Thursday, December 24, 2009

QUESITOS PARA A AVALIAÇÃO DA SITUAÇÃO DA ELECTRA

1. PASSIVOS
Qual o seu montante?

2. REDES DE DISTRIBUIÇÃO
Quanto custará o seu update ou substituição?

3. DÍVIDAS DE CURTO PRAZO
Qual o montante?

4. CRÉDITO
Ainda tem crédito junto da banca e das petrolíferas?

5. QUESTÕES LABORAIS
Qual a situação? O contencioso antigo está resolvido?

6. INEFICIÊNCIAS
Há algum plano para sua superação? Existe vontade?

7. GESTÃO
Como é avaliada? Haveria continuidade?

8. CREDIBILIDADE
Qual a credibilidade da empresa? E o rating*?

* O rating é uma opinião sobre a capacidade e a vontade de uma entidade vir a cumprir, de forma atempada e na íntegra, determinadas responsabilidades. (definição da CPR,SA.)

Wednesday, December 16, 2009

BOM NEGÓCIO, PÉSSIMO INVESTIMENTO

“O bom senso é o que há de mais bem distribuído no mundo, pois cada um pensa estar bem provido dele.” RENÉ DESCARTES

O que é um bom negócio nos tempos que correm?
Ter um bom negócio, em qualquer tempo, é ter monopólio exclusivo de produção, importação e distribuição de um bem essencial - ou de um bem de que todo mundo (ou muita gente) precisa ou não pode passar sem - com dispensa de cumprimento das obrigações fiscais.
Por exemplo, ter o monopólio da produção, importação e distribuição de tabaco manipulado em cigarros, mesmo havendo obrigações fiscais a cumprir é um excelente negócio. Outro exemplo elucidativo, seria a detenção de monopólio de importação, produção e distribuição de cigarros + bebidas alcoólicas, ainda que se tenha de pagar impostos sobre os lucros. O monopólio de produção, importação e distribuição de géneros de primeira necessidade (seja o que for que isso signifique) é outro grande exemplo de bom negócio. O monopólio da produção, condução e distribuição de água e energia eléctrica é outro negócio da China, se tivermos presente que ninguém pode passar sem estes bens essencialíssimos e que caso alguém se esqueça de pagar, há um remédio santo para a amnésia selectiva – corte do fornecimento.
No fundo, bom negócio significa ter um produto que todo mundo (ou muita gente) precisa; não ter concorrência de ninguém; poder ditar os preços; ter obrigações fiscais mínimas ou passíveis de ser repercutidas ao consumidor.
Nesta ordem de ideias seriam bons negócios:
1. A EMPA, nos tempos do monopólio de importação e distribuição de bens essenciais;
2. A SCT, enquanto durar a Convenção de estabelecimento que lhe outorga monopólio exclusivo na importação, produção e distribuição de cigarros;
3. A ELECTRA, enquanto perdurar o controlo absoluto sobre o mercado de água a granel e energia eléctrica;
4. A TRANSCOR, dos tempos do monopólio do mercado de transportes colectivos urbanos de passageiros;
5. Os voos domésticos dos TACV, com monopólio absoluto do mercado interno de transporte aéreo e liberdade para praticar preços de mercado;
6. A CVTELECOM, a SITA, blá, blá, blá, etc., etc. .

Haverá mais exemplos? Talvez. Mas creio que estes chegam. A questão é saber onde e como estão agora estes provedores de bens e serviços em condições que até o diabo gostaria de ter.
A EMPA foi liquidada em 2001/2002 – tendo perdido o monopólio, não conseguiu se encaixar no novo quadro concorrencial, perdeu o Norte e aconteceu a derrocada.
A SCT parece estar bem e recomendar-se. Esteve melhor sob a gestão de Jorge Benchimol, mas aguenta-se bem. A curiosidade é ver como se aguentará em regime concorrencial, quando expirar o prazo de validade da Convenção de Estabelecimento assinado com o Estado de Cabo Verde. Garantindo a qualidade dos produtos que fornece e mantendo uma boa gestão, sobreviverá.
A ELECTRA está de rastos, apesar do monopólio e apesar de comercializar bens que todo o mundo precisa e que ninguém pode passar sem. Explicação: para além daquelas que o cidadão comum não consegue imaginar, haverá as clássicas INEFICIÊNCIAS (perdas nas redes de água e de energia para lá do razoável); a MÁ GESTÃO do dossier dívidas dos consumidores; a PÉSSIMA GESTÃO das questões laborais; a inexistência de uma LIDERANÇA efectiva; a manifesta incompetência na gestão do dossier FURTO DE ENERGIA ELÉCTRICA; a EXPLORAÇÃO DA BOA FÉ dos clientes; a tremenda FALTA DE RESPEITO para com os clientes; a cínica AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE SOCIAL; enfim, uma gestão que não dignifica ninguém.
A TRANSCOR desapareceu ainda antes de surgir a concorrência. Teve que ser encerrada. A qualidade da gestão deve ter deixado muito a desejar.
Os voos domésticos dos TACV não deram o que tinham a dar, mercê dos preços sociais utilizados na comercialização dos bilhetes. Sem uma rede confiável de transportes marítimos de passageiros inter-ilhas, sobrou para os TACV: teve que garantir as ligações com preços subsidiados. Caindo os subsídios e tendo uma gestão irresponsável em matéria de gestão de efectivos, a empresa quase sucumbiu (ou terá já sucumbido?) à superpopulação do seu quadro de pessoal e a decisões questionáveis.
A CVTELECOM parece que está melhor agora que labora em um ambiente concorrencial. Consequência de uma boa gestão, certamente. O mesmo se dirá da SITA.
Os ETCÉTERAS ou estarão bem, como a SITA e a CVTELECOM; ou estão pelas ruas da amargura, como a ELECTRA; ou fecharam já as portas como a TRANSCOR e a EMPA. A SCT ficará bem se continuara a apostar numa boa gestão.
Depois deste pequeno sobrevoo pelos negócios que tinham tudo para ser bons e se confirmaram mesmo bons, empresas que falharam, pura e simplesmente, e negócios que podem melhorar se a gestão for mais ousada, que conclusões tirar? Em meu entender, ficou claro que, para além das condições intrínsecas do negócio, é preciso haver uma BOA GESTÃO. Nem os monopólios resistem à MÁ GESTÃO.
E isso conduz-nos ao segundo termo do paradoxo BOM NEGÓCIO/MAU INVESTIMENTO. A CVTELECOM, a SITA, a SCT, o INPS, a SHELL, a ENAPOR e outros que tais são bons negócios e bons investimentos. Recomendam-se. A ELECTRA, os TACV e outros como esses são bons negócios, mas péssimos investimentos.
O que muda de um grupo para o outro? RESULTADOS. Resultados potenciados por boa gestão. Não hesitaria em investir as minhas poupanças na CVT, na SITA, na SCT ou na SHELL; não investiria um ceitil meu que fosse na ELECTRA ou nos TACV. Pelo menos enquanto as coisas forem geridas como se sabe.
Então, porque cargas de água haveria o INPS, de todos nós, de investir na ELECTRA? O INPS, habitualmente, até investe bem. Vejam-se os investimentos feitos na CVTELECOM e na CAIXA ECONÓMICA. Porque será que, agora, o pessoal resolve dar uma «calaca» tamanho XXXL? Desorientação? Necessidade do Governo socorrer a ELECTRA sem afectar o equilíbrio da contabilidade social? Brio de quem não sabe o que fazer com o dinheiro?
Aceito que alguém que tenha excesso de liquidez, e não saiba o que fazer com o dinheiro, tenha manifestações suicidas de brio. À condição de se tratar de dinheiros próprios. A questão é que os dinheiros do INPS não pertencem aos decisores, sejam eles o Conselho de Administração do Instituto, a Ministra das Finanças, a Ministra da Economia, o Ministro da Saúde, o Primeiro-ministro ou o próprio colectivo do Governo da República. Os dinheiros do INPS pertencem aos trabalhadores cabo-verdianos.
A cada mês, o trabalhador confia ao INPS 8% do seu ordenado bruto e o seu empregador 15%; portanto, a cada ano, o colectivo dos trabalhadores cabo-verdianos confia ao INPS 8% dos ordenados auferidos durante o referido período e os patrões entregam ao mesmo organismo 15% do total dos ordenados pagos no ano de referência.
Cada bom investimento do INPS - na CVT, na CECV, etc. – é o dinheiro dos trabalhadores cabo-verdianos abrindo chances de crescer e, quiçá, multiplicar-se; cada mau investimento do INPS – na ELECTRA, nos TACV, etc. – é uma grande possibilidade do trabalhador ver seu dinheiro se derretendo nas fornalhas dessas empresas, qual consumidôr di nhâ Bedja fiticêra.
De lembrar, ainda, que os salários e demais regalias, percebidos pelos administradores, e demais pessoal, do INPS, são suportados pelo dinheiro dos trabalhadores.
E chega! A decisão de aplicação do dinheiro de todos os trabalhadores de um país não pode ficar por conta de um Conselho de Administração, onde, inexplicavelmente, não pontificam nem os SINDICATOS, nem as CÂMARAS DO COMÉRCIO, INDÚSTRIA, AGRICULTURA E SERVIÇOS, enquanto representantes dos alimentadores dos cofres do Instituto.
Quem cala consente. Ficar calado, quando o investimento é bom e multiplicador, é uma coisa; coisa muito diferente, seria ficar calado diante da iminência de um mau passo: a entrada do INPS (de todos nós) como accionista da ELECTRA.
Diante dos sinais tenebrosos que soam por todo o lado; perante a ameaça de comprometimento da velhice de muito boa gente; ciente aos alertas que vêm de todos os quadrantes; necessário se torna que todos juntemos as nossas vozes à dos demais trabalhadores cabo-verdianos e apelar em uníssono:
- ALTO AÍ. É PRECISO OUVIR OS TRABALHADORES, OS DONOS DO NEGÓCIO, E DECIDIR EM CONFORMIDADE COM O QUE DECIDIREM.
Os Conselhos de Administração não devem, não podem, ter mais força de que os accionistas; toda e qualquer actuação do CA que exorbite do mandato natural ou que não encontre eco nos accionistas configura um golpe de força, que pode, e deve, ser punido com a rescisão dos contratos dos titulares.
É chegada a hora da verdadeira CONCERTAÇÃO SOCIAL: SINDICATOS E PATRONATO DE TODO O CABO VERDE, UNI-VOS. E briguem para que, de agora em diante, tenham representantes vossos nos órgãos sociais do INPS.

Thursday, November 5, 2009

PORQUE SERÁ?!!!

