Tuesday, November 23, 2010

QUEM TRAMOU FILÚ VIEIRA?

“Para o desesperado, a partida não parece menos impossível do que o retorno.”
THOMAS MANN
Quando a arraia miúda dos partidos sente que as coisas não estão como deviam estar, quando o seu faro diz que há algo mariado no Reino da Dinamarca, começa a ter aquela reacção típica do desgraçado abandonado em pleno deserto após uma lauta refeição rica em cloreto de sódio. Instala-se a confusão mental, sobrevêm as miragens, perde o norte e, se ninguém lhe dá a mão, pode acontecer o pior. Na fase de delírios e devaneios começam a ser acometidos pelo blue devil e aí é um Deus nos acuda. Consegue até identificar soluções para equações que tinham tantas incógnitas que até pareciam insolúveis. E, o pior, é que acredita piamente nas visões, nos deslumbramentos, nos blue devils.
Descobriu-se agora, por exemplo, que Filú foi um grande Presidente de Câmara, que fez obras maravilhosas, e que se mais não fez, foi porque uma certa Comunicação Social e a Associação ventoinha Pró-Praia não deixaram.
Filú é membro fundador da Associação PRÓ-PRAIA, tinha (e tem) relação de amizade com os principais dirigentes da PRÓ-PRAIA do tempo em que ele era Presidente e sempre teve com a Associação uma relação de respeito mútuo. É certo que a Associação cobrava os atrasados de Filú. Mas, verdade seja dita, quando a PRÓ-PRAIA interpelava Filú, levava numa mão os problemas identificados e, noutra, propostas de solução. A Associação elencou os problemas que encrencavam a cidade, e apresentou, junto, propostas de solução; identificou os problemas que afectavam as cercanias do mercado do Plateau e avançou com um PLANO DE RETORNO À NORMALIDADE NAS CERCANIAS DO MERCADO; identificou na proposta de Orçamento Municipal situações que constrangiam o futuro da cidade e pôs o dedo na ferida, sugerindo hipóteses para uma saída, mais ou menos airosa; a 13 meses das eleições, submeteu ao Presidente um conjunto de coisas que tinham ficado por fazer - e que, a não serem feitas, poderiam prejudicar o seu projecto de reeleição – e avançou aquelas estrategicamente relevantes e que poderiam ser feitas no decurso dos 13 meses. Chamou-se-lhe a prova de recurso da Câmara de Filú. Mas as coisas não aconteceram. Não se sabe ao certo se por Filú não ter levado as sugestões a sério ou se por os seus Conselheiros Populares lhe terem assoprado que, afinal, a Associação que ajudou a fundar, e de que era membro de pleno direito, à qual garantiu um belíssimo espaço no centro da cidade e que recebeu várias vezes no seu Gabinete, era, afinal, uma Associação... ventoinha, e, ipso facto, sua inimiga.
A verdade é que a dita Associação ventoinha nunca fez fretes a ninguém: nem ao MpD - que nunca escondeu, através de dirigentes do segundo e terceiro escalões, que contava com uma mãozinha na oposição à Câmara de Filú; nem o PAI – que através de tambarinas de segunda e terceira extracções, manteve a secreta esperança de que, com papas e bolos, poderia contar com o nosso beneplácito e, principalmente, com o nosso silêncio. Todos aqueles que, tácita ou expressamente, quiseram controlar a Associação PRÓ-PRAIA, deram com os burros na água. A Associação manteve-se firme na sua divisa: PARCEIRA DOS PODERES E DEFENSORA INTRANSIGENTE DOS INTERESSES DA CIDADE E DE SUAS GENTES. Parceiros enquanto se trabalhasse pela Praia e por suas gentes; e opositor, firme e ragalado, se e quando os interesses da Praia e de suas gentes fossem beliscados. Isso valeu-nos epítetos diversos, a nível local e nacional, mas valeu a pena. Existem por este país inúmeras associações, PRÓ-Qualquer-coisa, inspiradas no nosso posicionamento inequívoco a favor (pró) da Praia e jamais contra quem quer que fosse.
Lembro-me de, enquanto Presidente da Associação PRÓ-PRAIA, ter encabeçado várias delegações que foram recebidas pelo senhor Primeiro-ministro e pelo edil da Praia e recebemos a visita, na nossa sede, do Chefe do Governo. Na sede e no Palácio da Várzea, apresentámos ao PM um rol de preocupações e apresentamos resenhas do que entendíamos serem soluções para os problemas arrolados. E, vezes sem conta, apelámos ao senhor Primeiro-ministro que apoiasse a Câmara da Capital, insistindo no ponto de ela ser a cidade de todos nós, de ser problemática; de ainda não conseguir operacionalisar a sua capacidade de gerar recursos; de haver soluções que ultrapassam a capacidade financeira do município. Pedimos ao senhor Primeiro-ministro apoio para a Câmara para a ultimação do Plano Director Municipal (PDM) e dos Planos Detalhados, quando soubemos que as coisas estariam atrasadas por falta de recursos.
A Associação foi criada com fins simples e incorruptíveis, a saber:
1. Fomentar o surgimento de associações nas comunidades que ainda não tinham uma associação;
2. Liderar a federação das associações dos locais de residência em prol de intervenções concertadas;
3. Apoiar as comunidades no levantamento das suas necessidades e na definição das prioridades;
4. Levar as necessidades e as prioridades das comunidades para os centros decisão (CMP e Governo);
5. Assessorar as comunidades quando e se convidadas a tomarem parte na costura de orçamento participativo do município;
6. Apoiar o município da Capital na sua reivindicação por um orçamento de investimentos do Estado também participativo;
7. Assumir o papel de parceira dos poderes, com eles colaborando para a realização dos anseios dos munícipes da Praia;
8. Não tergiversar e assumir um papel de firme oposição às iniciativas que ameacem a Praia e suas gentes.
Uma Associação assim pensada, não tem espaço, nem tempo, para tramar ninguém. Aliás, quem tramou Filú foi a cúpula do PAI residente na Praia. Não escapou a ninguém o balão de ensaio lançado ao ar pelo partido de Filú, exactamente a meio do segundo mandato deste a frente da CMP. Cristina Fontes, José Maria de Pina, Eduardo Monteiro, e outros que tais, eram acenados como possíveis candidatos da Estrela Negra às autárquicas de 2008, numa mensagem clara para Filú: NÃO SERÁS O CANDIDATO DO PAI À CMP. Filú reagiu, desafiou o aparelho do seu partido, ameaçou partir a louça e ir à liça ancorado apenas na sua popularidade junto das massas. E, abandonado pelo seu partido, perdeu as eleições. Só que… não perdeu sozinho. O PAI perde as eleições, no cômputo geral, ficando sem qualquer Câmara no recém-criado círculo eleitoral de Santiago-Sul.
A tese de que o PAI tramou Filú assenta-se em uma análise fria dos resultados das eleições em pauta. O MpD conseguiu 23.906 votos, Filú 23.347 e UCID 433. Votos brancos: 752. Quer dizer, que o MpD tem apenas mais 559 votos do que Filú, número inferior aos votos brancos depositados nas urnas. E quem teria votado em branco? Rabentolas fazendo aquela fila incrível (resultado da redução de números de mesas de votação), ao Sol e ao vento e não votar MpD? Não cola! Tambarinas enfrentando filas quilométricas, em dia de vento e muito pó, e dobrar o papel em quatro, sem o X na Estrela Negra? Não convence! Onde enquadrar, então, os 752 eleitores que votaram em branco? Não foram eleitores quaisquer. Foi gente consciente, que percebe a força do discurso mudo contido no VOTO BRANCO, e que quis dar uma lição a alguém. Teriam de ser pessoas que, de forma alguma, nem em benefício da dúvida, votariam em Ulisses; mas que pretendiam dar uma lição ao Filú. Quem acham que teria elucubrações tão sinistras e assumido atitude tão firme, senão políticos que sabiam o que faziam, não pertencentes à área política do MpD (nem militante, nem amigo, nem simpatizante) e que tinham motivos para querer dar um correctivo ao Filú? Quem, senão aqueles que postularam a sua substituição quando o seu segundo mandato ainda ia a meio? Quem, senão aqueles que Filú desafiou, crendo-se mais forte do que o seu partido e capaz de ganhar com uma campanha sem símbolos partidários? Quem tramou Filú Vieira?! Não foi nenhuma Associação ventoinha, nem tampouco o MpD – que ficou espantada quando a vitória lhe caiu no regaço. Foram os barões do seu partido com residência eleitoral na cidade da Praia.
Valendo o que vale esta afirmação, cá fica, entretanto: EU VOTEI FILÚ, apesar dos pesares.

No comments: