Monday, March 1, 2010

DESENCONTRO OFERTA/PROCURA

“O segredo do verdadeiro poder radica no seguinte: aprender, através da prática constante, a administrar os nossos recursos e a concentrá-los, num dado momento, sobre um determinado ponto.”
JAMES ALLEN
A oferta e a procura cruzam-se no espaço e no tempo, dando corpo ao que convencionámos chamar de mercado. Quer se fale de marcado de bens e serviços, quer se fale de mercado de trabalho, estaremos sempre falando de gente que tem algo que quer vender (bens, serviços ou força de trabalho) e gente que quer comprar (o consumidor, o empregador, etc.). Mas há um mercado onde, via de regra, a oferta e a procura têm uma relação em tudo parecida com a que existe entre duas rectas paralelas entre si – nunca se encontram. Estou pensando no «mercado» político. Sentindo necessidade de relativizar um pouco mais, coloco a questão a nível do «mercado» político cabo-verdiano (espaço), nos momentos de ajustes e/ou remodelações do Governo, em ano pré-eleitoral (tempo).
As remodelações em final de mandato (a menos de 12 meses das eleições gerais) são momentos em que há muita disponibilidade, (GRANDE OFERTA) de candidatos aos lugares a vagar e um amplo movimento de procura (GRANDE PROCURA), pelo Chefe do Governo, de gente para ocupar as cadeiras ocupadas pelos elos fracos da cadeia (remodeláveis). Havendo OFERTA e PROCURA, a questão que se impõe é: PORQUE É QUE DESSAS REMODELAÇÕES NÃO SAI GRANDE COISA? O fenómeno pode ter mais do que uma interpretação.
A primeira, ou a principal, é a de que a intersecção dos dois conjuntos (o da oferta e o da procura) resulta em um conjunto vazio. Quer isto dizer que os dois conjuntos não têm nenhum elemento em comum: o que o Primeiro-ministro PROCURA não existe no universo dos DISPONÍVEIS.
Mas significará isso que, no país, a bolsa dos ministeriáveis está tão rarefeita quanto sublinhara Tony Pascoal na década de 90? Pode ser… pode não ser. Pascoal considerou lógica a sua chamada para o Governo, diante do facto de os ministeriáveis serem tão poucos; Zona e Marilene registaram, em momentos diferentes, quão poucos são os quadros nacionais capazes de discorrerem, com coerência e algum nível, sobre questões da actualidade; José Maria Neves, na remodelação de 2008, dissera que aquela tinha sido a “remodelação possível”, numa clara alusão à indisponibilidade de soluções, ao menos no seu universo de recrutamento.
Hoje, passados 35 anos sobre a independência nacional, qual a verdade? O deficit de ministeriáveis regista-se a nível nacional ou apenas a nível do restrito universo de recrutamento dos chefes de Governo? Por outras palavras, a remodelação falhada de Pires, em 1990, o frágil Governo de Gualberto do Rosário, do ano 2000, e as duas últimas remodelações de José Maria Neves (2008 e 2010), traduzem a falta de alternativas no universo nacional de Recursos Humanos, a carência da necessária qualidade no restrito universo dos militantes dos respectivos partidos, ou simplesmente a indisponibilidade dos poucos ministeriáveis para abraçarem a aventura de ser Ministro por uns (poucos) meses? O que responderiam Pires, Do Rosário e Neves?
Em relação à última remodelação JMN diz que montou uma boa equipa, um elenco voltado para o futuro, mas que conta com leituras diferentes, uma vez que cada um lê e compreende em função do background pessoal; já Carlos Veiga achou que se tratou de mera operação de cosmética, que tudo ficou na mesma, e que as soluções esperadas ficaram adiadas, mais uma vez. As questões que essas declarações me suscitaram foram estas: JMN APRESENTOU O SEU «DREAM TEAM»? NÃO TERÁ LEVADO “NEGAS” DE GENTE COM QUEM ACHAVA QUE PODIA CONTAR? NÃO ESTIVÉSSEMOS A MESES DAS ELEIÇÕES GERAIS, NÃO EXPERIMENTARIA ALARGAR O SEU UNIVERSO DE RECRUTAMENTO?
Existe, em qualquer latitude, uma grande diferença entre montar um Governo (no início da Legislatura) e fazer uma remodelação a meses do termo da Legislatura. No primeiro caso, chovem os candidatos disponíveis para o Governo, para as Embaixadas e para os Institutos Públicos. A OFERTA é grande e o Primeiro-ministro vê-se grego para encaixar todos os militantes e amigos DISPONÍVEIS. Só muito dificilmente consegue abrir espaço para um ou outro «independente», ainda que inequivocamente detentor das desejadas qualificações. Já na remodelação em final de mandato, os ministeriáveis, os bons quadros, sejam eles militantes (ou amigos) do partido do Governo, sejam «independentes» não se disponibilizam para integrar o Governo e o Primeiro-ministro vê-se, de novo, grego para apresentar um elenco convincente. Precisando passar a imagem de um Governo forte o suficiente para dar resposta aos problemas prementes (no caso presente – 2010 – soluções para os operadores económicos e segurança para os cidadãos em geral) e necessitando impressionar o eleitorado para ganhar vantagem no ciclo eleitoral que se avizinha, o primeiro grande dilema do Chefe do Governo é: opto por militantes e amigos, ainda que medíocres, ou ganho coragem e aposto em alguns independentes, dos bons? O dilema seguinte tem a ver com a remodelação em si, diante do grande grupo de gente, sem a necessária qualificação, que se põe em bicos dos pés, se oferecendo para entrar no Governo, e do restrito ou deserto universo de gente com qualificações que respondem com um «SIM» ao convite do Chefe do Governo: FAÇO OU NÃO FAÇO A REMODELAÇÃO?
Tendo decidido pela remodelação, e não contando com grandes capacidades disponíveis, nem querendo injectar mediocridade ao governo proveniente da dita «remodelação possível» de 2008, resultam naturais não só a indecisão de JMN (FAÇO OU NÃO FAÇO?), como as parcas soluções encontradas. Afinal, nada muito difícil de decifrar.
A dificuldade de leitura que o Premier vaticinou deve ter a ver com o facto de alguém poder questionar porque não fez qualquer mexida no sector da Segurança e Ordem Pública ou porque não foi até ao fim na remodelação da Equipa Económica do Governo. De facto, fica difícil compreender porque o Chefe do Governo, em matéria de Segurança e Ordem, havendo alternativas, «deixou tudo como está, para ver como fica». Em relação à segunda questão, resulta também difícil entender porque não deu o golpe de misericórdia à Ministra Cristina Duarte: de, claramente, líder da equipa económica do Governo - pelo menos de 2008 a esta parte - a Ministra já foi obrigada a engolir o slogan do Chefe “SALÁRIO MÍNIMO ainda este ano”, sendo ela contra a medida, neste momento; a sofrer, calada, perante o novo cavalo de batalha do Chefe “13º SALÁRIO já na próxima Legislatura”, sendo ela “alérgica” ao princípio, neste momento); e agora ficou praticamente confinada ao “DEVE/HAVER”e limitada a assinar em baixo, nos compromissos da nova liderança da equipa económica do Governo, deslocada que foi esta para a Chefia política do Executivo. Tendo decidido ceder à pressão dos organismos representativos da classe empresarial, não lhe teria sido mais misericordioso remodelar a senhora? Impossível, portanto, não fazer a leitura, mais do que óbvia: o Premier não encontrou ninguém que quisesse assumir a batata quente em que se deixou transformar o Ministério da Administração Interna (nem militante, nem amigo, mormente independente), e terá levado uma desconcertante «nega», à última hora, para a pasta das finanças.
Seja qual for a verdade, numa coisa todos estaremos de acordo: é preciso, EM PROCESSO DE URGÊNCIA, trabalhar no sentido da MELHORIA DA QUALIDADE DA OFERTA, rompendo, ao mesmo tempo, com determinados complexos, a modos de se AMPLIAR O UNIVERSO onde os partidos políticos vão recrutar mulheres e homens para formar os Governos de que o país vai precisando, a cada momento, em seu percurso.

No comments: