguir, a modos de fazer com que o real (o que temos) se aproxime do ideal, buscando coincidir com o estatuído na nossa Constituição.
PARA QUE, CADA VEZ MAIS, O PAÍS REAL FIQUE MAIS PRÓXIMO DO SONHADO E PLASMADO NA CONSTITUIÇÃO.

Wednesday, July 20, 2011

A ELECTRA E A LEITEIRA

Tivera, em tempos, um contrato com uma pequena vacaria que se comprometera a me fornecer leite bom, 7/7 dias.

As coisas nunca correram lá muito bem, mas a senhora que geria a vacaria, mui respeitável, lá nos ia mantendo como clientes.

A páginas tantas, as quebras na qualidade do leite e no fornecimento atingiram tal proporção que chamámos a senhora à pedra.

Explicou-nos que (i) tinha problemas de incompetência entre os administradores da unidade; (ii) havia pastores que vendiam leite por fora e embolsavam o dinheiro; (iii) que havia uns marotinhos que, pela calada da noite, ordenhavam as vacas e fugiam com o leite; (iv) que havia uns clientes que recebiam leite e não pagavam; e que, imagine-se! (v) algumas vacas se mamavam durante a noite, reduzindo, por isso, a produção de leite.

Explicámos-lhe que lamentávamos muito a sua desgraça, mas que nenhuma das razões apontadas justificavam deixar de entregar leite aos clientes que cumpriam a sua parte no trato. Que (i) a incompetência dos administradores não podia ser considerada uma fatalidade, porque sempre poderia pô-los com dono (se não serviam como gestores que fossem fazer qualquer outra coisa, plantar batatas, o escambau); que (ii) a traição dos pastores poderia ser sanada com a recolha de provas e subsequente desligação dos mesmos (e que a relação de trabalho com os novos contratados devia ser mais flexível, a modos de, por exemplo, permitir a desligação dos infiéis); que (iii) para o caso do furto do leite, devia arranjar uns cães ferozes, chamar a POP e a Judiciária, e mesmo contratar um corpo de vigilantes; que (iv) em relação aos clientes relapsos devia cortar-lhes o fornecimento do leite e accioná-los na justiça para o pagamento das dívidas; e que (v) para o caso das vacas que se mamavam a saída seria umas “pescoceiras” e uns “barbitches” que as impedissem de se mamarem e de mamarem umas nas outras. Pareceu não gostar muito, mas ficou calada.

Porém, quando as coisas se agudizaram e a clientela se organizou para protestar contra o incumprimento reiterado do contrato por parte da vacaria, um dos administradores achou-se no direito de nos recomendar que em vez de protestar contra a vacaria o melhor que tínhamos a fazer era (i) esquecermos da incompetência dos administradores porque se eram mantidos lá por décadas e mais décadas devíamos presumir que seria por eles serem uns nec plus ultra, uns bambambans da gestão; (ii) vigiar os pastores que remavam contra a vacaria, vendendo leite por fora; (iii) convencer os miúdos que furtavam a leitaria a deixar de fazê-lo; (iv) a fazer uma manifestação contra os clientes que não estavam pagando o leite que consumiam; e que, na medida do possível, (v) devíamos colaborar com a vacaria para ajudar no controlo das vacas que se mamavam e mamavam umas nas outras.

Na altura, não mandei a administradora pastar, chatear à leviana da sua progenitora, ou ir lavar as suas partes, tendo em consideração que já tinha umas repas de cabelo branco e, principalmente, porque sou um cavalheiro.

Mas agora, aparece-me um administrador da empresa de electricidade e água com a mesma lenga-lenga. Que o melhor que os consumidores tinham a fazer era se manifestarem contra aqueles que furtam energia da rede, os que não pagam as suas contas em dia, os que, trabalhando na empresa, remam contra ela.

O administrador em causa tem já cãs e calva na cabeça mas não escapará a que o mandemos chatear à leviana e badalhoca da progenitora. Se se confessa impotente para resolver os problemas da empresa, devia era deixar o cargo para quem saiba e possa, indo trabalhar naquilo que percebe, plantar batatas, em último caso. Endossar as suas responsabilidades para os consumidores é que não. É o cúmulo da falta de vergonha na cara. Que monte armadilhas aos seus técnicos que fazem ligações clandestinas; que compre cão, apele pela PN, pela PJ, contrate um corpo de “Guarda-fios”; que contrate a empresa do Abner de Pina ou a do Mário Silva, ou ambas, para lhe cobrarem as dívidas difíceis; mas que, em relação aos clientes com contas em dia, só tem uma coisa a fazer – FORNECER ÁGUA E ENERGIA ELÉCTRICA DE FORMA INITERRUPTA E EM BOAS CONDIÇÕES DE USO. PONTO FINAL.

A ELECTRA não tem crédito junto dos fornecedores de peças de reposição; não tem crédito na banca; não tem crédito junto da ENACOL e da SHELL; não tem crédito junto da sociedade cabo-verdiana. E já estou a ver o espertalhão, na comunicação social, responsabilizando os clientes, os cidadãos, as associações pela regularização das suas relações com os credores. Haja saco!

Os clientes da ELECTRA deviam era exigir, aos accionistas da empresa, a imediata destituição do administrador ou administradores que, em vez de fazerem o que deve ser feito, passam o tempo empurrando os problemas com a barriga ou – E ESTA PARECE SER UMA NOVA TÁCTICA – endossando as responsabilidades aos clientes da empresa.

Thursday, July 14, 2011

MUITOS SERÃO CHAMADOS, MAS SÓ UM FICARÁ

Reza a Bíblia (Mateus, 22:14) que muitos serão chamados, mas poucos serão escolhidos. E a parábola explica muito bem porque uns são escolhidos e outros não.


Para a eleição presidencial do próximo dia 07 de Agosto (dia de S. Caetano) chamados estavam todos os cabo-verdianos com mais de 35 anos de idade que estivessem no pleno uso dos seus direitos cívicos e políticos. Atenderam ao chamado Jorge Carlos de Almeida Fonseca e o grupo de nacionais que o apoiam; Aristides Raimundo Lima e seus apoiantes; Manuel Inocêncio Sousa e seus apoiantes; David Hopffer de Cordeiro Almada e seus apoiantes; e Joaquim Monteiro e os seus apoiantes.

A redução começou bem cedo.


1. David Almada e seus apoiantes deixaram de ter um projecto próprio. Não tendo conseguido o apoio do seu partido (o PAICV), desiste da corrida, deixando muita gente na corrida para granjear o seu apoio (pessoal e do grupo que o incentivava);

2. Jack Monteiro e o «seu povo» parecem ser os próximos a deixar a corrida. Sem um projecto presidencial, com um deserto de propostas para o Estado, a Sociedade e a Administração Pública, talvez nem garanta os votos dos subscritores da sua candidatura;

3. Manuel Inocêncio Sousa, candidato oficial do PAICV, não tem verbo. Mostra grandes dificuldades no discurso, deixando claro não ter participado da sua montagem. Foge aos despiques, não imaginando que isso é a pior coisa que se pode fazer em uma campanha para a presidência da República. Os debates e a proposição de um estilo de exercício do mandato são as duas grandes «promessas» que se esperam de candidatos que não concorrem para governar, antes se disponibilizam para agilizar o funcionamento integrado e harmonioso das instituições da República, assumindo-se como guardião da Constituição, fautores da coesão nacional e fomentadores da realização dos grandes desígnios nacionais, maximé do Estado e da Sociedade plasmados na Constituição. Quem não convencer nesses aspectos não pode, não deve, chegar lá. E, pelo andar da carruagem – conquanto a afinadíssima máquina de campanha do PAICV ainda não tenha atingido a velocidade de cruzeiro – estou em crer que Inocêncio deixará a corrida no dia 07 de Agosto;

4. Aristides Lima e Jorge Carlos Fonseca disputarão uma renhida segunda volta. Qual das duas candidaturas será um mal menor para José Maria Neves, seu Governo e pessoal da Lista J, alargada? Aristides Lima, QUE SE GANHAR, terá os seus Generais, em pouco tempo, disputando a liderança do partido a JMN? Ou Jorge Carlos Fonseca, que pode permitir a JMN dizer, com propriedade, «MEUS SENHORES, ESTRAGARAM TUDO COM A VOSSA ATITUDE; AGORA VAMOS A CONGRESSO REVERIFICAR A LEGITIMIDADE PARA DIRIGIR O PARTIDO»? Uma eventual e inusitada aposta de JMN em ARL, seria entregar-se de bandeja aos adversários e a confissão de que falhou estrondosamente na frente interna (do partido, leia-se); enquanto que apoiar o amigo JCF, um democrata leal, um fervoroso defensor da ordem constitucional e que não tem contrapartidas a pagar pelos apoios recebidos, significa poder renovar o partido, rectificar a correlação de forças existente internamente, traduzir isso na nova composição dos órgãos nacionais e dos regionais de maior expressão, continuar a governar sem sobressaltos e, sobretudo, encarar o desafio presidencial já em 2016. A minha aposta vai no sentido de que JMN deixará cair ARL. Não com uma declaração aberta de apoio, nem com instruções públicas de sentido de voto, mas com uma eloquente liberdade de voto aos seus indefectíveis e apoiantes da candidatura de MIS.

5. E assim, dos muitos chamados, só restará JORGE CARLOS DE ALMEIDA FONSECA, eleito, democraticamente, Presidente da República das ilhas de Cabo Verde (e da sua indissociável Diáspora).

(PARÊNTESE) Pessoalmente - se fosse candidato e estivesse na situação privilegiada em que o ZONA se encontra - daria garantias a Carlos Veiga e a José Maria Neves de que estaria interessado em apenas um mandato, a ser exercido de forma magistral e pedagógica, a modos de servir de referência para o futuro. Assim agindo, contaria, a um tempo, com um apoio mais entusiástico, mais real e mais aguerrido, da máquina de campanha e dos «soldados» do MpD (tem-no já dos Generais); e garantiria o apoio de JMN no segundo turno. Quitação antecipada. Mas eu sou eu, um blogueiro, pouco menos que anónimo, que se atreve a pôr-se na pele de um presidenciável; e ZONA é um político com quilómetros nas pernas e um cérebro de eleição, contando, ainda, com um corpo grande de conselheiros bem batidos nestas andanças.

6. E todos viveriam felizes… até às chamadas para 2016. No atendedor, duas figuras fundamentais: CARLOS ALBERTO WAHNON DE CARVALHO VEIGA e JOSÉ MARIA PEREIRA NEVES. Mesmo que só estes, e respectivos apoiantes, atendam ao chamado, só um restará. Mas isso são contas de outro rosário. Até lá.

Wednesday, July 13, 2011

NOVO MEIO DE PAGAMENTO PARA A ELECTRA

E se decidisse pagar as minhas contas de água e energia eléctrica com vales-combustível? Se, de posse da factura da ELECTRA, me dirigisse aos escritórios da ENACOL e adquirisse o valor da minha conta em Fuel oil e Gasoil e fosse fazer a quitação nos balcões da empresa de electricidade e água? Vales-combustível pelo consumo mensal de água e energia!
E se o pessoal da minha rua decidisse me acompanhar nesse protesto sui generis, entregando nas Tesourarias da ELECTRA vales-combustível pelo consumo mensal de água e energia?
E se a torcida de “Os Travadores” (os Índios da Capital) se juntassem a esse movimento inédito e inusitado?
E se os capitalinos – indubitavelmente, as maiores vítimas das ineficiências, da ineficácia e da inefectividade da ELECTRA – resolvessem pagar o consumo mensal de água e energia eléctrica com vales-combustível?
Seria o bom e o bonito ver a confusão que se geraria na empresa. Cortar o fornecimento a todo o mundo? Impensável! Afinal, os cortes “habituais” não são justificados com a falta de dinheiro para comprar combustível? Como justificar, então, corte de fornecimento a pessoas que decidiram em pagar em espécie, utilizando exactamente aquilo cuja falta vem sendo apontado como razão para os cortes?
Porque cargas d’água pensa um fulano numa saída dessas? É que um fulano, um consumidor - que seja também titular de umas obrigações da ELECTRA – no mês de Junho, quando os cortes eram justificados por falta de dinheiro para comprar combustível, viu cair na sua continha o valor dos cupões das obrigações da ELECTRA, entretanto vencidos. Na hora certa! Quer isso dizer que os compromissos com um fulano, enquanto titular de obrigações, são respeitados religiosamente, o mesmo não se dando em relação ao fulano, enquanto consumidor. Conclusão legítima ou não?
Bem… Se as coisas estão assim por ocasião do pagamento de uns cuponzinhos vagabundos (uns juros à volta dos 6%), o que acontecerá quando chegar a hora de devolver o capital aos credores dos empréstimos obrigacionistas? E isso está aí chegar, depois da curva, em relação aos empréstimos a 5 anos. Haverá, na ocasião, dinheiro para pagar as obrigações e para comprar Fuel oil e Gasoil? Quem será sacrificado, o consumidor ou o credor? Na lógica do que tem acontecido, acontecerá um apagão e tanto. Unless…
A não ser que
… comecemos, desde já, a pagar as contas com vales-combustível. Não vá o diabo tecê-las…

Wednesday, July 6, 2011

SEM PANINHOS QUENTES

“Eu nunca erro e raras vezes me engano.”ANÍBAL CAVACO SILVA

Não compreender que um fiel escudeiro sucumba à necessidade de agradar ao seu cavaleiro, ainda que, para isso, tenha de distorcer a realidade, é levar as coisas para um campo onde não se toleram sonhos, devaneios, ilusões. Não esquecer que esse campo fértil – lúdico para o comum dos mortais, mas realidade para uns tantos pajens e quejandos – permitiu a Cervantes tecer uma das mais belas peças da literatura ibérica e mundial. Quem não ouviu falar de D. Quixote de La Mancha, do seu fiel escudeiro Sancho Pança e da sua amada Dulcineia? Os cavaleiros contra os quais D. Quixote lutava não eram senão moinhos de vento? Dulcineia só existia na realidade particular do cavaleiro? Que importa? Para agradar o amo, Sancho Pança deixa tudo e embarca na doce e mansa loucura do amo.
A pergunta que faço é «Porque não contemporizar, também, com os devaneios e distorções da realidade do fiel escudeiro de D. José Maria? Importará o facto de eu nunca ter sido militante do MpD se isso der um jeitinho para incrementar umas loas ao amo e ao protegido do amo? Importará o facto de os mpdistas considerarem que, enquanto cronista, fui mais duro com os Governos do MpD de que com os de JMN? Importará o facto de ser um homem realizado, e, por isso, livre de embaraçantes laços, comestíveis e não só? Importa que eu seja reconhecido como o homem que «mata o bicho e mostra o pau?» NÃO. O que importa é a realidade virtual e o desejo de fazer-me passar por alguém que procura algo para si e para os seus. É preciso agradar ao amo e senhor. Mas entra na cabeça de alguém (que não esteja senil, nem obcecado) que alguém que queira algo do poder confronte – como tenho confrontado – José Maria Neves e Carlos Veiga, as duas pessoas mais vocacionadas para dar cartas por aqui? A verdade é que a minha militância pela Praia e por Cabo Verde; a minha coerência e coragem de dar o nome aos bois; e a peculiaridade de não deixar que uma posição adoptada ontem, inquine minhas posições de hoje e/ou no futuro; incomodam. Eu sei disso! Mas fazer o quê? Eu sou assim. Parodiando uma modinha brasileira da segunda metade do século XX, costumo cantar

«EU, SOU EU

CABO-VERDIANO, CASADO, MAIOR

QUEM QUISER QUE ME FAÇA OUTRO

SE É CAPAZ DE FAZER MELHOR».
Quando JMN tremeu na base ante a primeira vaga ofensiva de Veiga, chamei a atenção dele para o facto de não haver razão para estar no estado em que encontrava e que ainda podia dar a volta por cima. E acredito que ele deu a volta por cima mais pela minha sacudidela do que pelo lustro dos seus flanelinhas. Quando fiz a minha declaração de voto nas legislativas fiz questão de sublinhar que o meu sentido de voto, a favor de JMN, não significava que ele fosse algum nec plus ultra, mas apenas que o seu projecto era o menos mau para Cabo Verde, no momento. Quando levantei a voz e assumi a dianteira da luta contra a eventualidade de Veiga ou Neves virem a servir de barriga de aluguer para o Primeiro-ministro da VIII Legislatura, movia-me – como sempre – a defesa dos sagrados interesses de Cabo Verde e de suas gentes. Eu sou assim. Guia-me a coerência. E não me preocupa absolutamente nada que ora me colem ao MpD, ora me colem ao PAI. Quando as minhas posições coincidem, pontualmente, com as de qualquer destes partidos fico feliz. E sabem porquê? Porque sinto que não estou sozinho; que há pontos de convergência; e que, em havendo pontos de convergência, não será de todo impossível gerir as sinergias e construir um tremendo consenso à volta de questões em que estamos condenados a nos entendermos.
E agora, quando a questão presidencial ocupa todos os cabo-verdianos, não se vá querer comprometer-me. É tarefa votada ao insucesso. Tenho uma posição clara e que pode se resumir em três pontos, a saber:
1. Não voto Manuel Inocêncio Sousa (MIS) por não lhe reconhecer qualidades para ser um bom Presidente da República – não parece preparado, não tem discurso, não se disponibiliza para a sabatina e não dá garantias de se constituir em guardião da Constituição da República, base e limite dos poderes;
2. Não voto Aristides Lima por razões meramente conjunturais. Integrou um processo de luta pelo poder dentro do PAI, havendo um enorme risco de levar essa contenda intestina para a Presidência da República. E tendo as coisas chegado ao ponto a que chegaram, entre o candidato oficioso do PAI e o Presidente do partido, o facto de JMN ter dado o primeiro carro da escuderia para MIS vai estar sempre entre os dois. Sendo um deles já Chefe do Executivo, importará evitar que o outro chegue a Chefe de Estado. Para bem de todos e felicidade geral da Nação;
3. E VOTO Jorge Carlos Fonseca, ZONA, porque ele me enche as medidas – passa pelo crivo montado para escolher o melhor candidato; tem mente aberta e um bom discurso; é articulado; não foge à sabatina, antes deseja-a; e mostra-se capaz de ser um bom Presidente: sapiente e com as condições todas para exercer uma magistratura de influência com ampla abertura de espírito, liberdade e autonomia.
Mas respeito quantos tenham opinião diversa da minha. E mais: a opção por um candidato não significa que esteja vaticinando a vitória de tal candidato. Significa tão-somente que me disponibilizo para o bom combate a favor de tal candidato, apostando o «JOCKER» para o tornar vencedor. Nós, os democratas, somos assim. Fazer o quê?
Detalho, abaixo, as razões porque não voto nenhum dos dois candidatos do PAI e porque defendo o voto em Jorge Carlos Fonseca, ZONA.
Ei-las, SEM PANINHOS QUENTES :
1. Manuel Inocêncio Sousa, se chegasse a ser Presidente da República, na actual conjuntura, levaria a que a Constituição se transformasse em um limite tão elástico que não se constituiria em limite nenhum ao Executivo;
2. A relação de MIS com JMN nunca chegaria a ser aquela parceria institucional que se deseja, já que as parcerias exigem que ambas as partes se mantenham erectas, sem subserviência de uma em relação à outra;
3. MIS foge aos debates, não porque não é jurista, como peregrinamente se quer fazer crer; foge porque não está preparado para os debates. Não é páreo para um Jorge Carlos Fonseca, nem – manda a verdade que se diga – para Aristides Lima;
4. Aristides, conquanto pilote o segundo carro do PAICV, tem mais pedalada que Inocêncio, mas tem contra si o facto de poder levar para a Suprema Magistratura da Nação a guerrilha que dá ânimo à sua candidatura;
5. Aristides, enquanto animador da briga de galos para o apetecível poleiro de José Maria Neves, não é uma boa opção, por poder levar longe de mais o seu desagravo em relação a JMN, fazendo perigar a estabilidade das instituições;
6. Ninguém acredita numa coabitação pacífica e frutífera, para Cabo Verde e para os cabo-verdianos, entre Aristides Lima e José Maria Neves, o que chama a atenção para o candidato Jorge Carlos Fonseca, ZONA;
7. Jorge Carlos Fonseca, ZONA, é, claramente, a segunda escolha de José Maria Neves, que vê nele um parceiro mais leal, mais transparente e mais democrático, do que Aristides Lima;
8. Jorge Carlos Fonseca tem todas as condições para assumir o papel de guardião da Constituição, fazendo com que ela funcione como base e limite dos poderes, sem a subserviência de Inocêncio, nem a animosidade de Aristides;
9. O académico Jorge Carlos Fonseca que levou Cabo Verde a integrar o Conselho de Segurança das Nações Unidas e a presidir o, sem dúvida, mais poderoso órgão da ONU, tem o arcaboiço e os contactos internacionais para ajudar JMN a conduzir aos mais altos patamares a nossa pátria amada, Cabo Verde;
10. Jorge Carlos Fonseca, ao contrário de Manuel Inocêncio e de Aristides Lima, não é instrumentalizável, o que lhe permite a máxima abertura, liberdade e autonomia na Chefia do Estado cabo-verdiano.

Que se registe para a posteridade que:
a) Defendo o voto em Jorge Carlos Fonseca porque ele é um excelente candidato e tem tudo no lugar para ser um excelente Presidente da República e um muito bom parceiro para José Maria Neves;
b) O que faz com que pessoas do próprio PAICV não escolham Manuel Inocêncio de Sousa para candidato não tem a ver com o facto de não ser jurista. É porque não vêm nele alguém capaz de exercer uma magistratura de influência, de fazer com que a Constituição se afirme como base e limite dos poderes, e que quer entrar mudo e sair calado de um pleito destes ;
c) Aristides Lima, candidato número 2 do PAICV, deixou de ser uma boa opção, ao enveredar pelo caminho de açular apetites em relação ao cadeirão de José Maria Neves, dando indicações de que manteria um tal comportamento se chegasse à suprema Magistratura da Nação. Ora isso é coisa que tem de ser esconjurada. Cabo Verde precisa de estabilidade, precisa de um Chefe de Estado que seja árbitro do sistema. E quem participa de um jogo que visa apear o Presidente do seu Partido e, por inerência, Chefe do Executivo, não pode chegar à Suprema Magistratura da Nação ;
d) Pessoalmente, ficaria inchado de orgulho tendo à frente dos destinos de Cabo Verde, na actual conjuntura, a dupla Neves/Fonseca.

Por tudo o que ficou dito, declaro a minha decisão de votar JORGE CARLOS FONSECA e sugiro aos democratas nacionais que busquem conhecê-lo melhor, para nele votar, EM SÃ CONSCIÊNCIA.