Tuesday, August 14, 2007

O NOSSO EUSÉBIO

O NOSSO EUSÉBIO
Eu já vi muitos e bons jogadores de futebol. A preto-e-branco no VISOR que antecedia a projecção dos filmes no Cine-Teatro Municipal, nos bons tempos do John Mello; ao vivo nos subúrbios e na Várzea; ao vivo e a cores em Portugal e no Brasil; e a cores, com direito a repetição dos lances e possibilidade de registo para a posteridade, com o advento da TV a cores, do vídeo-cassete, da parabólica.
Pelé, Eusébio, Maradona e Luís Bastos são dos melhores que eu vi.
É inesquecível o duelo Pelé/Faccheti; são inesquecíveis os slalons de Eusébio, coroados, quase sempre, com um golaço, e as humilhações ao bom do Carvalho; o golo de Maradona na copa do Mundo (agora repetido pelo pequeno argentino do Barça); e Nazolino alguma vez se esquecerá da «chupeta» que Luís lhe aplicou no campo do «Braga», quando jogava ele pelo «Chile» e o Luís por «Portugal»?

Cada um deles aproveitou as oportunidades da vida como soube ou pôde:

- Pelé: um dos donos das famosas CASAS BAÍA, com interesses em vários negócios, embaixador da UNESCO, etc.. Mau grado as alegadas ligações à ditadura, que lhe valeram condenações mais ou menos públicas, chegou a ser Ministro da República (ainda que fantoche, como diz a moçada);

- Maradona: ganhou rios de dinheiro. Reduziu uma boa parte delas a pó, mas ainda lhe sobrará muito, conquanto lhe falte saúde. Mas mantém o mais importante nesses casos: o amor da torcida e o respeito dos praticantes da modalidade no seu país;

- Eusébio: basta lembrar a romaria ao Hospital onde esteve recentemente internado. Do Presidente da República ao mais humilde português, todos passaram pelo hospital para saber como ia o maior futebolista português de todos os tempos. Já viram alguma caravana importante do Benfica sem Eusébio? Está em todas e não é ele quem impõe a sua presença. É o «DESEJADO». Junto do Benfica e junto da Selecção das Quinas;

- Luís Bastos: Luís da Silva Bastos, de seu nome completo, pode ser encontrado a qualquer momento num dos dois lugares seguintes – as cercanias do Cyber-Café SOFIA ou numa cama de hospital. Um dia desses, talvez mude de poiso. Para o Campo Santo da Várzea. Doente, em estado de extrema debilidade física, «desgobedjando» com uma pensão de pouco mais de quatro mil escudos e com quatro filhos menores para criar. Não tem interesses em nenhum negócio (até o da vida lhe vai escapando por entre os dedos); não é «DESEJADO» nem das duas equipas do seu coração (o Sporting Club da Praia e a Associação Académica da Praia), nem da Selecção de Cabo Verde; não recebe qualquer tributo moral (mormente financeiro) enquanto expoente máximo da modalidade a que se dedicou de corpo e alma; não recebe visitas quando cai doente.

É triste a forma como votamos ao abandono os nossos ídolos! Pudera! Se nem prestamos tributo a Amílcar Cabral que já se finou! E cá, num País onde o finado é sempre «BONITO E BOM RAPAZ».

Ao Luís resta esperar pela homenagem que lhe está prometida para quando deixar o mundo dos vivos e for engrossar as fileiras do «team» do Campo Santo, aí a dois passos do estádio que já teve o seu nome… mas já não tem! Cortejo fúnebre saindo da casa mortuária; urna (das mais caras) fornecida pela Federação Cabo-verdiana de Futebol; jovens com camisolas do Sporting Club da Praia, da Associação Académica da Praia, da Selecção Nacional, do «Portugal» do Paiol e do «Uruguai» de Ponta Belém; presença do Ministro do Desporto (que, por sinal, é também o Primeiro ministro da República); discursos do Presidente da Federação Cabo-verdiana de Futebol, do Secretário de Estado dos Desportos e, quiçá, do Director-Geral dos Desportos (ele que também foi um exímio praticante de futebol), de dirigentes do SCP, da Micá, etc., etc.. Bandeiras, muitos automóveis, muita gente. Chorando o grande futebolista, O NOSSO EUSÉBIO, que se foi. Uma semana depois, um torneio de futebol em homenagem àquele que foi o melhor praticante de futebol de Cabo Verde de todos os tempos, com receitas revertendo a favor dos quatro órfãos. Não sei se será isso que mantém Tio Luís de pé ou se é isso que está acelerando a inexorável marcha rumo ao reino dos pés juntos.

Caramba, gente! Vamos lá contabilizar as despesas que pensamos fazer para o funeral do velho Luís e entregar-lhe esse dinheiro em mãos. Enquanto precisa. Enquanto possamos ser-lhe úteis. Enquanto possamos ajudá-lo a mandar os meninos para a escola com os cadernos, lápis e livros necessários. Enquanto ELE nos possa dizer MUITO OBRIGADO.

Vá lá MARUCA. Sabiam que o Mário Semedo e o José Maria Neves foram colegas de turma no liceu? O que os impede de se encontrarem para recordarem os velhos tempos e para combinarem uma pensão que possa permitir que Luís Bastos viva os seus últimos dias com alguma dignidade?
E você, BALA? Lembras-te ainda do Luís nos nossos pelados? O colírio para os olhos que era ver Luís jogar? As fintas, a rapidez, os remates, o fair-play? Alguém alguma vez viu Luís Bastos pontapear um adversário? Onde? Quando? Alguma vez alguém viu Luís respondendo às inúmeras agressões a que os seus adversários se viam obrigados a recorrer para o poderem travar? Quem? Onde? Quando?

Negócio fechado? Mario Semedo? Inácio Carvalho? José Maria Neves? Não questiono o Secretário de Estado dos Desportos porque não sei se ele chegou a ver Luís Bastos passeando a sua classe pelos nossos campos de futebol. O Mário e o Bala sei que viram e sei que apreciam. O JMN? Se não viu, que pergunte ao Maruca.
E que não me venham com aquela velha treta de que se dermos uma pensão ao Luís vamos ter que dar a todos. Não cola. Antes de mais, porque Luís está precisando meeesssmo, aqui e agora; depois, porque como Luís, há só um e mais nenhum; sem contar que já se fez isso antes com pérolas de outras áreas do saber e do saber-fazer.

Vamos acudir ao tio Luís enquanto ainda nos pode agradecer de viva voz? E lembrem-se da máxima: QUEM DÁ A QUEM PRECISA ESTÁ EMPRESTANDO A DEUS. E Deus paga sempre!
Ludgero Correia

1 comment:

Unknown said...

Parabéns pelo texto e muito mais ainda pelo tema.Chega dessas homenagens póstumas que para nada servem ao homenageado. Que glória terá aquele que "descansa em paz"? Lembremos, pois, do que o Cristo disse: "Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus".
CHEGA de "era dretu e fidju di alguen dretu"!!
Acredito que homenagear, enquanto vivo, é uma forma forte de incentivar os jovens a procurar um "lugar ao sol".
À tout seigneur tout honneur!