Tuesday, March 30, 2010

MARÇO, DESCENTRALIZAÇÃO E FUNJE NA CACHUPA

“Eu acredito demais na sorte. E tenho constatado que, quanto mais duro eu trabalho, mais sorte eu tenho.”
THOMAS JEFFERSON
Em Luanda, na Praia e em Sanvicente, no passado e no presente, na alma e no coração, no funje e na cachupa, temos a amizade na dose necessária para enfrentar os desafios deste milénio e do futuro que há-de vir depois disso. É assim que a intérprete e enterteiner ARI cantou a amizade Angola/Cabo Verde,em espectáculo na ilha de Luanda, no mês de Março que acaba de nos dizer goodbye, para gáudio dos cotas presentes.
E no último Domingo desse mesmo Março - que nos conduziu a Luanda – comemorámos, em S. Jorge, os 80 anos de dona Lídia (minha mãe durona), os 89 de Ludgero (meu pai, amantíssimo), os 52 (só?!) do Pina (amigo do peito). Na mesma data comemorou-se, na Assomada, o dobrar do cabo das Tormentas da Maria José e do José Maria. Longa vida a todos estes marcianos (de Março, não haja confusões!). E aos demais, também, é claro.

Mas nem só de comemorações viveu o mês findo. Apresentou-se o projecto da Lei-Quadro da Descentralização e fiquei sabendo da traição que a vida (ou terá sido a morte?) pregou a Veiga na segunda volta da eleição presidencial de 2001. Ele há cada estória rolando nas festinhas de amigos… Comecemos pelo fim:

1. Nas comemorações do 80º aniversário de Dª Lídia, em São Jorge, narrou-se, na maior «discontra», a estória de um amigo comum, falecido na véspera da Segunda Volta da eleição presidencial de 2001, a tal (e única) em que estiveram frente-a-frente Pedro Rodrigues Pires e Carlos Wahnon Veiga. Esse amigo, adepto ferrenho do MpD e fã de Carlos Veiga, apostava, dobrado contra singelo, em como Veiga ganharia a Pires, tranquilamente. E tinha um argumento de peso: «só em minha casa, são 12 (doze) votos garantidíssimos» - garantia. Quis o destino que o nosso amigo falecesse exactamente na véspera da ida às urnas, inviabilizando assim tanto o seu voto como o dos demais onze membros do clã que chefiava. E por ironia desse mesmo destino (malandro ele, né?) Veiga viria a perder por… 12 (doze) votos. Um dos convivas (um desses espirituosos que sacam piada ao acontecimento mais sério) saiu-se com esta: «e quem terá passado o atestado de óbito do homem?» Ninguém disse nada, mas ficaram no ar algumas questões: «conhecerá Veiga este episódio?»; «e se, por uma dessas partidas que o destino nos prega, tiver sido o Dr. Sidónio a atestar o óbito do Agosto?» Ao menos compreendia-se melhor os engulhos de Veiga quando o tema é Sidónio Fontes Monteiro.
2. Mudando de assunto. Não vi ainda o projecto da Lei-Quadro da Descentralização (a versão final do Governo), mas saúdo a opção pelas autarquias supra e infra municipais. Em outra oportunidade enumerara já as vantagens, para uma ilha como Santiago, de ter uma autarquia supra-municipal no que concerne ao planeamento do desenvolvimento, gestão de sinergias, implantação de infra-estruturas, etc. A asfaltagem da estrada de montanha Praia/Santa Catarina/Tarrafal jamais teria se iniciado em… São Domingos. No que a autarquias infra-municipais diz respeito, só direi que a opção chega com um grande atraso. Tivesse acontecido antes, não teríamos já todas as freguesias (circunscrições religiosas) - excepção feita a São Lourenço (Fogo) e a uma ou outra freguesia de Santo Antão - erigidas em municípios/concelhos (circunscrições administrativas). Não seria agora uma boa oportunidade para se repensar a divisão administrativa do país? Esta não seria a ocasião para a consagração das regiões (administrativas), coincidindo, cada uma delas; com o ente ILHA, e superiormente administradas pelos órgãos da autarquia supra-municipal? Aliás, a questão põe-se apenas em relação às ilhas com mais de um município. As demais, afinal a maioria - Sanvicente, Sal(?), Boavista, Maio e Ilha Brava – constituem-se, naturalmente, em regiões. E já agora, porque não rever a decisão da cisão da ilha de Santiago em dois círculos eleitorais? Ilha, Região Administrativa, Região Plano, Círculo Eleitoral, coincidindo no mesmo espaço físico, congregando as mesmas pessoas… seria, sem sombras para dúvidas, um grande passo. E, convenhamos, resolveria, por antecipação, alguns constrangimentos (Já estão a imaginar, por exemplo, o que vai acontecer nas eleições legislativas de 2011 no círculo eleitoral de Santiago-Sul? O mais certo é o primeiro responsável da região política ter de ceder o lugar de cabeça-de-lista ao Presidente do Partido (o qual pode até ser natural de outro círculo) ao contrário do que acontecerá nas demais regiões políticas. E alguém acredita que em alguma outra Região se aceitaria como cabeça de lista um candidato que fosse (natural ou residente) da região política Santiago-Sul? Digam ao Felisberto, ao Agostinho ou ao José Filomeno, que sugiram aparecer como cabeça-de-lista em Santiago Norte (ou outro círculo qualquer), alegando que são «obrigados» a ceder a primazia, na lista de Santiago-Sul, ao Presidente do Partido e candidato a Primeiro-ministro, para verem a resposta que receberiam. Se Santiago, à semelhança das demais ilhas, se constituísse em um único círculo eleitoral, obviar-se-ia tal constrangimento. Para além do facto de se poder evitar alguma fragmentação de vontades, nesta ilha que se esforça ainda por consolidar a sua unidade interna.

3. Março permitiu-nos, ainda e a par das sessões de trabalho, revisitar Luanda. Talvez seja mais próprio falar de Luandas (não confundir com Lundas): a Luanda antiga, transformada em urbe de torres e trânsito enervante; e a nova Luanda - a Luanda Sul - que se estrutura como cidade moderna, construída de raiz, e não acessível a todas as bolsas. Rever Luanda, ajuizar as possibilidades de uma forte intervenção em engenharia do tráfego, inventariar os nichos do magnífico mercado que é a capital da RPA, é um exercício estimulante. Tivesse menos 20 anos, e ousaria requerer ao Governo Provincial de Luanda a concessão da exploração dos estacionamentos da Capital angolana. Depois, seria montar a necessária engenharia financeira e participar da reorganização de uma das mais promissoras metrópoles da África Austral: construindo estacionamentos particulares, organizando os espaços públicos da cidade e contribuindo para uma maior ordem na utilização dos logradouros da urbe. Com a EPEL – Empresa Provincial de Estacionamentos de Luanda – em pouco tempo, estaria todo mundo ganhando: os promotores do negócio, os automobilistas, os peões, os poderes, os turistas, a cidade, que sei eu…

4. Fruto de uma relação com passado e presente; resultante de uma amizade de alma e coração; um futuro com bué de FUNJE e muita CACHUPA, para TODO MUNDO (de Sanvicente, da Praia, de Luanda), o abraço Angola/Cabo Verde é um trunfo que deve ser jogado no momento certo.
É isso mesmo, ARI. FUNJE NA CACHUPA, sim senhora. Para todos.

Tuesday, March 2, 2010

CULTURA

Continuo acreditando que
- se o GOVERNO (E SUAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS), as AUTARQUIAS LOCAIS e os AGENTES CULTURAIS CIVIS, juntos, mergulharem nas nossas TRADIÇÕES, USOS E COSTUMES, VALORES E PRINCÍPIOS, CRENÇAS E DEMAIS PATRIMÓNIO CULTURAL, na definição do PROGRAMA DE GOVERNO;
- se, mais tarde, se juntarem, de novo, para a definição das POLÍTICAS PÚBLICAS;
- e se aceitarem a delimitação de áreas de intervenção na operacionalização das POLÍTICAS PÚBLICAS
- INTERVENÇÕES ESTRATÉGICAS a cargo do Governo da República, e conduzidas pelos INSTITUTOS e outras AGÊNCIAS PÚBLICAS;
- INTERVENÇÕES TÁCTICAS a cargo das AUTARQUIAS LOCAIS, em parceria e concertação com os AGENTES CULTURAIS CIVIS (cidadãos, associações, ONGs, etc.);
- INTERVENÇÕES OPERACIONAIS a cargo dos cidadãos, das associações, fundações, escolas, ONGs e empresas,
as coisas podem correr bem, ainda que não haja um Ministério que se dedique exclusivamente à Cultura.
Fundamental é que os AGENTES CULTURAIS CIVIS entrem já na fase de definição do PROGRAMA DE GOVERNO para a Legislatura; participem da formatação das POLÍTICAS PÚBLICAS; entrem no planeamento das INTERVENÇÕES CULTURAIS centrais; sejam tidos e achados nas intervenções de cariz nacional; e assumam o planeamento e a operacionalização das INTERVENÇÕES LOCAIS.
A bola está do lado dos SUJEITOS CULTURAIS nacionais, a quem compete, AGORA, fazer o pressing necessário. Afinal, são SUJEITOS da CULTURA e não OBJECTOS da CULTURA.