“Se você quiser ser abundante e rico, precisa ter uma mente aberta, uma realidade flexível e a habilidade de transformar ideias novas em empreendimentos concretos e lucrativos.”ROBERT T. KIYOSAKI
Ele voltou /O boémio voltou, novamente /Partiu daqui tão contente / Porque razão quer voltar. Acontece. O boémio, da canção imortalizada na voz forte e cheia de Nelson Gonçalves, não resistindo às saudades da boemia, regressa à dolce vita. Apesar de gostar muito da mulher que escolheu para sua companheira, é da boemia que ele gosta mais. Então, o boémio da canção abraça-se ao seu violão, despede-se da mulher e regressa à boa vida. E qualquer um pode, também, mudar de ideia. Desde que tenha ideias, é claro. Mesmo que se tenha partido por causa de algo que se queria muito (una bela dona, uma aliciante carreira, a suprema magistratura da nação). É que há amores e amor, e há sempre o amor dos amores, isto é, há amores que com a separação ganham uma força apelativa absolutamente irresistível. Curioso é o facto de as pessoas terem sempre alguma (por vezes, muita) resistência em aceitar isso. E começam a ver chifre em cabeça de cavalo.
Este intróito vem a propósito das questões e das desconfianças suscitadas com o regresso de Veiga à liderança do MpD. Porque voltou? O que estará por detrás do seu regresso?
Voltou, diante do chamado dos militantes e amigos do seu partido e perante a iminência de um adiamento sine die do regresso do MpD ao poder. Regressou, porque não podia continuar a se fazer de morto, vendo seus «órfãos» fazendo a travessia de deserto, sem prazo para chegar «ao leite e ao mel» em abundância. Terá voltado atrás diante da impossibilidade de ficar quedo e mudo vendo a escolha do futuro chefe do «seu» Movimento se resumir à escolha de um mal menor. Arre! Até Moisés voltaria atrás se visse que o povo de Deus considerava a opção por Josué e Caleb, seus sucessores, como mal menor, solução de último recurso: entre continuar a travessia do deserto sem líder e fazê-lo tendo à frente uma figura qualquer, agarra-se à figura que se disponibilizar. Acho normal que um tal cenário tenha feito com que Veiga voltasse.
Mas, pode-se, e deve-se, colocar outra questão. Simples: É SÓ ISSO? O que nos leva à segunda questão que a comunidade nacional se tem posto: O QUE ESTARÁ POR DETRÁS DO SEU REGRESSO? Êta povo desconfiado! Não chega o facto de ter acudido às preces daqueles que se desesperavam por terem de optar entre Santos e Livramento?
Mas terão razão aqueles que acham que a decisão de Veiga terá sido determinada por algo mais do que a mera obrigação de pai-fundador? Ele, que tinha partido daqui tão contente, porque (outra) razão quis voltar? Normalmente, as grandes decisões têm, por detrás, uma condição necessária e outra suficiente. E se se considerar que as situações referidas atrás constituem apenas a condição necessária, necessário se torna que se questione qual terá sido a condição suficiente. E qual terá sido, então, a condição suficiente? Alguém será capaz de afirmar, categoricamente, qual foi? Claro. Responde pelo nome de Carlos Wahnon Veiga. Mais pessoas? Ná! Nosotros só podemos especular. Ou maldizer. Pessoalmente, situo-me entre aqueles que preferem… especular.
Tenho por mim que conheço razoavelmente o homem e o político Carlos Veiga. Sempre que falo dele, me lembro do longínquo ano lectivo em que estudava o 4º ano dos liceus e do meu compêndio de Biologia. O livro, de capa negra, herdara-o eu do Orlando António dos Santos (esse mesmo, o nosso Orlandona); abrindo o livro descubro que ele pertencera antes a um tal de Carlos Wahnon Veiga. Desse primeiro «contacto» registei o seu gosto pelo uso da tinta preta: todas as anotações do livro eram nessa cor. Encontrara-o antes na condição de defesa lateral direito (camisa nº 2) do meu Sporting Club da Praia. Numa altura em que os estudantes alinhavam, na sua quase totalidade, na recém-fundada Associação Académica da Praia, eis que o Cacá Veiga (era assim que era referido na composição da equipa). Dizia-se que optara pelo SCP por causa do horário dos treinos e de umas cefaleias que o incomodavam (a Micá treinava ao meio-dia, altura em que o Sol era desaconselhado para quem sofria de dores de cabeça como o Cacá). Mais um mito urbano? Pode ser. Mas a explicação que correu de boca em boca foi essa. Mais tarde, já no pós-independência, ficou célebre a sua decisão de deixar o alto cargo de Procurador-Geral da República e, antes de deixar a trincheira da magistratura, dar uma de juiz cível, desenterrando e decidindo um bom número de processos cíveis. Diz quem sabe que, quando saiu, a situação na vara cível da Região Judicial da Praia quase que ficou estabilizada. Acompanhando de perto o seu percurso profissional, constatei ser ele o único cabo-verdiano que já foi Magistrado do Ministério Público, Magistrado Judicial, Presidente do IPAJ e Bastonário da Ordem dos Advogados.
Pode ser por causa desses pequenos nadas que consigo entender e, às vezes, até antecipar as posições de Veiga. Senti chegada a sua hora de voltar, e sugeri (meio a sério, meio a brincar) que fosse chamado. Foi chamado e atendeu à chamada; defendi que ele jamais se prestaria a ser barriga-de-aluguer de quem quer que fosse, e ele veio a público jurar que isso nunca lhe passara pela cabeça, por ser ética e politicamente inaceitável; disse, nas antenas da TÍVER e noutros locais, que ele era um líder suficientemente forte para dispensar Vices, e aí estão os acontecimentos a dar-me razão; previ a ressurreição da Comissão Permanente (aquilo a que chamo de «os homens do Presidente») e aí está ela; registei que com ele a oposição ao Governo seria bem mais consistente, não se satisfazendo em apontar o dedo, mas avançando contra-propostas e se posicionando como alternativa credível, e aí está a sua moção de estratégia a confirmá-lo; antevi a decisão da criação de um Governo-Sombra, e aí está ele; enfim, tenho falhado muito pouco quando se trata de prever as movimentações do político Carlos Veiga. Assim, de repente, só me lembro de ter falhado quando vaticinei a sua vitória no pleito de 2006. Mas, mesmo aí, não terei falhado completamente: ele ganhou na realidade que eu conhecia melhor – o território nacional.
Por isso, acho que posso tentar problematizar à volta da questão «O QUE ESTARÁ POR DETRÁS DO SEU REGRESSO». Para mim, a questão tem uma resposta muito simples. Do mais simples que se possa imaginar, se se conhecer razoavelmente o homem.
Mas as pessoas que têm um pé atrás em relação às pretensões de Veiga, lá terão as suas razões. É verdade que com Carlos Veiga o MpD dá uma forte guinada à direita. Não é menos verdade que ele tem bons, fortes e influentes amigos na área da alta finança internacional, sendo que muitos deles, directamente ou através de intermediários, têm interesses em Cabo Verde. É também verdade que ele, num passado recentíssimo, defendeu, numa moção de estratégia, a criação de uma classe empresarial próximo do seu partido (que era, então, o partido do Governo). Resulta, para muita gente, difícil de aceitar que Veiga abra mão de uma candidatura à Presidência da República (com enormes chances de sucesso), para concorrer à Chefia do Governo, um caminho recheado de escolhos. Tudo isso somado, pode, de facto, justificar as apreensões e as desconfianças de muito boa gente. Nos tempos que correm, em que nem sempre o que parece é, compreendem-se os medos, as reservas e as apreensões em relação ao regresso de quem partiu daqui tão contente e agora quer voltar.
O boémio confessa que volta às tertúlias porque não pode viver sem os companheiros de noitada, o violão e a ponta de um balcão e convence a amada que depois da boemia é dela que ele gosta mais. Acredito que as razões de Veiga não se afastam muito das do boémio da canção: convencido de que a Presidência da República era o amor da sua vida, deixa, no ano 2000, a chefia do Governo e avança para as presidenciais; passado algum tempo (menos de dez anos) e chegando à conclusão de que, de facto, não pode viver sem a adrenalina do exercício efectivo do poder, pega do seu «violão» e volta à conquista do lugar de Chefe de Governo. Entre ser mera figura decorativa e ter poder efectivo, entre ser a «Rainha da Inglaterra» ou «Gordon Brown», não tem dúvidas: escolhe o PODER efectivo.
E reforça-se, assim, a minha tese de que, no nosso sistema de Governo, o centro do poder deslocou-se para o Governo, mais concretamente para o Primeiro-ministro (quêl hómi qui tâ mánda nâ Cabo Verde, no dizer de uma jornalista da Televisão pública). É a consagração do chamado «PRESIDENCIALISMO DE PRIMEIRO-MINISTRO». Para um homem de personalidade forte como Carlos Veiga, que gosta, inequivocamente, do poder e que sente, ciclicamente, que tem a missão de salvar Cabo Verde, nada de mais natural que opte pela posição mais consentânea com a sua personalidade, sua apetência pelo poder e sua convicção de enviado com a missão de salvar a pátria. Essa posição, em Cabo Verde, e até mais ver, é a de Primeiro-ministro. O raciocínio atrás desenvolvido é também válido para José Maria Neves: não abriu (ele, também) mão da candidatura (natural) à Suprema Magistratura da Nação em favor de uma recandidatura à Chefia do Governo?
Resultam, portanto, perfeitamente normais, tanto a opção de Veiga, como a de Neves. A não ser que se saiba algo que não seja do domínio público, a não ser que alguém saiba de alguma ligação, digamos, perigosa de Veiga a grupo (ou grupos) de interesses, a sua pretensão de voltar à Primatura é tão legítima (e normal), como a de JMN em apostar na revalidação do seu mandato de Chefe de Governo.
A mim, o que me daria um prazer enorme, seria poder testemunhar uma inequívoca manifestação de força dos protagonistas anunciados das eleições gerais de 2011: QUE INFLUENCIEM OS DEPUTADOS DOS RESPECTIVOS PARTIDOS A INCLUÍREM NO PACOTE DA REVISÃO CONSTITUCIONAL A ALTERAÇÃO DO SISTEMA DE GOVERNO, DO SEMI-PRESIDENCIALISMO FRACO (apelidado, também, de PARLAMENTARISMO MITIGADO) PARA O PRESIDENCIALISMO (caracterizado, essencialmente, pela eleição directa do Chefe do Governo e pela acumulação das funções de Chefe do Governo e de Chefe de Estado). Tal manifestação de FORÇA E PODER, conquanto possa deixar muita gente amuada, daria aos cabo-verdianos a oportunidade de participar, em 2011, de uma eleição presidencial de tirar o fôlego a qualquer um. E aqui fica o desafio a ambos: são os homens fortes cá da terra? Then, JUST DO IT.

P.S.: Soube-se agora que Veiga amaciou e acabou aceitando duas Vice-Presidências. Pode ser um bom prenúncio.

Thursday, October 15, 2009

REMODELAÇÃO 2009

GOVERNO DE CABO VERDE
REMODELAÇÃO 2009

I. -PRIMEIRO MINISTRO

II. - DEZ MINISTROS
1. Ministro de Estado e das ITT***
2. Ministro de Estado e da Saúde, Trabalho e Solidariedade Social***
3. Ministra da Reforma do Estado e da Defesa Nacional***
4. Ministro dos Negócios Estrangeiros***
5. Ministra da Economia e Finanças***
6. Ministra da Justiça e da Administração Interna**
7. Ministra do Desenvolvimento Rural e Pescas*
8. Ministro da Habitação, Cidades e Desenvolvimento Regional*
9. Ministro da Educação, Tecnologias, Ciência e Cultura*
10. Ministra-adjunta do Primeiro-ministro e da Presidência do Conselho de Ministros e Assuntos Parlamentares****

LEGENDA
* Novos titulares
** A anterior titular da JUSTIÇA
*** Mantêm-se no Governo
**** A anterior titular da P.C.M. e Assuntos Parlamentares


III. - SETE SECRETÁRIOS DE ESTADO
1. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-ministro para a Administração Pública e Valorização Profissional++
2. Secretário de Estado para a Família e a Solidariedade Social+
3. Secretário de Estado Adjunto do MNE+
4. Secretário de Estado da Economia+
5. Secretário de Estado das Finanças+
6. Secretário de Estado da Administração Interna+
7. Secretária de Estado para o Ensino Superior, Ciências e Tecnologias+

LEGENDA
+ Novos titulares
++ O anterior titular da Administração Pública

ACEITAM-SE PROGNÓSTICOS

Wednesday, September 2, 2009

AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA, JÁ!

A realidade cabo-verdiana, em matéria de abastecimento de combustíveis (líquidos e gasosos) é esta:
- A SHELL, a mais antiga e pertencente a uma família de empresas que é proprietária de poços de petróleo e tem uma forte penetração no mercado internacional do crude;
- A ENACOL, a mais recente, criada na I República como instrumento de viabilização de algum controlo sobre a SHELL;
- Mais recente, a ARE (Agência de regulação Económica) com a missão de regular o sector energético (e não só);
- A gritante inexistência de uma AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA.
A verdade é que a SHELL compra bem, mercê da sua firme e consolidade penetração no mercado internacional do crude e pode, querendo, ditar regras no mercado interno de combustíveis. E a ENACOL está singrando o caminho certo, mercê da experiência acumulada de mais de 20 anos e dos novos parceiros estratégicos presentes na empresa. A ARE, diga o que disser, está, como todo o mundo, a fazer um aprendizado. Que nenhuma Agência nasce pronta, mormente em uma realidade como a nossa.
Em função da nossa realidade temos uma empresa que consegue bons preços; uma segunda que segue a reboque, conquistando, a pulso, um lugar própro no mercado; e uma Agência de regulação que cai na esparrela de fixar preços máximos com base no valor de aquisição de uma delas (LEIA-SE DA QUE COMPRA MENOS BEM, que de outro modo não seria aceite por quem, de facto, dita as regras). Não existindo uma AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA, o nosso território, em matéria de preços de combustíveis, torna-se uma autênctica selva onde impera a lei do mais forte, que é como quem diz, a lei de quem tem a faca e o queijo nas mãos, que no caso, são as petrolíferas SHELL e ENACOL.
A inexistência da AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA faz emergir uma situação de crise a que urge pôr um fim. E o fim só acontecerá quando se tiver presente o que segue:
1. Sabendo que a SHELL e a ENACOL não compram combustíveis pelos mesmos preços, não pode ser determinado um PREÇO ÚNICO (ainda que preço máximo) de venda ao público. A razão é bem simples: o preço máximo é fixado na base do preço pago por aquele que compra «menos bem», o que tem desvantagens várias - enorme margem de lucros para quem comprou bem; desleixo na procura de mercados de aquisição; vitimização do consumidor, afinal quem suporta todos lucros e ineficiências das petrolíferas;
2. Tendo ciência de que inexiste uma AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA, a cartelização do sector resulta automática e informal, sendo de todo impossível a identificação de provas do crime;
3. A consciência de que, embora estejamos fazendo um aprendizado, quando as nossas acções e omissões prejudicam terceiros (e esses terceiros são todo um povo) é preciso agir com segurança (e amelhor segurança se encontra no estudo do direito comparado: lá fora onde se pratica o regime de preços máximos há uma AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA).
Então, e salvo melhor opinião em contrário (que as pode haver, sempre) a saída passa:
a) Pela fixação de preços máximos com base na melhor compra feita ou, em alternativa, um preço máximo por cada lote;
b) A urgente instalação da AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA;
c) Melhor relação entre a ARE e as parceiros.
Por isso, AUTORIDADE DA CONCORRÊNCIA, JÁ!

