Thursday, May 29, 2008

GESTÃO DE SEQUELAS

“A liderança é uma escolha construída de dentro para fora, baseada no carácter. Os grandes líderes libertam o talento colectivo e a paixão das pessoas, orientando-as para os objectivos certos.”

Stephen R. Covey

Os confrontos - sejam eles desportivos, políticos, comerciais, bélicos, ou de que espécie forem – raramente deixam tudo como estava. Na prática, o resultado nunca é um «match nulo»; o empate é apenas aparente. Na realidade, há sempre vencedores e vencidos. Daí que resulta haver sempre sequelas que clamam por uma administração inteligente.

O que acontece com o grupo vencedor*?
O grupo vencedor tanto pode (1) reter a sua coesão e até tornar-se mais coeso; como (2) distender-se, libertando-se das tensões e perdendo o espírito de luta, tornando-se complacente, casual e brincalhão (estado de euforia); como (3) pode inclinar-se para uma maior cooperação intragrupal, preocupando-se com as necessidades dos membros, com pouca ou nenhuma disposição para o trabalho e para a realização de tarefas; como pode ainda (4) tornar-se complacente, se se convencer que a vitória só veio confirmar o estereótipo positivo que tinha de si mesmo e o estereótipo negativo do grupo adversário (aqui, restam poucas condições para uma reavaliação das operações do grupo, a fim de melhorá-las).
Da forma como tais estados de espírito forem geridos dependem o sucesso ou o insucesso nos embates subsequentes. E é aí que entra o líder e a equipa dirigente do grupo.
Em uma situação em que o grupo tenda a manter e a reforçar a sua coesão interna, caberá ao líder administrar incentivos necessários para evitar qualquer quebra no grupo, vacinando-o contra eventual desagregação derivada da tensão necessária para manter o todo coeso. Ao estado de euforia, do «ufa! Ganhámos, somos o máximo», com forte tendência para prolongar os festejos indefinidamente, em prejuízo do trabalho necessário, o líder tem de responder com um balde água fria, para esfriar os ânimos, e um veemente apelo ao trabalho. E ele tem de dar o exemplo. Não só controlando a própria euforia, como, também, organizando grupos de trabalho para a condução das coisas e para a preparação para os novos embates. Caberá também às lideranças do grupo intervir forte, e em tempo oportuno, para pôr um termo às sessões conjuntas para lamber as feridas da «batalha» ganha. Terminou uma «batalha», mas a luta continua. É preciso curar as feridas sim, mas muito mais ingente é o retorno ao trabalho, cada um buscando dar conta das tarefas que lhe estão confiadas. O mais complicado mesmo para as lideranças é dar conta da mais terrível das sequelas: «NÓS SOMOS OS MOCINHOS DA FITA, ELES SÃO OS BERAS E VAMOS GANHAR POR TODOS OS SÉCULOS SECULORUM, AMÉN! Sombra e água fresca, que somos os senhores do tempo». A história recente do país teve um episódio destes: os vencedores de um pleito acamparam à sombra da bananeira, aguardando o apito final do árbitro para levantarem as Taças nas competições seguintes. Quando viram as taças nas mãos dos BERAS de ontem gritaram «AQUI D’EL REI, QUE HÁ FRAUDE!» Já era «too late», como diz o mercano. E a culpa é, necessariamente, da liderança que embarcou nos mesmos devaneios e não teve engenho, nem arte, para entender e fazer os seus entenderem que «uma coisa» é uma coisa e «outra coisa» é outra coisa.

E o que acontece com o grupo vencido*?
O grupo perdedor tanto pode (1) negar ou distorcer a realidade da derrota, mormente se a vitória do adversário tenha sido por pequena margem e num jogo muito disputado; como, (2) em caso de aceitação da derrota, se desunir, trazendo à tona conflitos mal resolvidos, ocorrendo, não raras vezes, brigas, tudo isso num esforço para encontrar as causas da derrota. Pode também dar-se o caso de (3) os vencidos ficarem mais tensos, prontos para trabalharem para a desforra e desesperados para encontrar alguém ou alguma coisa para cima de quem atirar as culpas pelo desaire; como acontecer o grupo tender (4) para pequena ou nula cooperação intragrupal, pouco se preocupando com as necessidades dos membros, mas muito envolvido com a recuperação através de um esforço, por vezes, sobre-humano; como (5) pode, ainda, dar-se o caso de os vencidos apostarem em conhecerem-se melhor, enquanto grupo, forçando uma reavaliação das percepções, já que o estereótipo positivo de si próprio e o estereótipo negativo do adversário foram perturbados pela derrota (como consequência, pode acontecer o grupo perdedor se reorganizar e se tornar mais coeso e eficiente, desde que aceite a derrota com naturalidade).
Como no caso do grupo vencedor, aqui também é preciso saber gerir as sequelas. Dependendo da forma como a gestão se faça, tanto pode acontecer o desaparecimento, puro e simples, do grupo derrotado, como é possível que o grupo se mobilize e venha a conseguir uma retumbante vitória no pleito seguinte.
Negar ou distorcer a realidade da derrota é comportamento infantil que o líder precisa combater. Desde logo, dando o exemplo; depois, demonstrando que uma derrota não é o fim do Mundo; e, principalmente, demonstrar (como um bom General o faria) que perder uma «batalha» não significa que se tenha perdido a «guerra». Barafustarem-se uns contra os outros, buscando cabelo em ovo ou discutindo o sexo dos anjos, não se chega a lugar nenhum. Compete ao líder convocar o fórum apropriado para dirimir as diferenças, para resolução definitiva dos tais casos não resolvidos ou mal resolvidos, e para que se esclareça, de uma vez por todas, quem é quem e porquê. O líder que queira tirar o grupo do «buraco» não pode permitir que as pessoas ocupem posições no grupo em nome de códigos ou de acordos secretos: os homens do topo têm de ser aqueles que trazem mais valias para o grupo, que sejam líderes na respectiva «ribeira» ou sejam ganhadores; quem não traga vantagens para o grupo, ou perca sistematicamente os desafios que lhe são confiados, deve ir para a base. Competirá, ainda, à liderança (entendida aqui como a equipa responsável pela gestão do grupo) gerir as coisas de modo a tirar partido da vontade do grupo em trabalhar para a desforra; a reforçar a cooperação intragrupal; a apoiar os membros na sua introspecção e subsequente revisão de estereótipo; e, principalmente, a ajudar o grupo a aceitar a derrota com naturalidade (e como consequência da desatenção aos sinais da sociedade e de erros de avaliação). E, já agora, TAMBÉM, que não é nada do outro mundo cumprimentar o grupo vencedor, por este ter tido a perspicácia de captar os sinais dos tempos e das gentes.



* pesquisa FUNDAP

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