Monday, March 1, 2010

DESENCONTRO OFERTA/PROCURA

“O segredo do verdadeiro poder radica no seguinte: aprender, através da prática constante, a administrar os nossos recursos e a concentrá-los, num dado momento, sobre um determinado ponto.”
JAMES ALLEN
A oferta e a procura cruzam-se no espaço e no tempo, dando corpo ao que convencionámos chamar de mercado. Quer se fale de marcado de bens e serviços, quer se fale de mercado de trabalho, estaremos sempre falando de gente que tem algo que quer vender (bens, serviços ou força de trabalho) e gente que quer comprar (o consumidor, o empregador, etc.). Mas há um mercado onde, via de regra, a oferta e a procura têm uma relação em tudo parecida com a que existe entre duas rectas paralelas entre si – nunca se encontram. Estou pensando no «mercado» político. Sentindo necessidade de relativizar um pouco mais, coloco a questão a nível do «mercado» político cabo-verdiano (espaço), nos momentos de ajustes e/ou remodelações do Governo, em ano pré-eleitoral (tempo).
As remodelações em final de mandato (a menos de 12 meses das eleições gerais) são momentos em que há muita disponibilidade, (GRANDE OFERTA) de candidatos aos lugares a vagar e um amplo movimento de procura (GRANDE PROCURA), pelo Chefe do Governo, de gente para ocupar as cadeiras ocupadas pelos elos fracos da cadeia (remodeláveis). Havendo OFERTA e PROCURA, a questão que se impõe é: PORQUE É QUE DESSAS REMODELAÇÕES NÃO SAI GRANDE COISA? O fenómeno pode ter mais do que uma interpretação.
A primeira, ou a principal, é a de que a intersecção dos dois conjuntos (o da oferta e o da procura) resulta em um conjunto vazio. Quer isto dizer que os dois conjuntos não têm nenhum elemento em comum: o que o Primeiro-ministro PROCURA não existe no universo dos DISPONÍVEIS.
Mas significará isso que, no país, a bolsa dos ministeriáveis está tão rarefeita quanto sublinhara Tony Pascoal na década de 90? Pode ser… pode não ser. Pascoal considerou lógica a sua chamada para o Governo, diante do facto de os ministeriáveis serem tão poucos; Zona e Marilene registaram, em momentos diferentes, quão poucos são os quadros nacionais capazes de discorrerem, com coerência e algum nível, sobre questões da actualidade; José Maria Neves, na remodelação de 2008, dissera que aquela tinha sido a “remodelação possível”, numa clara alusão à indisponibilidade de soluções, ao menos no seu universo de recrutamento.
Hoje, passados 35 anos sobre a independência nacional, qual a verdade? O deficit de ministeriáveis regista-se a nível nacional ou apenas a nível do restrito universo de recrutamento dos chefes de Governo? Por outras palavras, a remodelação falhada de Pires, em 1990, o frágil Governo de Gualberto do Rosário, do ano 2000, e as duas últimas remodelações de José Maria Neves (2008 e 2010), traduzem a falta de alternativas no universo nacional de Recursos Humanos, a carência da necessária qualidade no restrito universo dos militantes dos respectivos partidos, ou simplesmente a indisponibilidade dos poucos ministeriáveis para abraçarem a aventura de ser Ministro por uns (poucos) meses? O que responderiam Pires, Do Rosário e Neves?
Em relação à última remodelação JMN diz que montou uma boa equipa, um elenco voltado para o futuro, mas que conta com leituras diferentes, uma vez que cada um lê e compreende em função do background pessoal; já Carlos Veiga achou que se tratou de mera operação de cosmética, que tudo ficou na mesma, e que as soluções esperadas ficaram adiadas, mais uma vez. As questões que essas declarações me suscitaram foram estas: JMN APRESENTOU O SEU «DREAM TEAM»? NÃO TERÁ LEVADO “NEGAS” DE GENTE COM QUEM ACHAVA QUE PODIA CONTAR? NÃO ESTIVÉSSEMOS A MESES DAS ELEIÇÕES GERAIS, NÃO EXPERIMENTARIA ALARGAR O SEU UNIVERSO DE RECRUTAMENTO?
Existe, em qualquer latitude, uma grande diferença entre montar um Governo (no início da Legislatura) e fazer uma remodelação a meses do termo da Legislatura. No primeiro caso, chovem os candidatos disponíveis para o Governo, para as Embaixadas e para os Institutos Públicos. A OFERTA é grande e o Primeiro-ministro vê-se grego para encaixar todos os militantes e amigos DISPONÍVEIS. Só muito dificilmente consegue abrir espaço para um ou outro «independente», ainda que inequivocamente detentor das desejadas qualificações. Já na remodelação em final de mandato, os ministeriáveis, os bons quadros, sejam eles militantes (ou amigos) do partido do Governo, sejam «independentes» não se disponibilizam para integrar o Governo e o Primeiro-ministro vê-se, de novo, grego para apresentar um elenco convincente. Precisando passar a imagem de um Governo forte o suficiente para dar resposta aos problemas prementes (no caso presente – 2010 – soluções para os operadores económicos e segurança para os cidadãos em geral) e necessitando impressionar o eleitorado para ganhar vantagem no ciclo eleitoral que se avizinha, o primeiro grande dilema do Chefe do Governo é: opto por militantes e amigos, ainda que medíocres, ou ganho coragem e aposto em alguns independentes, dos bons? O dilema seguinte tem a ver com a remodelação em si, diante do grande grupo de gente, sem a necessária qualificação, que se põe em bicos dos pés, se oferecendo para entrar no Governo, e do restrito ou deserto universo de gente com qualificações que respondem com um «SIM» ao convite do Chefe do Governo: FAÇO OU NÃO FAÇO A REMODELAÇÃO?
Tendo decidido pela remodelação, e não contando com grandes capacidades disponíveis, nem querendo injectar mediocridade ao governo proveniente da dita «remodelação possível» de 2008, resultam naturais não só a indecisão de JMN (FAÇO OU NÃO FAÇO?), como as parcas soluções encontradas. Afinal, nada muito difícil de decifrar.
A dificuldade de leitura que o Premier vaticinou deve ter a ver com o facto de alguém poder questionar porque não fez qualquer mexida no sector da Segurança e Ordem Pública ou porque não foi até ao fim na remodelação da Equipa Económica do Governo. De facto, fica difícil compreender porque o Chefe do Governo, em matéria de Segurança e Ordem, havendo alternativas, «deixou tudo como está, para ver como fica». Em relação à segunda questão, resulta também difícil entender porque não deu o golpe de misericórdia à Ministra Cristina Duarte: de, claramente, líder da equipa económica do Governo - pelo menos de 2008 a esta parte - a Ministra já foi obrigada a engolir o slogan do Chefe “SALÁRIO MÍNIMO ainda este ano”, sendo ela contra a medida, neste momento; a sofrer, calada, perante o novo cavalo de batalha do Chefe “13º SALÁRIO já na próxima Legislatura”, sendo ela “alérgica” ao princípio, neste momento); e agora ficou praticamente confinada ao “DEVE/HAVER”e limitada a assinar em baixo, nos compromissos da nova liderança da equipa económica do Governo, deslocada que foi esta para a Chefia política do Executivo. Tendo decidido ceder à pressão dos organismos representativos da classe empresarial, não lhe teria sido mais misericordioso remodelar a senhora? Impossível, portanto, não fazer a leitura, mais do que óbvia: o Premier não encontrou ninguém que quisesse assumir a batata quente em que se deixou transformar o Ministério da Administração Interna (nem militante, nem amigo, mormente independente), e terá levado uma desconcertante «nega», à última hora, para a pasta das finanças.
Seja qual for a verdade, numa coisa todos estaremos de acordo: é preciso, EM PROCESSO DE URGÊNCIA, trabalhar no sentido da MELHORIA DA QUALIDADE DA OFERTA, rompendo, ao mesmo tempo, com determinados complexos, a modos de se AMPLIAR O UNIVERSO onde os partidos políticos vão recrutar mulheres e homens para formar os Governos de que o país vai precisando, a cada momento, em seu percurso.