Wednesday, August 12, 2009

DIRECTAS.com.mpd

“A política foi primeiro a arte de impedir as pessoas de se intrometerem naquilo que lhes dizia respeito. Em época posterior, acrescentaram-lhe a arte de forçar as pessoas a decidirem sobre o que não entendem.” PAUL VALÉRY

Dizem-me que a história não se repete. Acredito, pois o rio que é o tempo histórico, como qualquer outra corrente, corre célere ao encontro do seu destino, sem a mínima chance de arrepiar caminho. Mas, quando penso nas virtualidades das eleições directas para determinados órgãos dos partidos, vejo os resultados obtidos pelo Filú a repetirem-se no match Jorge Santos/Carlos Veiga.
Porque, pelo menos à partida, se deve considerar que o presidente do partido tem o aparelho partidário na mão, à Rui Semedo; e afigura-se-me que Veiga, apesar de ser o pai-fundador do MpD, vai jogar «fora» no desafio que lançou ao Jorge, à Vieira. E aqui, de novo, vejo o aparelho com sérias dificuldades para se desdobrar o bastante para conseguir que Jorge Santos resista à investida do carismático (com selo de competência e provas dadas) Carlos Veiga. Vislumbra-se uma clara Vitória de Veiga sobre Santos, por um score parecido com o obtido por Vieira na vitória sobre Semedo, na disputa da liderança do Sector Autónomo de Santiago Sul (ou «Região Metropolitana da Grande Praia»).

Ficará por definir apenas o comportamento dos apoiantes de Santos durante a Convenção: manterão o seu apoio a Jorge ou migrarão para os lados de Veiga, obedecendo à velha lógica partidária cabo-verdiana, qual seja a de alinhar com quem tem o queijo e a faca na mão?

A ideia de que nos partidos – e um pouco por todos os sistemas humanos deste início de milénio – o mérito passa a ser a única moeda com curso legal, estabelece a necessidade de cada um demonstrar a sua capacidade para acrescentar valor ao seu partido. E nesse afã, pode-se perfeitamente laborar no erro de tomar Nuvem por Juno, que é como quem diz aceitar «aparência de mérito» como mérito.
Quer isso dizer que, na próxima Convenção ordinária do MpD, as pessoas, no afã de mostrarem a sua utilidade, mormente quando os méritos não forem evidentes o suficiente, podem optar por apostar na sua capacidade de apoio e de se mostrar útil, disponibilizando-se para servir o vencedor das directas. Trocado por miúdos, os rabentolas que não se tenham em boa conta, ainda que tenham sido apoiantes de Jorge Santos até à Convenção, poderão, na eleição dos demais órgãos, durante a Convenção, não disponibilizar seu apoio e seus votos ao candidato que apoiaram inicialmente, mas sim transferi-los para aquele que estiver montado na carne seca, ou seja o vencedor das directas. E está de ver que isso pode criar distorções terríveis de remediar na afirmação do Movimento enquanto Partido político.

Mas o problema maior nem é a vitória de Veiga, nas directas, fazer quebrar as eventuais bolsas de resistência ao seu regresso. O grande problema é o efeito que a derrota de Rui Semedo (do PAI) possa vir a ter nas hostes de Jorge Santos. E se nessa de se estar sempre no apoio à bica que pinga (que é como quem diz, daquele que tem alguma coisa a dar, sejam prebendas, tachos ou, simplesmente, lugares elegíveis nas listas) e no receio de uma derrota tão pesada quanto a imposta a Semedo, os apoiantes menos convictos de Santos migrarem para os lados de Veiga? Pode muito bem acontecer. E não seria nada bom para a democracia interna do MpD: a Convenção deste Outono deixaria de ser o espaço privilegiado de debate de ideias e de estratégias, para se transformar em mais um exercício de louvaminhas ao pai-fundador. E a oposição a Veiga, sem se poder afirmar formalmente, poderá, mais à frente, minar a gestão deste e contribuir para o prolongamento da travessia do deserto do Movimento que, em boa verdade, já vai longa. E aí, a ideia de Veiga-Salvador-da-Pátria pode ir para o ralo.

Sem pretender dar uma de «NHU NÁXU», acho que dá para prever novos dias, novas práticas, novo tipo de relacionamento nos partidos políticos, como consequência dos primeiros resultados de eleições directas para os órgãos dos mesmos.
Após um período de desorientação e pucha-saquismo inconsequente, cada militante que queira singrar no seu partido vai ter de arregaçar as mangas, ir à luta e conferir o valor de mercado do seu apoio, do seu voto. Em vez de pedinchar por um lugar numa lista, barganhará a sua colocação em um lugar condizente com o seu estatuto, este derivado do valor que é capaz de acrescentar à capacidade de mobilização do seu partido. Será o fim da era dos caciques políticos e das adesões na base da amizade (caso de Fulanos que entram no partido “X”, porque o amigo e/ou protector está lá ou entrou para lá; e saem do partido “X” e mudam para o “Y” porque o amigo ou protector saiu e fundou o partido “Y”); e o início de uma nova era, em que o fulano “A” entra no partido “X” porque subscreve e se reconhece nos manifestos, nos estatutos e, principalmente, no programa político do partido “X” e sai do seu partido após esgotar as vias de solução democrática das diferenças no seu partido; ou muda para o partido “Y” na base do manifesto político deste, do seu programa político e dos seus estatutos, os quais lhe garantem, à partida, uma maior democracia interna e uma melhor interpretação dos anseios do povo cabo-verdiano.

Em jeito de fecho, sugiro a máxima atenção na análise do comportamento dos militantes de base do MpD, diante de eventual repercussão dos resultados das directas do PAI na recomposição de forças à volta dos presidenciáveis do MpD. E diante disso, seria excessivo interpretar um eventual recuo de Santos (desistência tout court ou integração em lista única, dita de consenso) como consequência e extrapolação das directas no PAI que ditaram a pesadíssima derrota imposta a Rui Semedo e ao aparelho do partido que esteve incondicionalmente do seu lado?

De uma coisa, para já, estou certo: Veiga está mais tranquilo depois de confirmar que, em eleições directas, o mais popular «esmaga» qualquer um, mesmo que este detenha e/ou controle o aparelho partidário. Mas, a ver vamos.

Thursday, August 6, 2009

DIRECTAS.com.pai

“O mundo recompensa com mais frequência as aparências do mérito do que o próprio mérito.”

LA ROCHEFOUCAULD, FRANÇOIS


Esperei ver reacções à pouco menos que apoteótica escolha de Felisberto Vieira para Coordenador político do Sector Autónomo de Santiago-Sul do PAI, mas, até ao momento, não captei nenhuma leitura política aos resultados do pleito que opôs o delfim putativo de Pires ao homem de mão de José Maria Neves e do politburo do PAI, de seu nome Rui Semedo. A coisa talvez não tenha tido ressonância suficiente para atingir a África Austral, por onde andava a trabalho. Por isso, sugiro um pouco da história recente de Filú, do Rui e dos apoiantes de ambos.

1995
Na lista do PAI para o círculo eleitoral do Concelho da Praia, nas eleições legislativas de 17 de Dezembro desse ano, enquanto Rui Semedo era APENAS o segundo da lista de candidatos suplentes (abaixo de João Papá – hoje eleito Municipal na Ribeira Grande de Santiago na lista do MpD – e imediatamente acima de Marcos Fortunato Oliveira), Felisberto Vieira era SIMPLESMENTE o segundo homem da lista de candidatos efectivos (atrás, apenas, do Secretário-Geral do partido - Aristides Lima). Na ocasião, Filú só não chega à Segunda Vice-Presidência da Mesa da Assembleia Nacional porque Veiga, Gualberto e comandita se encarregaram de o vetar (que não tinha o perfil requerido, etc. e tal). José Maria Neves (JMN), que em tempos fora Líder da Juventude do PAI (a JAAC-CV), é proposto e aprovado para o cargo que estava destinado a Vieira – 2º Vice-Presidente da Mesa da AN.
E a história do PAI começa a mudar por essa altura. Do PAI e de figuras como JMN, Manuel Inocêncio, Basílio Ramos e Rui Semedo. Acontecerá, mais tarde, a projecção de figuras, de outro campeonato, (p.e. Cristina Fontes, Eduardo Monteiro, José Maria de Pina, etc.), mas isso são contas de outro rosário.
Neves tinha já dado indicações da sua ambição de vir a liderar e renovar o partido (vem-me agora ao consciente uma sugestão dele – muito comentada na altura - no sentido da mudança do nome do partido de PAI para PSD). Nada, no entanto, que fizesse acreditar que ousaria desafiar Pires. Eleito 2º Vice-Presidente da Mesa da AN, aproveita a oportunidade que o MpD lhe oferece e se torna a face visível dos renovadores do PAI, vindo a liderar a famosa lista J.
Vieira, sempre fiel a Pires, seu mentor político, assume a liderança do Grupo Parlamentar até à sua eleição, no ano 2000, para o cargo de Presidente da Câmara Municipal da Praia.
Ano 2000
Nessas eleições, para além de Vieira, também Neves e Ramos se elegeriam Presidentes de Câmara (de Santa Catarina de Santiago, aquele, e do Sal, este último). Semedo notabiliza-se com o programa que preenchia o tempo de antena do PAI – VOZ DA OPOSIÇÃO. Inocêncio fica na sombra: é a eminência parda da vaga reformadora do PAI, uma espécie de Olívio Pires dos tempos hodiernos. Pedro Pires está cumprindo os últimos meses da presidência do PAI. Por vontade própria. Porque se quer alcandorar à suprema Magistratura da Nação.
Este é o retrato do PAI no Ano de graça de 2000. Afinal, contra as previsões mais pessimistas, a Humanidade chegou e ultrapassou a barreira mítica que seria o último ano do século XX.
JMN, Filú e Basílio (os grandes vencedores das autárquicas de 2000) eram os dirigentes da Estrela Negra melhor posicionados para substituir Pires. Estando todos eles presos à promessa de que não abandonariam os cargos para que tinham sido eleitos, restavam Inocêncio e Rui. Este está ainda verde: aguerrido, mas com um deficit considerável de traquejo político; Inocêncio, avaliando a sua (pouca) popularidade, não se aventura. Não se coloca na berlinda, mas incentiva José Maria a dar o salto.
Mas havia, pelo menos, duas questões que clamavam por uma resposta pronta:
1) E a promessa de JMN aos eleitores de Santa Catarina (que, segundo ele, lhe habitavam o lado esquerdo do peito)?
2) E mesmo que os eleitores de Santa Catarina libertassem JMN da promessa, como convencer Pires e Filú a entregarem a JMN, de bandeja, a fortíssima probabilidade de se tornar o próximo Primeiro-ministro de Cabo Verde?
E aí a história do povo das ilhas, e do PAI, dá uma guinada pouco menos que histórica.
Primeiro, começam a chover na comunicação social (falada, escrita e televisionada) apelos à candidatura de JMN à presidência do PAI, numa orquestração perfeita. Depois foi a movimentação interna do PAI, tendo como centro a lista J, que incha até mais não. O apoio de Basílio é quase decisivo. E digo quase, porque o que fez pender a balança, definitivamente, foi a atitude de Pires: quando todo o Mundo (principalmente o Filú) contava com uma tomada de posição a favor de seu delfim, eis que o Comandante olha para os lados e segue assobiando «Sol, suor, o verde e o mar, séculos de dor e esperança». Sem muita esperança, ainda assim, Filú, vai à luta. Mas a lista F chega tarde e baqueia diante da lista J, liderada por um José Maria Neves que seguia se agigantando, crescendo, dominando… até à apoteose final, que foi a vitória, por maioria absoluta, sobre o encolhido MpD de Gualberto do Rosário.


2008
Do homem do aparelho do partido que fora, Felisberto vai-se tornando cada vez mais autarca e uma voz cada vez menos escutada e respeitada no PAI. Não raras vezes, por opção pessoal; muitas vezes, confinado pelos integrantes da tal panelinha que se foi formando, e se reforçando, à sombra do compadre José Maria.
Rui Semedo, Cristina Fontes, Eduardo Monteiro e José Maria de Pina despontam como os novos «homens» fortes do aparelho tambarina. Felisberto vai-se enroscando com os problemas da Capital, para cuja resolução não se havia preparado. Vez por outra, quando as coisas apertavam, lá se chamava o Filú para dar uma mãozinha numa campanha que ameaça descarrilar.
Associando a sua imagem a grupos de baixa extracção política e a oportunistas da política, convencendo-se de que seria para sempre o nec plus ultra do PAI e vencedor inveterado nas lides eleitorais, Vieira chega ao final de 2008 como um homem com o qual o aparelho do PAI já não contava.

2009
É aí que, inebriado pelo aparente descalabro do companheiro de partido, que a tal panelinha que gira à volta, e sob a sombra, de José Maria Neves resolve dar o golpe de misericórdia em Felisberto. O aparelho aposta todas as fichas em Rui Semedo, embandeira-se em arco e espera pelos resultados da urna para enterrar Filú, fundo e definitivamente.
Mas eis que das cinzas, qual Fénix renascida, emerge o Filú autêntico: o menino da Achada de Santo António, o tipógrafo da Imprensa Nacional, o jogador dos Travadores, o carismático e populista rei dos Comités de base do PAI. Fulgurante, sabendo que tinha de apostar o «jocker» nesta jogada - que poderia transformar-se na morte (política) do artista -, já sabendo que numa eleição está sempre presente a hipótese «derrota», Felisberto monta uma bela equipa e leva de vencida todo o aparelho partidário, brindando o Rui com um valente capote.

Moral da estória
Espera-se que desta «directa» se extraiam as devidas ilações: daqui para a frente, nos partidos políticos nativos, a importância relativa de cada militante passa a ser directamente proporcional ao valor que este acrescenta à dinâmica eleitoral do partido. Não mais cabeça de lista por ser um «próximo» do líder; não mais chefe de fila por fazer parte de qualquer panelinha; não mais «tachos» baseados em vassalagem política; também não mais «currais eleitorais», com votos garantidos por se fazer parte da entourage do chefe.
Chegou, pois, a era da MAIS VALIA: aqueles que arrastam multidões, que trazem votos para o partido, que reforçam a implantação do partido, que, enfim, acrescentam valor ao partido, esses ficam nos lugares cimeiros, encabeçam as listas nas eleições, ocupam cargos de destaque.
É também chegada a hora de os «agregados» começarem a arregaçar as mangas e ir à luta, à conquista de um lugar ao Sol; começar a ser equilibrista no arame político sem contar com a rede protectora de nenhum padrinho.
Chegou também a hora de aprender outras lições, como, por exemplo, saber escolher as companhias com quem se anda, pois lá diz o ditado: «DIZ-ME COM QUEM ANDAS, E DIR-TE-EI QUEM ÉS».

Monday, July 6, 2009

PRAIA – CAPITAL DA CULTURA

“Há grandeza nesta ideia de que a vida, com os seus diversos poderes, surgiu originalmente em escassas formas ou numa forma apenas; e de um começo tão simples, enquanto o planeta girava segundo as leis fixas da gravidade, evoluíram, e continuam a evoluir, formas tão belas e tão maravilhosas.”
Charles Darwin
Essa de Capital da Cultura deve ser rotativo. Umas vezes são uns fulanos do Norte a reclamar tal estatuto para a sua principal urbe; outras vezes são uns intelectuais do Sul a fazer a pronunciação. Que a Constituição, essa, só identifica a Capital política da República: A CIDADE DA PRAIA DE SANTA MARIA DA VITORIA.
Coube a vez, no último Sábado (o da vitória do Sporting Club da Praia sobre a Associação Académica da Praia) - na cerimónia de homenagem da Associação PRÓ-PRAIA ao vate ARMÉNIO VIEIRA, laureado com o prémio Camões de Literatura - ao edil praiense ULISSES CORREIA E SILVA de proclamar a Cidade da Praia como a Capital Nacional da Cultura. Falou, disse e sustentou. Muito diferente do que faz muito boa gente, que, acreditando que uma meia-verdade repetida vezes sem conta se transforma numa verdade inquestionável, insiste na asserção, mas não arrola nada em defesa da sua tese. Ulisses falou da efervescência cultural que tem testemunhado desde que chegou à Presidência da Câmara Municipal da Praia; falou dos performers, fotógrafos, pintores, escultores, poetas e dançarinos que têm animado a vida cultural da cidade; falou do teatro e de manifestações culturais populares; e falou da produção literária e dos prémios ganhos por fazedores de cultura da Praia e na Praia. O Presidente da Câmara Municipal da Praia fechou o seu pequeno improviso com um apelo aos praienses no sentido de não deixarem cair a peteca, a modos de manter a Praia, e Santiago, na crista da onda produção e vivência culturais, fazendo com que a nossa cidade continue a merecer o destaque conquistado na cultura nacional e a bem da nossa auto-estima.
A adjectivação (PRAIA CAPITAL DA CULTURA) feita pelo edil Correia e Silva foi vivamente aclamada pelos presentes. Ao lado alguém reclamou para a Cidade da Praia também o estatuto de Capital do Desporto, alegando que o facto de ela ser a sede da equipa vencedora dos três últimos campeonatos nacionais (o SCP) e de ter, agora, duas de suas equipas disputando, entre si, o título de Campeão de Cabo Verde em futebol, justifica tal estatuto.
De facto, como a Cidade da Praia só o Reino Unido, país de três das quatro equipas que chegaram às meias-finais da última Champions League.
A mim parece-me que o edil praiense sabia do que falava. À frente dele estavam, para além do homenageado Arménio Vieira, o Magnífico Reitor da Universidade Jean Piaget, o poeta Filinto Elísio, o intelectual sénior Anastácio Filinto, o Pró-Reitor da UniCV Ângelo Barbosa, e uma plêiade de intelectuais praienses, ressaltando-se a presença do jovem representante da irreverência intelectual cabo-verdiana Abraão Vicente.
A mim ficou-me só esta singela dúvida: ESTAMOS Capital da Cultura, por um período, rotativo, pré-estabelecido; ou SOMOS Capital da Cultura, para valer?
O questionamento registado atrás não é nada despiciendo. Havendo outros candidatos ao título, importará não só a consagração do vencedor como, também, a notificação do vencido. Para que se prepare par o próximo round.
Mas as novidades do dia não ficaram apenas por conta da vitória do Sporting sobre a Académica e da homenagem, mais que merecida, da PRÓ-PRAIA a Arménio Vieira. Eu LI, para os presentes, um poema (PARÁBOLA) de Arménio. Digo LER, porque não me atrevo a dizer que declamei, conhecendo os declamadores que conheço: Jorge Nuno PINTO DA COSTA (esse mesmo, o Presidente do FCP); o Danny Spínola; o senhor Filinto (o sénior). Aliás, dá para imaginar um prosador bárbaro, como eu, declamando um poema do doce vate Arménio Vieira?
E foi belo e magnífico ouvir o próprio homenageado, intervindo em meu socorro, declamar um poema seu, que lhe sugeri – DIDÁCTICA INCONSEGUIDA.

Tu nunca viste um homem
Subitamente triste
Ao descobrir um tesouro ou o paraíso
Ou alguém com dor no peito
E um gume encostado ao coração
Cuspindo riso pela boca
- Entretanto, ensino-te os caminhos
que não passam pela porta de ninguém
E dizes que sou louco.
Diante deste momento tão bom para a cultura cabo-verdiana (Cesária, Mayra e Tcheka, os prémios do poeta José Luís Tavares, o Prémio Sonangol de Literatura, este gostoso e suculento Prémio Camões, a inscrição da Cidade Velha como Património da Humanidade – sítio cultural de valor universal excepcional) não há como não lançar a questão: para quando o Nobel da Literatura?
Poderá não acontecer durante a nossa (minha e vossa) breve passagem por este vale de lágrimas, mas acredito que chegará o dia. Tomando o gosto pela coisa, alcançar o Nobel passa a ser uma mera questão de tempo. Que o cabo-verdiano é fogo. Em entrando, segue buscando o caminho para o centro da questão. Aliás, Corsino Fortes, num dos seus emblemáticos poemas, alertou já São Pedro (o caseiro do Céu) para a eventualidade de este vir a ter que enfrentar um golpe de estado no Paraíso, caso os cabo-verdianos escolham esse recanto bíblico como sua última morada.
Para que tudo fique em festa, cá registo um desafio: a Praia conserva-se Capital da Cultura até que alguém, de outra cidade, traga um novo Prémio Camões. Combinado? E o fim da rotatividade acontecerá quando trouxermos o Nobel para Cabo Verde. A Capital da Cultura em Cabo Verde passaria a ser, definitivamente, a cidade que albergar o ganhador do Nobel two thousand e não sei quantas.
José Luís Tavares ou ‘Nzé di Santiagu (um filho ou neto deles) podem levá-lo para Assomada? Corsino Fortes ou Germano Almeida (ou um neto deles) levá-lo-ão para Mindelo? Arménio Vieira ou a nova geração de escritores da Praia (ou seus descendentes) vão trazê-lo para a Praia? Só o tempo o dirá. Aos pelouros da Cultura das Autarquias locais e às organizações da sociedade civil das nossas cidades de investirem forte no negócio da cultura, maximé, na Literatura.
E aí, Ulisses, vai encarar? Vai fazer com que a Praia se mantenha como a CAPITAL DA CULTURA até ao NOBEL cabo-verdiano? A PRÓ-PRAIA alinha, Filinto? Alors, on y va!

Friday, June 19, 2009

FUTUROS

“Deus quer, o Homem sonha, e a Obra nasce”

Fernando Pessoa
O futuro a Deus pertence. Certíssimo. Mas a nós de o entrever nos eventos de cada dia e de agir proactivamente, tentando redireccioná-lo a nosso contento.

1. Assim como assim, o futuro das ALFÂNDEGAS da CPLP estará sendo discutido em Lisboa, entre os dias 22 e 24 de Junho. Enquadrado nos planos do 2º PICAT (Programa Indicativo de Cooperação e Assistência Técnica), as administrações aduaneiras dos países membros da CPLP, reunidas em seminário sobre o tema «AS ALFÂNDEGAS E O FUTURO», debaterão o futuro de uma das mais vetustas instituições do Mundo. Apresentarei, em representação da administração aduaneira cabo-verdiana, o tema «O PORTAL ETECTRÓNICO, A GESTÃO DE RISCO E A DISCRIMINAÇÃO POSITIVA, ENQUANTO INSTRUMENTOS DE SECURIZAÇÃO E FACILITAÇÃO DOS FLUXOS COMERCIAIS INTERNACIONAIS». Em essência, estarei defendendo a utilização inteligente das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) e a aposta em profissionais competentes e motivados, como condição de sobrevivência no futuro, ao mesmo tento que registarei um sentido apelo no sentido de não se descurarem as questões éticas que seguem minando organizações do tipo das nossas.

2. O futuro da minha cidade – a PRAIA DE SANTA MARIA DA VITÓRIA – está sendo reequacionada por estes dias. Os passos que a edilidade está dando no sentido de normatizar a questão dos resíduos sólidos urbanos no município; a elaboração do primeiro draft dos estatutos da futura Guarda Municipal; a intervenção paisagística nas novas avenidas; a promessa, para MUITO BREVE, da pedonização da Rua 05 de Julho (antiga Rua da República); o regresso dos SEMÁFOROS. A consagração de um seu filho, o vate Arménio Adroaldo Vieira, o homem que transportou TOBIDA e TOTE CADABRA para as páginas de ouro da poesia cabo-verdiana, e que acaba de ser laureado com o prémio Camões de Literatura; a PRÓ-PRAIA que ressurge com um novo figurino e com um renovado élan, prometendo usar e abusar das TIC, tal qual a estrutura de campanha do senador Obama. A Praia parece estar bem e recomendar-se para o futuro.

3. Já SANTIAGO, nem tanto. Apesar das estradas asfaltadas inauguradas e em vias de serem inauguradas (Praia/S. Francisco, João Teves/Jaracunda, Assomada/Rincão, Fundura/Ribeira das Pratas, and so on), a verdade é que parece que se deixou cair a tão ansiosamente esperada VIA RÁPIDA PRAIA/TARRAFAL, pelo litoral.
Quando, na inauguração da requalificação e asfaltagem da estrada João Teves/Jaracunda, o Ministro das Infra-estruturas ofereceu ao edil Orlando Sanches a asfaltagem do troço que vai da Variante até Pedra Badejo, com eventual prolongamento até à Calheta de São Miguel, senti um baque dentro peito: seria o anúncio do aborto da VIA RÁPIDA PRAIA/TARRAFAL, pelo litoral? Se sim, será a morte de um dos maiores sonhos dos santiaguenses.
De tantas esperanças que nela depositavam, o anúncio, ainda que velado, do seu adiamento, possivelmente, lá pelas calendas gregas, deixou na boca um travo amargo. Travo tão amargo que nem a publicação (in B.O. nº 24, I Série, de 15 de Junho de 2009) do REGULAMENTO DA COMISSÃO DE APRECIAÇÃO E NEGOCIAÇÃO DAS PROPOSTAS (CANP) relativas ao concurso público para a adjudicação da Concessão da Via Rápida Praia/Tarrafal (CPT), aprovado por despacho conjunto dos Ministros das Infra-estruturas e das Finanças (datado de 29 de Janeiro de 2009) conseguiu amenizar.
Mas ainda que venha a desaparecer aquela ansiedade orgástica da espera pela inauguração da super infra-estrutura, nem por isso Santiago baqueará. Quando chegarem (chegarão, chegarão!) as novas gerações de infra-estruturas (penso nas pontes ligando Santo Antão a Sanvicente, Tarrafal aos Mosteiros, Pedra Badejo ao Maio, etc.), com certeza, também conseguiremos ligar Tarrafal à Praia por uma via rápida, com oito faixas, sobranceira ao litoral Este de Santiago. Neste Cabo Verde de esperança, a esperança é sempre a última a morrer.

4. E o TARRAFAL continua a sua triste sina. A dita estrada de montanha PRAIA/TARRAFAL é asfaltada apenas da Praia até Santa Catarina; a outra estrada (a tal que passa por Milho Branco, Monte Negro, Pedra Badejo, Santa Cruz e Calheta, antes de parar no Tarrafal) vai ser requalificada e asfaltada apenas no troço que vai da Variante à Pedra Badejo (1ª fase) e Calheta (2ª fase) – Inocêncio dixit. Para quando o Tarrafal? Com a aposta que se diz fazer no turismo, porque é que o Tarrafal fica de fora de um dos mais audaciosos projectos da II República, qual seja o programa de infra-estruturação que vem sendo cumprido de uns anos a esta parte?
Vai ser preciso fechar o anel: da Calheta ao Tarrafal e de lá para Santa Catarina. Será a terceira fase do projecto (Variante/Tarrafal/Praia)? A ver vamos.
Aliás, mais perspicaz do que o seu adjunto (e com um ouvido e um senso político bem mais apuradíssimos) lá foi o senhor Primeiro-ministro prometendo fechar o anel e propiciar um casamento (dele com Santiago?). A Ribeira Seca, que testemunhou a promessa, talvez venha a ser a madrinha do casamento anunciado.

5. O futuro dos TACV também preocupa. Insiste-se em instalar Conselhos de Administração com pessoas que se vão conhecer na cerimónia de posse ou na primeira reunião do Conselho e espera-se que as coisas funcionem. A companhia teve os seus melhores dias (não isenta de conflitos – prova de que o problema não são os administradores, mas a empresa, que é pouco menos que ingovernável) nos tempos em que a Companhia era gerida por Directores-Gerais. Não se podendo defender, nos dias de hoje, o regresso a uma tal opção de gestão, há que pensar em uma solução para a questão.
Pessoalmente, sempre defendi que um órgão colegial deve ser resultado de um consenso. Por maioria de razão em se tratando de uma empresa de capitais inteiramente públicos. Não se podendo escolher um CEO, negociar com ele uma carta de missão e confiar-lhe o futuro da Companhia, o jeito é escolher um Presidente para o Conselho de Administração e negociar (com ele) a composição do Conselho e (com o Conselho) as metas a atingir. E deixar claro que a administração deve esforçar-se por fazer parte da solução e não dos problemas (que já são mais do que muitos). Isso antes de se classificar a companhia como sendo simplesmente ingovernável e, em consequência, doá-la ou leiloá-la a quem tiver coragem de assumi-la. O Alfredo Carvalho ainda estaria interessado?

6. O futuro do negócio das taxas de radiodifusão - entre a RTC e os utentes, com a ELECTRA como intermediária - parece que vai conhecer uma solução. As pessoas têm agora a chance de negociar directamente com a RTC. Uma simples DECLARAÇÃO desvincula o consumidor da obrigação de pagar a Taxa de Radiodifusão juntamente com as contas de energia e de água.
Urgia, de facto, pôr termo ao assalto que é debitarem-nos quatrocentos e tal paus, a título de Taxa de Radiodifusão, tenha-se ou não se tenha instalado no local de consumo da energia eléctrica, um receptor de rádio ou de televisão, desde se tenha um consumo igual ou superior a 40 KWh. Pode uma coisa destas? E a violência maior dava-se (e ainda se dá) quando o fulano, sendo embora assinante do pacote ZAP da CV Multimédia (que inclui a TCV) era, ainda assim, obrigado a pagar a referida taxa na ELECTRA.
D. Bela Aguiar tem mais pormenores. Contactem-na.

7. O futuro das relações dos consumidores com a ELECTRA continuará na mesma senda: a ELECTRA responsabilizando o consumidor pelas suas ineficiências; os consumidores carpindo suas mágoas diante da imprevisibilidade da ELECTRA. A única coisa previsível e pontual na relação é a factura de consumo que entra, regular e sorrateiramente, por debaixo das nossas portas.
Já agora, para quando o cumprimento da proibição de facturação de consumos calculados por estimativa? Consumidores e ELECTRA devem se respeitar, enquanto parceiras que são, para que se possa construir um futuro de desanuviamento. Quem dará o primeiro passo?

O futuro a Deus pertence? Certamente. Mas a nós, simples mortais, de lhe definirmos um sentido.

Wednesday, June 17, 2009

TAXA ECOLÓGICA

“Dificuldades reais podem ser resolvidas; apenas as imaginárias são insuperáveis.”

Theodore N. Vail
Quem, como eu, defende a municipalização da taxa ecológica tem obrigação de demonstrar como é que se pode consumar a materialização da ideia.
Mas antes de mais talvez seja de bom-tom registar o que penso da referida taxa. Taxa que tem características de imposto (por ser uma subtracção de riqueza, com carácter unilateral, sem qualquer contrapartida, portanto) e de sanção, à la carte, (subtracção de riqueza, com carácter unilateral, e destinada a conformar comportamentos), isto é, uma sanção previamente enunciada como punição por eventual comportamento à margem da ordenação social vigente: assumindo o comportamento esperado, não se paga a taxa ecológica; caso contrário, o operador é obrigado a pagar a referida taxa, com muito fracas possibilidades de repercuti-la no consumidor final.
A ideia subjacente à taxa ecológica é levar o operador e o consumidor a terem comportamentos ecologicamente correctos. Se, na sanha por maiores lucros ou na persecução do balato li sin, operador económico ou consumidor final optarem por taras one way ou por embalagens não biodegradáveis, ficam sujeitos à taxa ecológica, a qual deve ter taxas suficientemente pesadas e convincentes, a modos de sentirem necessidade de pegarem em lápis e papel e começarem a fazer contas, antes de fazer a opção pelo tipo de embalagem para os produtos que importa e/ou consome. E é claro que a opção por taras retornáveis ou por embalagens biodegradáveis deve premiada com uma taxa nula (zero) em sede de taxa ecológica.
Depois do duplo parêntese, torna-se necessário fundamentar a defesa da municipalização do «imposto». Tanto o Governo nacional como os governos locais têm programas de animação e gestão ambiental, mas é nas comunidades que as coisas acontecem: é lá que vêm ao de cima as necessidades de educação ambiental, lá é que surgem as necessidades de intervenção, e é lá que é a tapadinha da luta pela preservação da qualidade ambiental. Não se pretende que o Estado seja uma realidade virtual e convencional, mas tão-somente que é nos municípios, nas suas comunidades, suas ruas, encostas, cutelos e ribeiras que o Governo nacional e os governos locais atacam a questão ambiental. Então, e diante disso, porque não elaborar programas conjuntos (Estado/município) e costurar orçamentos conjuntos de intervenção? E porquê brigar pela titularidade dos recursos? Coisa de louco, ? A municipalização da taxa ecológica garantiria ao Governo nacional e aos governos locais que todas as receitas arrecadadas nessa rubrica ficariam integralmente disponíveis para as intervenções da Administração Pública (directa e indirecta) nas comunidades, em matéria de política ambiental.
Como operacionalizar a municipalização? Simples.
Sendo um «imposto» de porta, continua a ser cobrada, à entrada das taras, nas estâncias aduaneiras. Deixa, simplesmente, de ser contabilizado como receita do Tesouro, passando a ser escriturado como operação de tesouraria. Só isso.
Como chegarão os recursos aos municípios? Simples.
No final do mês, ou de um período que se entender razoável, o sistema informático instalado nas estâncias aduaneiras (o famoso SYDONIA++) apura o montante arrecadado, o qual será transmitido aos destinatários finais dos recursos. Na verdade, o SYDONIA++ permite muito mais do que isso: os interessados podem saber, a cada minuto, o montante acumulado de receitas provenientes da liquidação e cobrança da taxa ecológica. Basta instalar o módulo «account» do SYDONIA no terminal do Presidente da Associação Nacional dos Municípios (e/ou nos terminais dos Presidentes de Câmara). Haveria a máxima transparência em matéria dos montantes arrecadados. A questão de quanto caberia a cada município ou a cada projecto, dependendo do destino que se pretender dar aos recursos - engrossar as receitas municipais, tout court, ou financiar projectos de intervenção ambiental. Pessoalmente, defendo a consignação dos recursos para financiamento de projectos pré-aprovados do programa ambiental municipal.
Mas uma chamada de atenção deve ser registada agora: os recursos arrecadados não podem ser consignados ao município da área territorial da estância aduaneira de importação das mercadorias que dão lugar à cobrança do imposto. Seria, de todo, injusto: a maior parte das importações acontecem no porto da Praia, mas tais mercadorias são, posteriormente, distribuídos por quase todo o território nacional, exceptuando S. Vicente e Santo Antão. Se é certo que a entrada no território nacional se dá pelo porto da Praia, a verdade é que tais mercadorias são consumidas um pouco partout. A distribuição deve ser, pois, feita com base em dados do INE sobre o consumo (o consumo é que libera as taras não biodegradáveis que vão atacar o ambiente, perigando o futuro) e mediante fórmula previamente aprovada pelo Parlamento, sob proposta do Governo nacional e ouvida a Associação Nacional dos Municípios.
O que deve ficar claro, para todos, é que a taxa ecológica, diferentemente dos demais impostos, não deve ser considerada um mero expediente para obter recursos adicionais. A ideia é, e não se pode perder isso de vista, incitar os operadores e os consumidores para comportamentos ecologicamente aceitáveis em matéria de opção do tipo de embalagens que levam para casa. Tem um efeito pedagógico, com métodos muito próximos dos dos professores da primária dos tempos do meu pai, baseada em prémio e castigo: quem tem um ditado com zero erros ganha um doce; quem comete erros leva palmatoadas em quantidade e violência directamente proporcionais ao número de erros cometidos. Portanto, taxa ecológica para quem opte por taras one way e embalagens não biodegradáveis (plástico, vidro, folha de flandres e outros materiais que levam centenas de anos a desaparecer) e discriminação positiva (a identificar) a favor de quem opte por taras retornáveis e embalagens em materiais biodegradáveis (papel reciclável, papel reciclado e outros materiais que se desfazem em pouco tempo). Mas taxa ecológica que mexa com o bolso do consumidor: nada menos do que 30$00 por cada garrafa PET de 1,5 litros; nem menos do que 20$00 por uma garrafa de vidro de litro; ou 15$00 por uma garrafa de 33 centilitros ou lata de 330ml. E isso sem contar com a obrigação dos operadores exibirem produtos embalados em material biodegradável em posições de destaque no seu estabelecimento e com a disponibilização de contentores bem identificados para a recolha de embalagens one way e/ou não biodegradáveis.
Não se deve descurar também contrapartidas extras (para além do não pagamento da taxa ecológica) aos operadores que optem por taras retornáveis e embalagens biodegradáveis. Estou pensando, por exemplo, no caso da Padaria PÃO QUENTE. Esta unidade tem feito um esforço considerável, merecedor de público destaque, no sentido de fornecer o pão e os produtos de pastelaria fina, de sua produção, em embalagens de papel. Uma distinção, um diploma ou um qualquer incentivo outorgado à PÃO QUENTE, pelo comportamento ecologicamente correcto, daria motivação extra aos sócios, ao mesmo tempo que se erigiria a empresa em exemplo a ser seguido. Pelas empresas do ramo e não só.
E porque não lançar um repto aos Grupos CALÚ & ÂNGELA; ADEGA, SARL; HERDEIROS EDMUNDO RODRIGUES BARBOSA, LDA; e LEADER PRICE (PALÁCIOS FENÍCIA); para que substituam os sacos de plástico por sacos de papel reciclado? São empresas reconhecidas pela sua grande responsabilidade social e que bem poderiam se transformar em bandeiras da Capital, caso viessem a dar provas da sua consciência ecológica: substituindo sacos de compras em plástico, por sacos em papel reciclado; instalando ecopontos; distribuindo refrigerantes e cervejas em taras retornáveis; etc. Alguém acharia demasiado, qualquer discriminação positiva que a Câmara Municipal da Praia fizesse em relação a essas empresas? Não seria justo que a fiscalidade lhes fosse favorável, em função disso? E não seriam merecedoras de pública distinção? Aqui ficam as sugestões. Para os referidos Grupos económicos; para a CMP; para o Governo da República. Uma parceria público-privado envolvendo o Governo nacional, o governo local e as maiores empresas do ramo da distribuição pode produzir, pelo menos na Capital, impactos de longe mais benéficos do que os esperados em consequência taxa ecológica. Taxa ecológica cuja proposta de lei veio pôr a nu o analfabetismo ecológico de figuras com obrigações especiais na condução da política ambiental.
Seria pretensão a mais esperar que sejam estabelecidas parcerias entre o Estado e as produtoras nacionais de águas, cervejas e refrigerantes? Pessoalmente acredito que seria possível esgrimir a fiscalidade com alguma maestria, dispensando, p.e., um tratamento fiscal diferenciado às operadoras que aderirem ao princípio de disponibilização das bebidas produzidas em embalagens retornáveis e/ou biodegradáveis.
Mais do que de uma simples Lei sobre a «taxa ecológica», o país precisa é de um pacote legislativo substancial em matéria ambiental, passando, é certo, pela taxa ecológica, mas avançando em domínios ainda inexplorados (ou deficientemente explorados), como sejam a fiscalidade, a parceria público-privado (Estado/produtores, Municípios/distribuidores) e, last but not least, parcerias Governo nacional/Autarquias locais.
Complementarmente, e diante dos boatos, que por aí correm acerca de fraudes ligadas à restituição ilícita dos montantes de taxa ecológica liquidados e pagos em sede própria, competirá à Administração Fiscal a blindagem do mecanismo de restituição da taxa ecológica: em se optando pela sua municipalização, conquanto continue a ser cobrada pelas estâncias aduaneiras, o reembolso deve ficar por conta do destinatário final, após comprovação inequívoca de errada liquidação e/ou cobrança.
Finalizo com uma prece: por favor, senhores deputados, não façam joguinhos com coisas sérias. E a questão ambiental e o equilíbrio ecológico são coisas demasiado sérias: delas dependem tanto o nosso futuro, como o futuro dos nossos netos e do próprio planeta TERRA.

Tuesday, June 9, 2009

O DIREITO DE RECLAMAR

“Por vezes, quando reflicto sobre as tremendas consequências que resultam das pequenas coisas… Fico tentado a pensar… que não há pequenas coisas.

Bruce Barton
Há que saudar o (r)estabelecido direito de reclamar. Se antes não nos ouviam, ou ouviam e faziam ouvidos de mercador, hoje já se pode apelar para o LIVRO DE RECLAMAÇÕES e aí registar as nossas reclamações.
Mas esse direito resgatado, em vez de nos tranquilizar, faz-nos mergulhar num mar de cogitações. O livro deve estar visível e/ou acessível ou a gente tem de pedir ao responsável? Se o responsável se recusar a apresentar o livro, o que é a gente faz? A quem a gente recorre? O responsável pode proibir-nos de entrar no seu estabelecimento em razão das nossas reclamações? Qual o ente público com poderes para fazer valer os nossos direitos? E se o ente público a quem a gente recorrer não nos atender ou nos atender mal e porcamente?
Aliás, quando é um ente público responsável pela provisão de algum serviço que se torna alvo das nossas reclamações, o que podemos fazer? Haverá um livro de reclamações nos escritórios de tais entes, à semelhança do privado? Ou ali serão as decorativas caixas de reclamações, as tais que ninguém abre?
Não estranhem as nossas dúvidas. Elas alicerçam-se em desilusões várias que medraram em uma cultura onde um mundo de direitos não conhecem tradução prática e tudo fica por isso mesmo. Direitos consagrados até constitucionalmente e que, em não sendo respeitados, o cidadão não tem para onde se virar; e ditames, também constitucionais, de que os titulares dos poderes fazem letra morta.
Dos tais direitos consagrados não vou aqui falar, já que cada um de nós é capaz de recitar uma dezena delas sem gaguejar. Dos ditames constitucionais feitos letra morta, o exemplo mais gritante é o estatuto administrativo especial outorgado pela CR à Cidade Capital da República e que tem sido feito de bombo da festa, tanto pela situação como pela oposição. É claro que responsabilidades maiores devem ser assacadas aos parlamentares; embora o Governo tenha a sua quota-parte, uma vez que quando decide, de per si, mudar o estatuto de uma urbe (de vila para cidade, por exemplo), fá-lo no estilo vapt-vupt, não acontecendo o mesmo quando se trata de um ditame da Constituição da República. Num caso desses, a quem a gente pede o Livro de Reclamações? Onde estará dependurada a caixinha de reclamações? Para onde se virarão os capitalinos? Poder-se-á, de facto, falar de direitos, quando nada se pode fazer para os fazer valer? Quando não existe, claramente, quem nos possa valer em caso de adiamento ad aeternum da realização dos direitos?
Por isso, se torna cada vez mais premente que se deixe de estabelecer direitos sem que sejam estabelecidos os meios competentes para os fazer valer. É preciso, de uma vez por todas, que se comece a equacionar e a pôr de pé mecanismos e interlocutores acessíveis e com poder para fazer valer os direitos consagrados na CR e nas demais leis da República.
A instalação do Provedor de Justiça (ou será uma Provedoria?) já tarda. Não se compreende como é que se pode deixar em banho-maria uma instância tão importante para a salvaguarda dos direitos dos cidadãos. A Provedoria dos Munícipes (ou seria o Provedor?) surge de quando em vez nos discursos políticos, para depois levar sumiço, qual cometa nos céus. É ou não considerado importante para a defesa dos interesses dos munícipes. Se sim, qual a razão (ou as razões) para não se dar o passo?
Virou moda transferir para os cidadãos (e suas associações) a responsabilidade pela defesa e protecção do consumidor. Os cidadãos devem organizar-se de modo a defenderem os seus direitos e interesses, sim senhora. Mas não se deve nunca perder de vista que essa é uma função do Estado. Se as associações de defesa e protecção do consumidor estiverem funcionando bem, óptimo. Nessas circunstâncias, ao Estado bastaria transferir os recursos necessários para que tal serviço público continuasse a ser prestado por organizações da sociedade civil. Não estando, devem os poderes públicos (nacionais e locais) tomarem sobre si a responsabilidade pela defesa e pela protecção do consumidor.
No universo lusófono há dois grandes baluartes de defesa e protecção do consumidor: a DECO, em Portugal, e a PROCON, nas Terras de Vera-Cruz. E ninguém que conheça o historial da PROCON duvida do seu poder e de sua eficácia. E a PROCON é uma instância PÚBLICA de protecção e defesa do consumidor. E não é difícil compreender o surgimento de uma tal autarquia: não havendo um movimento da dita sociedade civil com os necessários empenho e empowerman, compete ao Estado, por intermédio da administração pública, directa ou indirecta, instalar uma instância de defesa e protecção do consumidor. Pelo menos até que os cidadãos tenham condições de assumir a sua própria defesa e protecção e sejam capazes de fazer isso melhor do que o organismo público.
No entanto, por aqui, tanto o Governo nacional como os Governos locais optam por ficar na sombra, esperando que os cidadãos andem às bolandas até que consigam algum nível de organização. Aprova-se uma lei dita de defesa e protecção do consumidor, e ela não é regulamentada, passadas duas décadas; define-se um estatuto para os organismos de defesa do consumidor, junto das Autoridades Reguladoras, e estas fazem o que lhes dá na telha; espera-se que os cidadãos organizados resistam à cartelização, mas não se instala a Autoridade da Concorrência; deixa-se o consumidor entregue a si próprio, e nem se cria um canal especial, junto do Ministério Público e dos Tribunais, que garanta um tratamento célere das acções intentadas contra os provedores de bens e serviços que hajam violado os sacrossantos direitos do consumidor. Canal especial ou instruções permanentes ao MP para dar prioridade às acções intentadas pelas organizações de defesa e protecção do consumidor.
Os direitos são tantos (e a nossa Constituição Política é muito bem referenciada em função disso), mas as coisas estão de tal forma que, nos dias que correm, a defesa e a protecção da propriedade individual e do património das empresas é, cada vez mais, assumida pelos cidadãos e pelas empresas. A prosperidade dos serralheiros e a proliferação de agências de segurança privada (para além dos guardas não enquadrados contratados pelas famílias) são testemunhas desse estado de coisas.
Não diria que o Estado foge às suas responsabilidades. Nem digo que as famílias e as empresas não devam contribuir para a segurança e a inviolabilidade das respectivas propriedades. E não me atreveria a registar que o Estado deva levar os cidadãos ao colo, removendo-lhes todos os obstáculos. Mormente que o consumidor deva cruzar os braços e confiar a sua defesa e protecção exclusivamente aos poderes públicos. Nada disso. O que aqui se questiona é a efectividade dos direitos em uma situação em que inexistem mecanismos para fazê-los valer.
Em tais circunstâncias, competiria sempre aos poderes públicos a assumpção descomplexada do seu papel. Em um Estado social e de direito democrático todos têm direitos e deveres. Até o próprio Estado: tem o direito, exclusivo, de uso lícito da força e tem um acervo grande de deveres em relação aos cidadãos. E o primado da lei, que caracteriza o estado de direito, e o dever de cumprimento da lei, que nos atinge a todos, Estado incluído, faz com que o Estado esteja agindo marginalmente, sempre que deixa um qualquer dever seu ao Deus dará.
E diante disso, a gente cruza os braços deixando que o Estado se desenrasque? Claro que não. Deve-se é exigir que o Estado aja responsavelmente. Que o Estado não fuja às suas responsabilidades. E que faça um pouco como fez em relação à economia.
Durante algum tempo o Estado criou, instalou e explorou empresas públicas, cobrindo domínios que o incipiente (diria mesmo inexistente) tecido empresarial não podia cobrir. Continua, ainda hoje, com acções e participações em empresas estratégicas, como forma de influenciar as coisas em determinado sentido. E pode, ainda hoje, encetar incursões por sectores que ainda não interessem aos privados, à condição de sair e ceder vez ao capital privado logo que o sector se mostre viável e/ou rentável. No que à salvaguarda de direitos diz respeito, o Estado poderia, e deveria, agir de modo similar. Lá onde as organizações dos cidadãos ainda não possam substituir, com vantagens, o Estado, deve este continuar a intervir. Para o bem-estar de todos e felicidade geral da Nação.
Os cidadãos ainda não conseguiram pôr de pé um eficaz organismo de protecção e defesa do consumidor? Então o Estado não pode desligar os interruptores. Que o Governo nacional e/ou os Governos locais ponham de pé estruturas de protecção e defesa do consumidor, ao mesmo tempo que sigam trabalhando no sentido de, a prazo, serem os cidadãos a assumir a incumbência. Que o Estado aprove uma lei virada para a protecção e defesa do consumidor, e a REGULAMENTE em tempo oportuno, a modos de abrir novas perspectivas aos cidadãos. Que na lei referida atrás sejam consagrados recursos destinados a apoiar a acção dos organismos que assumirem o SERVIÇO PÚBLICO de protecção e defesa do consumidor. Por aí.
O livro de reclamações ajuda na relação provedor do serviço/consumidor? Claro que ajuda. Ao Estado bastará estabelecer o princípio do uso do LR? Não, não basta. Os fornecedores de bens e serviços apostam nas limitadas possibilidades de acesso à justiça do consumidor nacional para criarem obstáculos e explorarem a sua boa-fé. Não bastará, por isso, instituir a obrigação de exibição do LR. Mais e melhor do que isso seria a instalação de mecanismos facilitados de acesso a um ente público capaz de dar resposta em tempo real a quem seja negado, por exemplo, o LR; àquele cuja reclamação não tenha tido seguimento; ou àqueles a quem sejam impostas retaliações por causa da sua postura cidadã. Mas não um ente público cujas luxuosas instalações inibam o cidadão comum. Que instalações do tipo existem, sim senhora, apesar dos permanentes apelos à austeridade. O bom mesmo seria catalogar os atentados aos direitos do consumidor como casos de polícia e dar instruções aos policiais para que, quando chamados, «não neguem fogo». Assim, bastaria sair à rua e chamar o policial de giro e fazer valer os nossos direitos.
Pena é que não se poderá catalogar como caso de polícia a recusa reiterada em cumprir um ditame constitucional como, por exemplo, o nº 2 do artigo 10º da CR, o tal que confere um Estatuto Administrativo Especial à Capital da República, e manda que o mesmo seja regulamentado por lei ordinária. Seria o bom e o bonito chamar um Guarda e pedir-lhe que prenda… cala-te boca. Já imaginaram quem a gente mandaria prender? Todos aqueles que (de 1999 ao presente) prestaram juramento solene garantindo que respeitariam e fariam respeitar a Constituição e que fizeram letra morta do artigo 10º. Ocorrem-me, no momento, um bom lote de gente poderosa que poderia ser chamado à pedra.
Mas vamos lá negociar? Não chamo a polícia, à condição desses senhores passarem a respeitar os ditames da Constituição. Feito? E olhem que não deve ser difícil. Basta ver a conversão do Ulisses em relação ao Estatuto A. Especial para a Capital. É pegar ou largar.
E quanto ao direito de reclamar… estamos conversados: não deve ser limitado. Deve-se, por exemplo, deixar de reclamar quando, numa loja, o produto tem um preço na prateleira, enquanto na «caixa» nos cobram um valor superior? Dêem-nos luz, água, pão e palavra qb que, ainda assim, não deixaremos de protestar contra o que achamos que não está certo. Rek!

Wednesday, May 27, 2009

EU QUERO É MAIS!

“Não fizemos o suficiente, nunca teremos feito o suficiente enquanto ainda for possível ter algo valioso para dar.”

Dag Hammarskjold
Cabo Verde está onde está hoje e irá muito mais longe, com toda a certeza, porque sempre tivemos e manifestámos muita ambição. Nem sempre agindo no sentido de realizarmos os nossos anseios, é certo, mas querendo, desejando, exigindo sempre mais. MUITO MAIS. Escutamos, amiúde, compatriotas nossos pugnando por cada vez maior ambição e negando-se a estar à frente apenas de algumas realidades africanas. Estar ao nível ou à frente de Estados do club do Sahel ou da África sub-sahariana sempre foi considerado pouco. Muito pouco.
E não vejo razão para ser menos ambicioso quando o universo encolhe um pouco e passamos da realidade nacional para o cenário local. A Praia de 2009 não deve se contentar em estar APENAS melhor que a Praia de 2007, nem simplesmente à frente dos demais centros urbanos nacionais. Tem de estar muito acima. E nem é preciso o tal de estatuto administrativo especial. A cidade da Praia alberga mais de 25% da população de Cabo Verde; acolhe mais de 50% de todos os negócios feitos no país; tem umas forças vivas de dar água na boca aos seus rivais; tem quadros para dar e exportar; ganhou uma dinâmica impressionante. Porquê não ambicionar fazer dela também a Capital de boas práticas democráticas?
José Ulisses Pina Correia e Silva e sua equipa terão encontrado, na Câmara, uma pequena babel, herança de uma administração pouco dada ao planeamento, à organização e ao auto-controlo e resultado da crença de que uma maioria absoluta tudo permite. Mas não há como negar as vastas possibilidades que se abrem a uma equipa jovem e motivada, diante de uma realidade sócio-económica tão pujante quanto a da Cidade da Praia.
Os maiores inimigos da Praia invejam-na por ser a Capital constitucional de Cabo Verde e ficam verdes de raiva por a considerarem um grande sorvedouro de recursos públicos. Nada de mais falso: a Cidade/Município da Praia deve ser das autarquias cujo desenvolvimento menos deve aos investimentos do Orçamento do Estado. A Praia deve o seu crescimento e desenvolvimento à dinâmica imprimida pelas forças vivas em presença. Se já contasse com o contributo, que merece e precisa, do Estado, corporizado em um porto, um aeroporto e um Centro de Convenções, à medida das suas reais necessidades, estaria aí competindo com Ouagadougou, Dakar, Abidjan e Abuja. E nem se pense que o O.E. teria que desembolsar todos os recursos necessários: umas quantas Parcerias Público-Privado ajudariam, e de que maneira, a resolver muitos estrangulamentos. E tenho quase a certeza de que uma visitinha à Líbia poderia garantir-nos uma estrutura do tipo da Sofitel Ouaga 2000 (Hotel e Centro de Convenções).
Mas a Câmara de Ulisses pode ser ambiciosa e, muito mais do que isso, pode transformar a ambição em realizações. Imaginem que a actual equipa camarária se decida a investir forte na actualização do recenseamento dos fogos construídos e habitados na Cidade da Praia; que consiga fazer a actualização do valor matricial dos mesmos; que lance, liquide e cobre todo o IUP (Imposto dito Único sobre o Património) correspondente. Imaginem, ainda, que a equipa resolva abraçar a tarefa de definir, investir em e explorar, por si ou por interposta pessoa colectiva, os estacionamentos da Cidade da Praia. Imaginem ainda o que poderá acontecer se a equipa levar até ao fim a ideia de normalização da gestão dos resíduos sólidos urbanos. Imaginem que a equipa de José Ulisses resolva redimensionar o seu quadro de pessoal e terceirizar as funções que o privado pode fazer melhor e mais barato do que a Câmara. Imaginem só se o pessoal decidir ser um tantinho mais austero e apostar forte e feio na melhoria da qualidade das despesas da autarquia. Agora fechem os olhos e visionem a quantidade de recursos de que a Câmara Municipal disporia para levar de vencida os desafios que enfrenta e que – é bom dizê-lo – são mais do que muitos.
É por estas e por outras que entendo que os munícipes da Praia devem ser exigentes para com o seu executivo municipal. Tem tudo para dar certo. A juventude e a capacidade técnica dos vereadores; os recursos latentes, à espera de serem explorados; o exemplo recente do que não deve ser uma administração municipal; o apoio dos munícipes; umas forças vivas de dar gosto; uma dinâmica de crescimento à prova de crise. Sem contar com incursões tributárias interessantes e que ainda não foram equacionadas. Penso, especialmente, nas «derramas»; na participação nos impostos indirectos lançados, liquidados e cobrados no território do município; na comparticipação nas receitas provenientes da arrecadação do ICE (Imposto sobre os Consumos Especiais); na municipalização da taxa ecológica; etc.
Estou com a Praia e não largo. Mesmo que isso me leve a chatear o governo local e a mobilizar os meus concidadãos a fazerem o mesmo. Da mesma forma que parabenizo o executivo municipal da Praia pelo esforço de organização da cidade, assim estarei cobrando pelas mazelas que ameacem instalar-se e ganhar foros de cidadania.
Dou boa nota ao esforço de organização do tráfego rodoviário (melhoria das sinalizações horizontal e vertical, com destaque para o regresso, ainda que tímido, dos semáforos); reconheço o esforço de marcar presença em todo o território municipal (embora o desequilíbrio entre o Plateau e o resto seja gritante); vejo com bons olhos o esforço de divisão territorial (visando aproximar a decisão dos administrados); saúdo a ideia dos Conselhos de Zona, da Juventude e dos Anciãos (se ainda não foi equacionado, já sabem o que penso da ideia); daria uma nota muito boa para as audiências públicas (caso não se tivesse ficado pela número um); saúdo a adopção da via concursal para acesso aos subsídios; dou nota positiva à transparência na distribuição das bolsas de estudo; enfim, avalio positivamente o primeiro ano do mandato da Câmara do Ulisses, do Óscar, do Tober, do Abailardo, do Coutinho, da Lila, da Edna, do Gilberto. E não tenho dúvidas acerca do contributo que a Assembleia Municipal terá dado para que as coisas estejam como estão, conhecendo, como conheço, a Presidente e o Secretário da Mesa.
Congratulo-me também com a atitude madura e elegante do Presidente Ulisses no último Sábado, durante a inauguração da estrada Praia/S. Francisco, quando elogiou o Governo nacional, pela obra inaugurada, ao mesmo tempo que deixava, mais ou menos claro, que se reservava o direito de criticar quando fosse caso disso. E faço votos que continue assumindo atitudes pró Praia, saudando tudo o que for bom para o município e insurgindo-se contra tudo que pareça poder beliscar os interesses da Praia e de suas gentes, venham as ameaças donde vierem, seja do Presidente do partido, seja do Governo nacional, de algum Ministro mais afoito, seja ainda da oposição municipal ou da classe empresarial.
Contudo, não me coíbo de chamar a atenção para o que se passa em matéria de prática democrática e da constituição do embrião da futura Polícia Municipal.
Critico veementemente a decisão de dividir a cidade em Circunscrições Administrativas sem consultar os munícipes. Uma tal divisão vai para além do que foi sufragado na urna. 50% dos votos expressos não reflectem a vontade de toda uma cidade, e não pode ser encarado como um cheque em branco endossado por todos os munícipes. A decisão correcta seria a devolução, pontual, do poder aos eleitores para dizerem de sua justiça. Mas nada está perdido: PODE-SE, E DEVE-SE, BUSCAR UM RESPALDO POPULAR PARA A DECISÃO. Defendo um referendo, mas se se encontrar outra forma democrática de resolver a questão, dava-me por satisfeito.
Definitivamente condenável foi a saída encontrada para o preenchimento dos Conselhos de Zona: em nome da DEMOCRACIA e do respeito pelos cidadãos desta urbe, deve a Câmara rever a sua opção. Que Conselhos de Zona por cooptação do Presidente da Câmara NÃO! Acredito haver ainda espaço e tempo para mudar. Errar é humano; reconhecer o erro é inteligente; dar a mão à palmatória e voltar atrás é divino. Aposte nessa, Ulisses.
Ninguém ainda disse que os limonzinhos de hoje vão ser os policiais municipais de amanhã. Ainda não. Mas está-se trilhando um caminho muito perigoso. Aos agentes da Polícia Municipal não se pode exigir menos do que aos da Polícia Nacional: 12º ano de escolaridade, formação policial de base e actualização contínua e postura irrepreensível. Menos do que isso será inaceitável. E aqui, o Governo Nacional tem um papel importante: na Lei de Bases da Polícia Municipal deve inscrever essas exigências de forma clara, estipulando, de forma expressa, o papel da PN no enquadramento e na tutela da PM. E se os limonzinhos não são o núcleo de base da PN, seria de bom-tom que, desde já, não se lhes alimentem as expectativas e, sobretudo, que sejam limitadas as admissões. Isso porque, mais tarde, por ocasião da instalação da Polícia Municipal e do mais que certo redimensionamento dos quadros de pessoal da CMP, poderá causar verdadeiros amargos de boca e sofrimento atroz aos envolvidos, muitos deles chefes de família.
A Praia pode ser e dar mais aos moradores e aos visitantes. Por isso, EU QUERO É MAIS. EXIJO MAIS E MELHOR. Em realizações, em qualidade de vida e, principalmente, em práticas democráticas.

Monday, May 18, 2009

ADMINISTRAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO

“Guardamos a regra de ouro na memória; está na hora de colocá-la em prática.”

Edwin Markham
Creio haver um consenso de que a eficácia da administração resulta da conjugação dos melhores coeficientes de vínculo espacial e de lapso temporal. O corolário lógico de uma tal assumpção é a aceitação de que a administração eficaz é aquela com menor vínculo espacial (a descentralizada) e com a capacidade de reagir no menor coeficiente temporal (a desconcentrada). Perante a convicção de que para equacionar correctamente e resolver de forma irreversível os constrangimentos que obstam a que tenhamos a qualidade de vida urbana que almejamos, imprescindível e inadiável, portanto, se torna a instalação de uma administração eficaz.
Contudo, antes de avançar com o tema e em jeito de parêntesis, quero deixar aqui registado que uma tal administração precisa contar com uma sociedade civil organizada, engajada e actuante na defesa de uma boa qualidade de vida e na sustentabilidade das soluções. Sociedade civil que pugne pela instalação de uma administração eficaz, que colabore com ela e que cobre dela o cumprimento das obrigações implícitas e dos políticos o cumprimento das promessas das campanhas eleitorais.
Voltando à vaca fria e para início de conversa, vamos ter que clarificar alguns conceitos. Por exemplo, a necessidade da presença da vontade do Estado próxima do cidadão, para a consecução do tal vínculo espacial, de que falamos atrás, configura uma DESCENTRALIZAÇÃO, que poderemos definir como sendo o processo destinado a conferir ao poder autárquico responsabilidades, competências, RECURSOS (humanos, materiais, financeiros, patrimoniais, técnicos e tecnológicos) e poderes de decisão em matérias até então situadas a nível do Poder Central, SEM DIREITO DE AVOCAÇÃO. Importará não confundir descentralização com DESCONCENTRAÇÃO (que vem a ser o processo administrativo que se destina a transferir para agentes locais do Poder central poderes de decisão até então situados a nível do centro político, mantendo, entretanto o delegante o poder de avocação – que pode ser exercido a todo o tempo) também importante iniciativa e que pode representar tanto um coeficiente de eficiência no sentido temporal como um esforço de redução da macrocefalia da administração central.
Em Cabo Verde, como um pouco por todo o lado, a descentralização foi, inicialmente, o que se pode chamar de DESCENTRALIZAÇÃO DE OFERTA. Isto é, o Poder Central, de motu proprio, criou e instalou o Poder Local, passando-lhe responsabilidades, competências e poderes de decisão em matérias até então por Ele detidas. No entanto, aos poucos, foi-se constatando alguma inadequação entre os recursos e as responsabilidades repassados às autarquias locais, ao mesmo tempo que se tomava consciência de que há mais «serviços» que o Governo Local pode prestar com maior eficácia de que o Poder Central. Daí surgiram as primeiras reivindicações no sentido da exigência de mais recursos (transferências de mais dinheiro, de tecnologias e de capacidade de gestão) e da descentralização de mais poderes (acompanhados, obviamente, de recursos coerentes). Aqui chegados, a descentralização já não é uma oferta do Poder Central, mas, antes, uma demanda dos cidadãos e das suas autarquias. É o que se pode chamar DESCENTRALIZAÇÃO DE DEMANDA, uma questão bem mais complexa: já não é o Governo nacional a alijar, segundo as suas conveniências, dores de cabeça para os Governos locais, mas são estes e os cidadãos locais a exigirem uma inegável erosão do poder central em prol do reforço do poder e da cidadania locais. Os aparentes abrandamentos do fenómeno terão a ver, necessariamente, com a necessidade de apropriação das situações novas, por parte das autarquias; e da dura digestão da nova realidade (a demanda de descentralização, com a consequente redução da influência local do Governo nacional) por parte Poder central. A solução vai ter de passar por oficinas de construção democrática de consensos, preocupadas com a melhoria permanente da qualidade de vida nas comunidades.
Mas a cada vez maior responsabilidade dos Governos locais perante os cidadãos locais obriga a que tais Governos sejam senhores das suas decisões de GASTO e ARRECADAÇÃO, o que implicaria em maior acutilância, seja da tutela inspectiva do Poder Central, seja do controlo social. Autonomia de GASTO que não rima com despesas sem a desejável qualidade; e a autonomia de ARRECADAÇÃO que pressupõe, de entre outras coisas, um bicho-de-sete-cabeças denominado descentralização tributária. Não sendo uma questão tabu, é, contudo, um assunto a tratar com luvas de pelica. Descartar o debate sobre o assunto não será uma atitude séria, como ficou demonstrado no recente Fórum Internacional sobre «Governança Local e Desenvolvimento Territorial», realizado na Capital da República nos dias 14 e 15 de Maio decorrente.
Caracterizada pela transferência de funções (que passam a ser exercidas localmente); pela autonomia na provisão dos serviços (sem interferência externa nos serviços nem nos gastos); pela autonomia tributária (assumpção de fontes tributárias pelos Governos locais e liberdade para definir a base tributável e as alíquotas); por alguma liberdade para endividamento; com transferências de recursos (devidamente protegidas por fórmulas e sem condições); e pela liberdade política (definições específicas quanto à forma de realização das vontades colectivas) a descentralização resulta muito sedutora. E é vantajosa para as comunidades, não haja dúvidas. Porém, ela não está imune a ciladas e armadilhas. Ciladas e armadilhas que não devem ser escamoteadas, que não devem servir de desculpas para não trilhar um tal caminho, mas que devem ser conhecidas, a modos de poderem ser devidamente prevenidas.
Logo à primeira vista ressaltam alguns “perigos” como, por exemplo, a forte probabilidade de agravamento das assimetrias regionais de crescimento; a possibilidade de agravamento das dificuldades económicas do país; e a eventualidade de perda de alguma capacidade do Poder Central em promover o desenvolvimento do país e a estabilização da economia. De facto, a autonomia dos Governos Locais pode acabar privilegiando as comunidades mais ricas (com maior capacidade de mobilizar recursos), o que poderia redundar num agravamento das assimetrias regionais, na contra-mão do programa do Governo Central. E pode acontecer também que o grau de liberdade que o Poder Central tem para implementar políticas estabilizadoras (penso, por exemplo, no controlo da inflação) pode ficar reduzido, em função da descentralização tributária e de um conjunto de outras cedências em favor dos Governos Locais. É que diante do novo quadro e da nova correlação de poderes, aumenta o número de orçamentos a serem equilibrados e de endividamentos excessivos a serem contidos (no nosso caso, há um orçamento do Estado e 22 orçamentos locais, sem contar com o voluntarismo dos nossos autarcas no que à realização de despesas diz respeito).
É claro que estas ciladas e/ou armadilhas, uma vez conhecidas, podem (e devem) ser prevenidas. Conduzindo a descentralização de forma ordenada; mantendo nas mãos do poder central as bases impositivas de maior dinamismo; aprovando e implementando medidas que conduzam a ganhos de responsabilidade e de eficiência na gestão dos recursos (penso na questão incontornável da qualificação das despesas e no comprometimento com a efectividade e a equidade da acção tributária); pode evitar dissabores e amargos de boca e, principalmente, pode contribuir para uma significativa melhoria da qualidade de vida nas comunidades.
Como diria Peter Drucker, a descentralização é o novo e precisa ser feito. Desde que, digo eu, não se percam de vista os requisitos essenciais a uma boa descentralização, destacando-se (i) a capacitação das instâncias locais; (ii) o desenho das relações entre os poderes; (iii) a funcionalidade das instituições políticas. O que já não dá é fazer como o outro e deixar tudo como está, para ver como fica. EM NOME DE UMA MAIOR EFICÁCIA DA ADMINISTRAÇÃO DE PROXIMIDADE E POR UMA MELHOR QUALIDADE DE VIDA.
Refrerências:
- Celina SouzaRelações Intergovernamentais e a Reforma da Administração Pública Local;
- Amaury Patrick GreamaudDescentralização na América Latina: Benefícios, Armadilhas e Requisitos

Monday, May 11, 2009

SISTEMA DE GOVERNO: MAIS UM TABU?

«Existe uma grande diferença entre aquilo que podemos fazer e aquilo que devemos fazer.»
Juiz Potter Stewart
Estávamos em Janeiro - e Carlos Veiga era ainda apenas advogado e candidato à Presidência da República - quando preenchi a minha coluna com o tema «FORMAS DE ESTADO E SISTEMA DE GOVERNO», introduzindo o texto com uma sentença de Heinz G. Konsalik (ele mesmo, o tal das «NÚPCIAS DE SANGUE EM PRAGA»): La Liberté? Qu’est-ce que cela? Une plaisenterie que les politiciens se raconte à voix basse, en ricanant…
É que quando começaram as colocações a propósito da revisão constitucional pensei que todos podiam falar de tudo. Inclusive do sistema de Governo. E foi convencido de que poderia exercer, na plenitude e sem autorização prévia, a minha liberdade de expressão (a rainha das liberdades, no dizer de Humberto Cardoso) que fechei a coluna com a expressão do meu sentimento:
- «Se me fosse dado votar, votaria pelo reforço dos poderes presidenciais e pelo SEMI-PRESIDENCIALISMO. Mas colocaria uma condição à aceitação das candidaturas à mais Alta Magistratura da Nação: que os candidatos sejam obrigados a instruir os respectivos processos de candidatura com uma DECLARAÇÃO DE COMPROMISSO, em que se comprometem, preto no branco, a participar em, pelo menos, dois debates públicos durante a campanha eleitoral, na primeira volta, e em, pelo menos, um, na segunda, sendo o caso.»
Talvez porque fosse uma posição comungada por muita gente, ninguém chamou ninguém a capítulo, ninguém se sentiu no direito de condicionar a minha liberdade de expressão. Mais: um antigo candidato à suprema magistratura da Nação quis assumir a paternidade da posição, quase exigindo que fosse citado nas notas de rodapé, por antes (diz ele) ter assumido posição idêntica em livro que, diga-se de passagem, nunca li, nem penso, já agora, vir a ler.
Desta feita, e talvez porque já nem tanta gente assume a defesa do sistema presidencialista, surgem manifestações, com laivos de intolerância, em relação à posição alegadamente defendida em «2011: VEIGA versus NEVES», quando, também a fechar a coluna, registo «A questão que fica no ar é esta: PORQUE NÃO FAZER, JÁ AGORA, A OPÇÃO PELO SISTEMA PRESIDENCIALISTA DE GOVERNO?» E, curioso, é novamente um antigo candidato à Presidência da República que reage. Não, como o outro, para invocar a paternidade da ideia, mas esconjurando-a e exigindo pergaminhos especiais a quantos pretendam opinar sobre tal matéria.
E aí me rio, lembrando o pensamento de Konsalik em relação à Liberdade apregoada pelos políticos. De facto, o pessoal tem umas ideias muito giras acerca da liberdade de expressão: se se diz algo que pareça servir os seus interesses, tudo bem; mas se se diz algo com o qual não concordam (ou lhes pareça que possa prejudicá-los) fazem cair o Carmo e a Trindade. De facto, para o pessoal participante das lutas pelo poder, a liberdade é uma piada que contam em voz baixa, a uns papalvos, enquanto se riem por dentro, até mais não poder. Felizmente que, hoje, a gente sabe o que faz correr os políticos. E sabe-se também que, embora não lhes falte vontade de morder, já não têm licença para usar os dentes nos livres-pensadores.
Defendo a solução semi-presidencialista (e acreditem que eu sempre sei do que falo) e o reforço dos poderes presidenciais. Por convicção. E também por uma questão de coerência e de optimização dos recursos: se se investe na eleição directa do Chefe de Estado, o mínimo que se pode esperar é que ele tenha poderes condizentes com a sua forma de eleição, com a sua base de legitimação. Se quiserem que explicite em que se fundamenta a minha convicção… poderemos arranjar um espaço, outro que não o jornal, para discutir isso.
Mas não me repugna o sistema Presidencialista. Antes, pelo contrário. Funciona bem nos States, funciona no Brasil, funciona em alguns países da América Latina. A África… é a África. Não serve de paradigma. Ora, qualquer sistema de Governo funciona normalmente em estados de direito democrático, independentemente da latitude. O que falhou em África não foi o sistema Presidencialista, mas sim a DEMOCRACIA de tipo ocidental imposta a martelo pelas instituições de Bretton Woods e comandita. E diante da iminência da consolidação consuetudinária do presidencialismo de Primeiro-ministro, faz todo o sentido, sim senhora, questionar se não valerá a pena optar por um presidencialismo constitucional. E já agora - e para que fique registado - nunca me socorri da questão da economia de recursos para defender tal sistema.
Penso e falo em economia de recursos, quando constato a vigência do dito «presidencialismo do Primeiro-ministro» coabitando com um Chefe de Estado eleito por sufrágio universal, directo e secreto. É aí que questiono (e comigo muito boa gente) se valerá a pena gastar-se tanto dinheiro com uma eleição directa de um Chefe do Estado com tão limitados poderes. E entre nós nem se poderá dizer que a figura será um mero corta-fitas. Que, por aqui, quem corta as fitas são os Ministros, com o Chefe à cabeça. Perguntem aos Presidentes de Câmara.
E por aí se chega ao Parlamentarismo. Realizam-se as eleições legislativas; a maioria forma um Governo; e o Parlamento, enquanto colégio eleitoral, elege o Chefe de Estado. Prontos. Há uma única eleição consumindo recursos; há um Chefe de Governo forte; uma maioria que, por razões mais do que óbvias, não fiscaliza o Governo comme il faut; e há um Chefe de Estado que não levanta ondas e segue representando o Estado lá onde o Chefe do Governo lhe der espaço. Alguém se lembra quem era o Chefe de Estado em Cuba, quando Fidel era Primeiro-ministro? Alguém sabe o nome completo do Chefe de Estado de Israel? Não sabe? Não se escandalize: muito pouca gente sabe. E é esse o destino (o limbo e o esquecimento) dos Chefes de Estado nesses sistemas. Ainda assim, não sou contra o sistema. As regras do jogo são claras, e cada actor sabe, auparavant, o que lhe espera. O parlamentarismo não só não me repugna, como até seria capaz de fazer a sua apologia, em nome da coerência e da economia dos sempre escassos recursos públicos. Aí sim! É que não custa pouco uma eleição presidencial. Imaginem só que, para além dos elevadíssimos custos operacionais, o Tesouro paga aos candidatos, por cada voto, 400 mil réis. E só esta pequena fracção das despesas do Estado com uma eleição presidencial representa, num universo de 300 mil eleitores, qualquer coisa como 120.000.000$00 (de facto, muitíssimo mais do que os cerca de 12 mil contos de honorários pagos ao Primeiro-ministro durante toda uma Legislatura).

A liberdade de expressão duramente conquistada dá-nos o direito de dizermos o que pensamos, sem ter de pedir permissão a quem quer que seja. Aliás, bem lá no fundo, a reacção do antigo candidato tem o seu quê de interesse pessoal. E não estou criticando. Que os meus posicionamentos também têm a ver com a polarização do momento. Mas não escapa a ninguém que uma opção, AGORA, pelo sistema presidencialista cortaria cerce as aspirações de muito boa gente. Em 2011, José Maria Pereira Neves seria o candidato apoiado pelo PAI e Carlos Alberto Wahnon Carvalho Veiga teria o apoio do MpD. E não sobraria espaço para nenhuma outra candidatura com alguma hipótese de sucesso. E aí, muito boa gente ficaria offside. Estou pensando em Aristides Lima, em David Hopffer Almada e no Comandante Silvino da Luz, à esquerda; em Jorge Carlos Fonseca, em Jorge Santos e em Isaura Gomes, à direita. Nenhum deles gostaria, portanto, que se aventasse a hipótese de mudança para o Presidencialismo, numa oportunidade que consideram única e sua. Em podendo, tudo fariam para obstar a uma tal solução. E compreender-se-ia bem a reacção deles, coerente com as suas aspirações. Mas que não se iludam: não enganariam ninguém se dissessem que se opõem ao sistema presidencialista porque… estamos em África. E conquanto seja verdade que o Parlamentarismo mitigado ainda não tenha entrado em panne, nos 16 anos de sua vigência, sua bondade, brandida AGORA por qualquer dos potenciais prejudicados por eventual opção pelo sistema presidencialista, soaria sempre a defesa de interesse pessoal. Pessoalíssimo.
E, chegado a este ponto, apraz-me registar algumas questões, polémicas qb: PORQUÊ BLOQUEAR OU TENTAR BLOQUEAR O DEBATE SOBRE O SISTEMA DE GOVERNO? OU PORQUÊ CIRCUNSCREVÊ-LO A UM NICHO DE ILUMINADOS? NÃO SERIA MAIS AVISADO ESTENDÊ-LO A TODOS OS CABO-VERDIANOS, NAS ILHAS E NA DIÁSPORA? OU SERÁ QUE O SISTEMA DE GOVERNO ESTÁ FADADO A SER O NOVO TABU-CV?